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“Falta de cuidado” e “omissões imprevidentes” causaram surto de legionella em Vila Franca de Xira

“Falta de cuidado” e “omissões imprevidentes” causaram surto de legionella em Vila Franca de Xira

Processo judicial mal começou e já é um “monstro” com 44 volumes e milhares de páginas. Falta de mangueira para aplicar choque de biocida numa das torres de refrigeração da ADP terá sido um dos momentos determinantes na origem do surto, aponta a acusação do Ministério Público que fez nove arguidos, incluindo duas empresas.

A não aplicação de biocida no oitavo circuito de refrigeração de uma das torres da fábrica Adubos de Portugal (ADP), a 10 de Outubro de 2014, por falta de uma mangueira, com a qual era habitual realizar essa operação, terá sido um dos vários momentos determinantes na origem do surto de legionella de Vila Franca de Xira.
A convicção é manifestada na acusação do Ministério Público (MP), a que O MIRANTE
teve acesso e do qual dará nota ao longo das próximas edições. Em todo o documento, entendem os procuradores, um alegado conjunto de omissões imprevidentes por parte dos nove arguidos – onde além de vários técnicos se contam também as empresas ADP Fertilizantes e a GE Power Controls - terá levado ao surto que matou 14 pessoas e infectou mais de 403. Um arguido, recorde-se, é considerado inocente até que a sentença transite em julgado.
O caso começa, segundo a acusação, quando a ADP termina a sua relação comercial com a empresa que limpava os seus circuitos de refrigeração e celebra um novo contrato com a GE Power Controls, para ser esta a realizar a manutenção e desinfecção das suas estruturas. Um contrato que, entende o Ministério Público, “não contemplou todas as regras técnicas e as melhores técnicas disponíveis e divulgadas entre a comunidade científica e empresarial”.
No dia 10 de Outubro de 2014, durante uma operação de limpeza e manutenção do oitavo circuito da fábrica, realizada enquanto este estava parado para obras de manutenção e reparação, o técnico da GE Power Controls terá realizado análises à água do oitavo circuito que revelaram um valor de contaminação abaixo do valor de referência. Além disso, pelo facto da mangueira através do qual tinha por hábito introduzir o biocida não oxidante no sistema não se encontrar no local habitual, diz o MP, o técnico não terá aplicado o produto.
Uma decisão contrária à que foi tomada nos meses anteriores, em que o choque de biocida no sistema fora sempre efectuado. Os biocidas, note-se, são substâncias activas utilizadas para destruir, neutralizar, impedir e prevenir a acção de organismos vivos nocivos para o meio ambiente. Apesar de não ter sido feito o choque de biocida, no dia 20 de Outubro o circuito foi colocado em funcionamento, o que terá propiciado a libertação da bactéria não eliminada anteriormente.
Diz o MP que os arguidos tinham conhecimento de que a água dos circuitos propiciava o surgimento de microorganismos, entre eles a legionella, e que todos agiram “com manifesta falta de cuidado” que o dever geral de providência aconselha, omitindo “acções importantes aquando da negociação, celebração e execução” do contrato entre a ADP e a GE.
“Não previram que as suas omissões imprevidentes originariam aquele desenvolvimento microbiológico” que causaria perigo para a saúde e vida dos ofendidos. “O desenvolvimento e propagação da bactéria só foi possível pelas omissões de todos os arguidos no cumprimento das regras técnicas existentes”, acrescenta o Ministério Público.

Vítimas protestaram em frente ao tribunal

Um grupo de vítimas do surto de legionella de Vila Franca de Xira manifestou-se à porta do Tribunal de Vila Franca de Xira, na tarde de sábado, 15 de Julho. Reivindicam que o Ministério Público encontre forma de abranger todas as vítimas – e não apenas as 73 onde foi encontrado um nexo de causalidade – e que, no limite, o Estado seja também julgado por não ter providenciado uma lei que obrigasse as empresas a maiores cautelas com a bactéria legionella.
O protesto foi organizado pela associação de apoio às vítimas do surto de legionella de Vila Franca de Xira. O seu presidente, Joaquim Perdigoto Ramos, explica a O MIRANTE que o próximo protesto será depois do Verão em frente à Assembleia da República.
Entretanto o grupo parlamentar do Partido Ecologista “Os Verdes” entregou na Assembleia da República uma recomendação para que o Governo isente do pagamento de taxas moderadoras as vítimas do surto. Em comunicado, “Os Verdes” defendem que, “no mínimo dos mínimos”, o Governo deve assegurar que as vítimas de legionella não suportem “os encargos com os cuidados de saúde que decorrem da necessidade de acompanhamento da doença”. Para aquele partido, trata-se de “minimizar, de alguma forma, as consequências bastante negativas que abrangeram tantos vilafranquenses”, explicam.

Processo é “monstro” com 44 volumes

O caso ainda mal começou mas o processo legionella já tem 44 volumes, milhares de páginas e promete ainda vir a ter muitos mais logo que arranque o julgamento. Já ocupa quase um armário completo no Tribunal de Vila Franca de Xira. Só a acusação do Ministério Público ocupa um volume inteiro, com 177 páginas.

“Falta de cuidado” e “omissões imprevidentes” causaram surto de legionella em Vila Franca de Xira

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