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Transforma o lixo dos vizinhos em instrumentos e marionetas 
Inocêncio Casquinha é um artesão da música que já produziu dezenas de instrumentos musicais

Transforma o lixo dos vizinhos em instrumentos e marionetas 

A partir de resíduos e materiais em fim de vida, Inocêncio Casquinha já criou dezenas de instrumentos musicais. Em Arcena, onde vive, todos contribuem com o seu lixo.

Começou aos cinco anos a fazer brinquedos com latas de conserva e arames de fardo e tomou-lhe o gosto. Aos 69 anos, Inocêncio Casquinha é um artesão experiente no ofício de transformar lixo em marionetas e instrumentos musicais. Toca, canta e dança com todos eles. Em Arcena, localidade da freguesia de Alverca do Ribatejo onde vive desde sempre, os vizinhos já sabem: todo o lixo que se aproveite guarda-se e vai para casa do Casquinha.
“Todos acabam por estar metidos nisto comigo”, diz o antigo animador cultural da Câmara de Vila Franca de Xira. Tudo o que os vizinhos acham que pode servir para encaixar num instrumento é deixado no café do Raposo, que é também o primeiro palco onde Inocêncio Casquinha põe à prova os acordes e melodias saídos de um novo instrumento.
À volta da sala onde nos recebe vêem-se dezenas de instrumentos. Violas feitas de lata, um cavaquinho que antes foi um dispensador de guardanapos, gaitas de foles com luvas de limpeza e sacos de vinho incorporados e uma bateria onde os pratos são tampas de tachos. “Tudo isto funciona”, deixa claro no início da conversa antes de se agarrar a uma gaita de foles e começar a tocar.
Já correu o país de norte a sul e foi a Espanha e Itália propositadamente para expor as suas obras-primas. “Há muitos que fazem isto melhor que eu, até como músico sou fraquinho”, diz antes de saltar da cadeira e pegar num banjo cujo braço é nada mais que uma colher de pau.
As profissões que teve ao longo da vida foram-lhe aguçando o engenho para a arte. Foi electricista, técnico de máquinas de escritório e só mais tarde animador cultural. “Se não percebesse nada de electrotecnia jamais conseguia fazer com que grande parte dos meus instrumentos fossem eléctricos”, diz. Depois recua até à infância: “A malta do meio rural andava sempre com uma navalha na algibeira para transformar canas, carrinhos de linha e outra tralha em brinquedos”.
Antes de se reformar, o músico e artesão ensinou “a muita malta nova” a evolução dos instrumentos, misturou novos e velhos em experiências musicais, foi membro da já extinta Tuna de Arcena e gravou “Puleando - O artesão da música”, um disco com treze temas. Um dia, recorda, chegou a tocar para Mário Soares quando era Presidente da República.

Pandemia e neta deram
vida a marionetas
O velho “fandangueiro”, uma marioneta feita pelo artesão há 35 anos, estava a precisar de companhia e nada melhor que ter de cuidar de Júlia, a neta de 20 meses, durante o confinamento para deitar mãos à obra. “Foi assim que nasceu o Zé do Norte, a Carolina, a Maria Porcalhota e o Tony Focinho de Porco”, as novas marionetas que embaladas ao som da harmónica alegram os momentos da neta e do avô.
“Em casa todos gostam e acham graça ao que faço e a minha cabeça está sempre a pensar. Às vezes ando semanas para pôr um instrumento de pé, mas não desisto. Tenho muito tempo para estar parado”, atira.
Inocêncio Casquinha ainda não faz ideia do destino que quer dar ao seu acervo pessoal e foge três vezes à pergunta, para depois admitir, com a humildade que o caracteriza, que gostava que pudesse continuar a ser visto.

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