Mercado de Alpiarça está a cair no esquecimento
Já só há uma banca a funcionar com regularidade e a loja mais recente tem seis anos
Entra-se no Mercado Municipal de Alpiarça e o cenário é de decadência. Durante a semana só há algum movimento, pouco, na banca de frutas e legumes de Elisa Pereira, de 65 anos, residente em Alpiarça, a vendedora mais assídua deste mercado. Elisa é vendedora no mercado de Alpiarça há 28 anos e relembra todos os vendedores que viu partir, alguns por velhice outros pela procura de uma vida melhor. A vendedora tem saudades do tempo em que o mercado estava cheio de vendedores e clientes e de pregões.
Elisa apresenta-se alegre e sorridente, mas a forma como começou a trabalhar no mercado de Alpiarça não é de todo uma história feliz. A vendedora trabalhava num armazém de vinhos, em Alpiarça, mas um dia este fechou, deixando-a desempregada, numa altura em que Elisa era o pilar da sua família. Quando ficou desempregada o seu marido estava bastante doente com um enfisema pulmonar. “Arranjei esta banca para poder tomar conta dele, por isso preferi não ir para outro sítio”. Além do marido Elisa tinha ainda dois filhos para acabar de criar, uma filha com onze anos e um filho com dezassete anos. Após seis anos de doença, o marido da vendedora faleceu, já lá vão vinte e um anos.
Orgulha-se de tudo ter feito para criar os seus filhos sozinha e ter sido capaz de lhes dar uma boa educação e uma boa vida. Esta vendedora mantém-se fiel à paixão que tem pelo mercado e todos os dias faz questão de lá chegar antes do espaço abrir as portas ao público. “Quando comecei a vender o mercado tinha dezassete vendedoras”, conta. Nessa altura uma banca no mercado era rentável e dava para sustentar a família. Elisa admite continuar a fazê-lo até ao dia em que já não se sinta capaz, apesar de admitir que o lucro que faz no mercado muitas vezes só chega para pagar a renda diária da banca, que é de dois euros.
A vendedora revela que muitas das pessoas que vão à sua banca o fazem pela possibilidade de poderem levar os produtos fiados. “Se não fosse pelo fiado iam ao supermercado”. Muitos dos seus clientes apenas pagam a fruta e os legumes no final do mês, quando recebem as suas reformas ou os seus ordenados. Muitos dos clientes desta vendedora já são pessoas idosas e muitas delas contam com o bom coração de Elisa. “As reformas são pequenas e algumas vêm cá para ter alguma coisa para comer”, admite.
Elisa Pereira vai conseguindo manter a banca porque as frutas que vende são do seu pomar e apenas compra os legumes a um casal de Foros de Benfica, concelho de Almeirim. “As pessoas preferem as grandes superfícies e aqui já não vem ninguém”, desabafa.
Retrosaria é o negócio mais recente
Nas lojas em redor do mercado, que dão para o interior do espaço de bancas, há muitas portas fechadas. Foi numa dessas lojas que Vera Ferreira, de 37 anos, de Alpiarça, abriu uma retrosaria há seis anos. Apesar de admitir que as suas clientes são mulheres de idade, que procuram comprar lãs e tecidos bordados, garante que a sua loja é a concretização de um sonho de criança. “Sempre adorei trabalhar com lãs e tecidos”, conta.
A arte dos bordados e dos trabalhos em lã aprendeu-a desde tenra idade com uma vizinha, que costumava ficar a tomar conta dela. Durante dez anos trabalhou numa pastelaria, mas sentia-se infeliz no seu trabalho, “não era aquilo que gostava de fazer”. Um dia decidiu despedir-se e durante oito anos esteve no desemprego, sem conseguir encontrar um emprego que a fizesse sentir-se feliz. Um dia fez o pedido à Câmara Municipal de Alpiarça para abrir a sua pequena loja no mercado. Apesar de nunca entrarem jovens na sua loja e o movimento no mercado ser cada vez menos, garante que está muito feliz com a decisão. Vera gosta tanto de fazer bordados que até ensina as suas clientes. “Basta aparecerem na minha loja que eu ensino a tricotar”, salienta, realçando que esta arte funciona como uma terapia.
Vera Ferreira leva todos os dias para a retrosaria a sua bebé de um ano de idade para o seu local de trabalho. Para esta vendedora essa é a mais-valia do seu trabalho, poder trabalhar e ao mesmo tempo cuidar da sua filha. “Acho que vêm cá mais por causa dela do que por causa das lãs”, diz a brincar a vendedora.