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Ortopedia seria especialidade de excelência em Santarém se houvesse mais médicos

Ortopedia seria especialidade de excelência em Santarém se houvesse mais médicos

Luís Tomaz, director da Ortopedia do Hospital de Santarém, espera mudar a realidade com novo bloco operatório

Luís Tomaz é o director da Ortopedia do Hospital de Santarém desde 2015 e luta desde essa altura pela implementação de um serviço de excelência, o que não tem sido fácil devido à falta de médicos suficientes. Com um novo bloco operatório, que está em obras e vai aumentar a capacidade para o triplo, o médico ortopedista acredita que é possível cativar médicos novos.

O que é que evoluiu nos últimos tempos na ortopedia? Hoje o que verificamos na ortopedia, que é relativamente recente, tem cerca de 60 anos em Portugal, é que se diversificaram muito as áreas. Actualmente há ortopedistas que se dedicam a áreas específicas, uns ao joelho, outros à coluna, etc. Isto porque as técnicas evoluíram muito.

Isto estará relacionado com a evolução do desporto e dos traumatismos nesta actividade? A ciência médica e a ortopedia são componentes de apoio à medicina desportiva. É verdade que a medicina avançou bastante a encontrar soluções que sejam eficazes no tratamento dos atletas e depois isso reflecte-se nas pessoas em geral.

Não o preocupa que crianças e adolescentes apareçam muito cedo com lesões desportivas? O que existe algumas vezes é uma deficiência de formação dos preparadores físicos para acompanharem o período de evolução desportiva das crianças e jovens. Temos um papel preventivo das lesões quando acompanhamos os praticantes, os clubes, com a aplicação de treinos adequados. Verificamos que muitas vezes os miúdos aparecem com excesso de trabalho muscular, por quererem grandes desempenhos e às vezes são os próprios pais que influenciam isso.

Isso tem influência no futuro, na idade adulta. Hoje os miúdos querem ser como o Cristiano Ronaldo e os pais também o desejam. Sendo miúdos com boa preparação física e treino específico podem evoluir sem lesões. Os que não fizerem treinos adequados podem ter lesões, como qualquer outra pessoa. Numa criança as lesões podem ser mais graves se não forem devidamente tratadas.

As pessoas procuram os privados porque os hospitais públicos, como o de Santarém, não têm capacidade para a procura? Tem havido um desinvestimento no Serviço Nacional de Saúde, que tem reflexo na capacidade dos hospitais serem inovadores e captarem médicos com capacidade para fazerem assistência aos seus doentes. No privado querem inovar para conseguirem melhores resultados no tratamento dos doentes. Isso é economia.

Então é melhor ir ao privado? Temos bons serviços públicos e privados. Defendo o sector público. Os privados ainda não conseguem responder à totalidade das necessidades da população portuguesa, apesarem de já representarem uma parte importante. Os médicos de referência têm saído do público para o privado para desenvolverem o que não conseguem no Serviço Nacional de Saúde. Porque os privados conseguem melhor eficácia e eficiência porque têm um tipo de gestão diferente.

O nosso estilo de vida tem influenciado o aparecimento de problemas ortopédicos? Os problemas sempre existiram mas evoluíram as técnicas de diagnóstico e o conhecimento médico. Estamos mais avançados e isso permite-nos ter melhores resultados. A ortopedia é transversal aos grupos etários e temos soluções para ganhos de qualidade de vida. Uma pessoa de 70 ou 80 anos conseguem ter qualidade de vida porque as próteses ou cirurgias conseguem bons desempenhos.

Mas uma vida agitada leva à preponderância de doenças? Tem havido uma tendência para um estilo de vida saudável, que é preciso implementar mais. Temos ainda uma grande franja de população jovem e idosa obesa. Esse é um factor que determina também as doenças do foro esquelético. São mais acentuados os problemas de coluna, sobretudo em pessoas mais sedentárias.

Quando iniciou funções disse pretender criar um serviço com diferenciação técnica de excelência, já conseguiu? Não! Estamos longe disso. Para o conseguirmos atingir temos de ter os recursos humanos e a logística necessária. Sinto-me como um velejador a velejar sem vento. Não tenho bloco operatório nem número suficiente de médicos. Com sete médicos neste serviço, tem de se ter uma grande capacidade de gerir os recursos para se conseguir ter resultados.

E como é que se consegue assegurar consultas, cirurgias e urgências com uma equipa pequena? Só se consegue com a dedicação e espírito de sacrifício dos médicos do serviço, conjugado com o apego afectivo que tem ao hospital que leva a que se sacrifique a sua vida familiar. A maior parte dos médicos ortopedistas foram formados aqui no hospital.

Os ortopedistas estão a dar mais do que lhes é exigido? Se verificarmos as escalas de urgência neste momento os ortopedistas estão a fazer escalas de urgências de 24 horas entre seis a sete vezes por mês. O que é uma violência e só é possível com grande empenho e esforço. Isto cria problemas de organização do serviço, porque se estamos na urgência não podemos estar nas consultas e se estamos nas consultas não podemos estar no bloco operatório.

Porque é que o bloco é assim tão importante para os médicos? Quando assumi a direcção do serviço tinha um plano que não é possível implementar porque não temos médicos. Nos últimos anos já saíram médicos de excelência, formados no Hospital de Santarém. As pessoas optaram por outras soluções porque devido à situação do bloco operatório (que já está em obras de remodelação) não tinham espaço para operar os seus doentes e evoluírem na sua carreira.

Com um novo bloco que está a ser feito essa realidade vai mudar? A realidade tem de mudar. Vamos passar de duas salas para sete, passamos a ter um sistema produtivo que pode ser melhor rentabilizado. A ortopedia, com o número de médicos que tem, já chegou a fazer 250 cirurgias de colocação de próteses por ano ou a operar 1200 doentes. Neste momento estamos muito abaixo destes números.

Com mais condições para cirurgias vai conseguir cativar mais médicos? Espero que sim, que consigamos captar jovens médicos, até porque o Hospital de Santarém é atractivo por estar perto de Lisboa.

Os acidentes de viação são os que mais trabalho dão aos ortopedistas? Já foi mais. O Hospital de Santarém tem muita traumatologia mas há muita gente que vai para os privados. Neste momento também há uma incidência grande de idosos vítimas de quedas, que fazem fracturas do colo do fémur. Estas pessoas devem ser operadas entre as 24 e as 48 horas e neste momento não estamos a conseguir cumprir estes tempos ideais. Temos metade de situações de acidentes e metade de fracturas do colo do fémur.

E as cirurgias da coluna? Neste momento não estamos a fazer essa cirurgia no hospital. Era bom que pudéssemos fazer mas para isso é preciso ter escala, o que implica uma equipa médica maior.

O trabalho do osteopata pode evitar uma ida ao ortopedista? Os osteopatas têm uma formação virada para o trabalho osteoarticular mas não se encaixa no trabalho ortopédico. Têm uma acção positiva em relação a algumas lesões musculares ou osteoarticulares. Mas é uma área na qual não me sinto à vontade para falar.

As medicinas alternativas podem ser complementares à medicina tradicional? Não, e hoje há uma ideia perigosa de procurar transmitir a ideia de que as medicinas alternativas deviam ser integradas no Serviço Nacional de Saúde. Em alguns países já se verificou que algumas destas medicinas funcionam como um placebo. Não quero dizer que não possam existir técnicas que possam fazer bem. Mas o spa ou as termas também fazem.

É um dos fundadores do Club dos Nove, que influencia tem tido esta organização no desenvolvimento da ortopedia na região? O Club dos Nove aparece em 1987 com nove hospitais, entre os quais Santarém, Tomar Abrantes, Torres Novas, Vila Franca de Xira, com a necessidade dos médicos trocarem informações e experiências. Entretanto foram-se juntando outros hospitais. Hoje é o modo dos médicos internos, que têm seis anos de formação da especialidade, apresentarem os seus trabalhos para currículo e de os mais velhos trocarem experiências. Isto devia ser olhado com mais carinho pela tutela.

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