Ex-chefe de gabinete do presidente da Chamusca questiona a sua capacidade de liderança
Francisco Velez diz que errou ao acumular o cargo com o de presidente da assembleia
Demitiu-se do cargo de chefe de gabinete em Abril do ano passado em desacordo com o presidente e seu camarada, Paulo Queimado. Mantém-se como presidente da assembleia municipal. Garante que continua fiel ao Partido Socialista e que vai respeitar a disciplina partidária, para não causar entraves à gestão municipal, mas não abdica de dizer o que tem a dizer.
Arrepende-se ter aceite o cargo de chefe de gabinete do presidente da Câmara da Chamusca sendo presidente da assembleia municipal? Ter acumulado o cargo de presidente da assembleia municipal com o de chefe de gabinete do presidente da câmara foi um erro. Assumo que foi um erro e hoje posso dizê-lo porque vivi a experiência. É impossível ser-se chefe de gabinete do presidente da câmara e ser, simultaneamente, presidente da assembleia municipal, apesar de não haver incompatibilidade em termos legais. Quando o presidente da câmara falava consigo, falava com o chefe de gabinete ou com o presidente da assembleia municipal? Era complicado. Acabava por haver interferência da câmara municipal nas funções de presidente da assembleia municipal. Não é possível a mesma pessoa exercer as duas funções. É humanamente impossível. Acaba por haver uma função a sobrepor-se a outra. Eu fui sempre mais chefe de gabinete do que presidente da assembleia, reconheço. Antes das eleições autárquicas de 2013 chegou a falar-se no seu nome para candidato do PS à presidência da Câmara Municipal da Chamusca mas recusou sempre alegando que o cargo era muito exigente em termos de tempo... Eu não queria e não quero ser presidente de câmara. Na altura perfilavam-se seis ou sete candidatos. Eu sempre me excluí. Não faz parte das ambições pessoais. Para exercer um cargo daqueles tenho que abdicar de toda a minha vida pessoal, de todas as coisas que gosto de fazer. Gosto de música... de dar aulas; gosto da profissão que tenho. Mas acabou por abdicar disso tudo para ser chefe de gabinete. Porque aceitou sabendo que tinha que estar permanentemente com o presidente? Foi uma questão de dinheiro? Por causa de dinheiro não foi. O meu vencimento líquido como chefe de gabinete andaria na casa dos mil e trezentos e qualquer coisa euros. Não tinha ajudas de custo nenhumas. Como professor ganhava cerca de mil e duzentos euros. Não teve nada a ver com dinheiro. A motivação era política? Eu acreditava no projecto e acreditava que haveria um melhor aproveitamento do tempo, mas não foi isso que aconteceu. Havia determinadas coisas que eu sentia que se conseguiam resolver em minutos e que às vezes levavam três e quatro horas a resolver. Começam aí os problemas? Eu não funciono assim. A começar pelo cumprimento de horários. Eu era o primeiro, do grupo de trabalho ligado ao executivo, a chegar à câmara. É lógico que, se era o primeiro a chegar, por volta das oito e meia da manhã, às seis horas da tarde, devia estar completamente esgotado, enquanto os meus colegas estavam preparados para continuar. Por vezes ainda ficava mais uma ou duas horas mas só se era estritamente necessário.Era só a forma como o tempo era gerido? Tem também a ver com a forma como se organizam as coisas. Há presidentes de câmara aqui na região que delegam competências, seja em vereadores, seja nos membros dos seus gabinetes, nomeadamente nos chefes de gabinete. Eu, por exemplo, nunca tive nenhuma competência delegada. Até houve uma altura em que estive a fazer ofícios e protocolos. Senti-me desaproveitado. Havia desorganização? Havia falta de liderança. Falta de liderança, principalmente!O presidente da câmara e a vice-presidente vão juntos a quase todos os eventos. É uma boa opção? É uma opção e eu não tenho nada a ver com isso mas em termos de funcionamento de serviços sempre mostrei o meu desacordo. Não fazia sentido que à mesma reunião ou ao mesmo evento tivessem que obrigatoriamente ir os dois. Bastava ir um e outro ficar na câmara, a liderar. Só assim faz sentido haver um vice-presidente. E muitas vezes era necessário estar ou um ou outro. Afinal o PS só tem dois eleitos no executivo.O actual chefe de gabinete do presidente da câmara, Rui Ferreira, era seu adjunto. Foi você que o nomeou seu adjunto? Como chefe de gabinete precisava de um adjunto? Não fui eu que o nomeei mas pelas constantes saídas em conjunto do presidente e da vice-presidente o gabinete de apoio até devia ser alargado e sempre defendi isso. Cheguei a defender que se criassem assessorias. Não somos muitos. O concelho é muito grande.Mas também disse que não lhe foram delegadas competências e que sentia que estava subaproveitado. Eu sempre pensei que o presidente me iria delegar competências. Eu disse-lhe que ele ficava descansado em quatro áreas para se poder dedicar às outras. É reconhecido que são áreas que domino, pela experiência que tenho nas mesmas. Ele entendeu que não. Penso que é um erro. Uma das boas formas de liderança é delegar competências. Disse que acreditava no projecto que foi proposto pelo presidente da câmara aos eleitores. Quer dizer que já não acredita? Efectivamente este já não é o projecto que eu defendi. Neste mandato do Paulo Queimado e da vice-presidente Cláudia Moreira há muitas coisas com as quais estou em desacordo. Há muitas coisas que têm sido feitas, nomeadamente nas áreas que me são mais queridas, como na educação, na cultura, no desporto, na acção social, que deveriam ter sido feitas de forma diferente. É um problema de execução. Um problema de pessoas. Mas eu não rejeito as minhas responsabilidades. “Talvez por ignorância não estou a receber a informação que me deve ser dada”Algumas das áreas que diz lhe serem “mais queridas” estavam entregues à vice-presidente. Havia determinados pelouros que lhe estavam atribuídos. Educação, juventude... A parte cultural, apesar de estar com o presidente, muitas vezes era ela que tomava conta dela. A acção social, apresar de estar com o vereador Francisco Matias (CDU), ela tinha muito a ver com isso.... Digamos que ela interferia em tudo.Não tem sido feito trabalho na área da educação, da acção social... É interessante o que se tem feito, nomeadamente a recuperação dos parques escolares, dos pátios escolares, o ter-se criado uma zona de refeitório na EB 1 da Chamusca... mas não é isso que leva a que eu tenha mais alunos na Chamusca, principalmente a partir do 9º ano, que é onde existe o grande problema. Não há um projecto global e ele já devia ter sido feito. No penúltimo Conselho Municipal de Educação quase que fizeram uma festa porque iria haver finalmente um curso profissional para uma determinada área. Até que enfim. É pena ter vindo com vinte anos de atraso. E continuamos com muitas coisas em atraso.O que está a ser resolvido são os problemas do dia-a-dia. Do imediato. Estive na entrega dos prémios valor e excelência do agrupamento e achei estranho estar toda a gente muito contente porque houve 15 ou 16 alunos que receberam o diploma do 12º ano. Isto a mim assusta-me. E assusta-me continuar a ver um autocarro chegar à Escola Profissional Gustavo Eiffel, no Entroncamento, por exemplo, com tantos alunos do concelho da Chamusca.A população da Chamusca tem vindo a diminuir. Segundo o Census, entre 2001 e 2011 a Chamusca perdeu, em média 120 pessoas por ano. Nesta altura a perda de população ainda é maior. Está a acentuar-se a desertificação do concelho da Chamusca e ficamos todos contentes porque 15 alunos receberam diploma porque inaugurámos mais um pátio qualquer e porque os meninos do 4º ano já aprenderam a usar tabuleiro para ir almoçar. Isto não é estruturante. Há assuntos de que temos que falar a sério. Quais? Temos que falar muito a sério no turismo. Porque é que o projecto do Arripiado está parado? Sei do que estou a falar porque estive ligado a ele. Porque é que a questão da exploração da água de Ulme não avança? A Universidade Sénior está a correr bem na Carregueira, porque não se expande a outro locais? Continuamos com carências graves na habitação social. Tem que se fazer. São coisas fundamentais. Devemos estar preocupados. Porque é que cada vez somos menos? Porque é que os cafés e lojas vão continuar a fechar? Porque é que as pessoas saem para ir trabalhar para outro lado? O MIRANTE mudou a sede para Santarém. As bombas da Galp fecharam. Parece que ninguém ficou preocupado com isso!! O anterior presidente da câmara quando falava na assembleia municipal tinha sempre um ponto dedicado ao Eco Parque do Relvão. Fazia um historial de tudo o que estava a acontecer. O actual presidente não dá explicações. Quando da sua saída de chefe de gabinete o presidente da câmara admitiu que, de vez em quando, andavam aos gritos um com o outro mas que discussões acaloradas são normais entre amigos. Mantém essa “amizade gritada”, digamos assim, com Paulo Queimado? “Amizade gritada”, não. Amigos são amigos e muitas vezes enganamo-nos com os amigos. Em relação ao Paulo Queimado, a coisa que mais me custou foi ele ter utilizado argumentos que têm a ver com questões pessoais para justificar a minha saída de chefe de gabinete. Isso não lhe perdoo. Inclusivamente disse que se ia retratar e até hoje estou à espera.Foi presidente da assembleia municipal numa altura em que o presidente da câmara era da CDU, Sérgio Carrinho; foi presidente da assembleia e chefe de gabinete do actual presidente e agora é presidente da assembleia mas não é chefe de gabinete do presidente. Quais as diferenças que notou a nível institucional?Não nego que, mesmo sendo de partidos diferentes, tive uma melhor ligação sempre com o presidente Sérgio Carrinho do que tenho actualmente com o Paulo Queimado. Mas isso também se deve a uma coisa. Sérgio Carrinho foi três anos vereador a tempo inteiro e trinta e quatro anos presidente da câmara. Ele sabia muito bem o que havia de fazer e em que circunstâncias é que o havia de fazer. Tive sempre um óptimo relacionamento com ele a todos os níveis. Toda a informação chegava atempadamente. Todas as semanas tínhamos um tempo para conversar. Ele dizia-me sempre onde ia e o que tinha feito, que decisões tinha tomado. Eu tinha sempre toda a informação necessária. Isso não acontece agora.Há falta de comunicação? Mais do que isso. Nos últimos meses já tive três pedidos de desculpa de situações para as quais devia ter sido convidado institucionalmente e não fui. E fora aquelas em que nem sequer tive resposta. Parto do princípio que é por desconhecimento ou ignorância. Quem está a exercer o cargo há dois anos e tal ainda não percebeu o que é um presidente da assembleia municipal. Ainda não percebeu que tem que prestar contas ao presidente da assembleia municipal.Agora já aceitava ser candidato a presidente da câmara pelo Partido Socialista? Como já disse não me interessa ser presidente da câmara. Ser candidato não é importante. O importante é saber que projecto é que temos para o concelho da Chamusca.Apesar disso, presumo que nesta altura não apoiaria uma recandidatura do actual presidente, por causa da falta da capacidade de liderança e de organização. É isso que vai dizer se o assunto se colocar? Sim, será isso que vou dizer.
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