Uma das coisas que mais me tem custado ouvir nestes tempos são as referências numéricas e percentuais quando se fala em infectados, internados, recuperados ou falecidos. Compreendo que a matemática nos ajuda a perceber a real grandeza da pandemia, mas semanas e semanas a falar de dezenas, centenas, milhares e percentagens afasta-nos, se nos distrairmos, da nossa humanidade.
Na segunda-feira à tarde, durante a reunião do executivo municipal do Entroncamento, o presidente da câmara, referindo-se aos habitantes infectados, disse: “...não chegamos a ter meia pessoa infectada por mil habitantes”.
Este vírus também está a ser devastador no processo de desumanização. Para além de vítimas reduzidas a números para compreensão da realidade, temos também a omissão dos nomes das vítimas por parte de amigos e familiares com receio do estigma social. Há casos de pessoas apontadas a dedo porque se descobriu que estavam infectadas e há autarcas e cidadãos a quererem saber onde moram as pessoas que tiveram a infelicidade de ser infectadas. Já vivíamos tempos de grande desumanidade. Agora, a situação piorou.
Maria Fernanda Duque Pereira Flores