Desculpa a pergunta: o que achas do André Ventura?
André Ventura veio para ficar. Com ele as entrevistas nas televisões foram verdadeiras quecas tântricas, trepadas com alguns fetiches à mistura.
Muita gente está espantada e furiosa com o trabalho dos jornalistas das televisões que dirigiram as entrevistas aos candidatos à Presidência da República. Com o trabalho de casa mal feito, os jornalistas de todas as televisões procuraram nas entrevistas o sensacionalismo habitual quando o circo está montado, como é o caso, e permitiram que André Ventura desse espectáculo, com a colaboração dos seus adversários que nada podiam fazer que não deixarem-se embalar pelos jornalistas.
A pergunta que dá título a este artigo foi-me feita várias vezes nos últimos dias por gente esclarecida que percebe a fantochada que as televisões organizaram. Eles só esperavam uma resposta, que é aquela que também dou a mim mesmo: este Ventura vai ter uma votação espectacular porque ele quer duas ou três coisas que todos queremos; e isso basta-lhe para cavalgar um discurso de bobo, que tem feito a delícia daqueles que estão contra a democracia como a vivemos, embora pelo caminho tenhamos encontrado o caso Marquês, os escândalos do BES e do BANIF, dos Vistos Gold, os casos dos construtores civis do regime, dos ex-governantes e funcionários do Estado que misturam interesses pessoais com os interesses do país; confesso que não é pouca coisa, mas com André Ventura ao leme alguém acredita que Portugal será melhor no futuro?
Com o advento do líder do CHEGA os partidos políticos do regime, como é o caso do PS e do PSD, vão pagar caro a falta de trabalho enquanto foram, e ainda são, responsáveis pela falha na modernização administrativa do país e pelo fim dos privilégios dos políticos e dos seus secretários. Ventura cavalga a toda a sela um descontentamento verdadeiro; mas o que nos promete é um retrocesso civilizacional. Para percebermos como é que os jornalistas ineptos das televisões e os adversários políticos têm caído no seu jogo, permitindo que ele não discuta nada sério e em concreto, temos que aprofundar dois ou três assuntos em que ele tem razão. As leis da justiça para os assassinos são uma vergonha. O mundo mudou e está mais violento. Um tipo que mata a sua mulher, companheira ou amante, a tiro de caçadeira, merece na grande maioria dos casos até 20 anos de cadeia, fora os descontos que vêm a seguir com o bom comportamento, enquanto tiram uma licenciatura na prisão, fazem formação profissional e lêem os livros da sua vida. André Ventura tem razão: estamos a brincar com a vida das pessoas desprotegidas e, com uma lei tão branda, impelimos os assassinos a não terem qualquer problema em darem ao gatilho.
André Ventura é a cereja em cima do bolo na campanha eleitoral para as presidenciais do próximo dia 24 de Janeiro. Muitos de nós percebemos que ele é um bobo, mas temos que lhe reconhecer a coragem de trazer para a discussão pública a redução de deputados na Assembleia da República e uma mão mais pesada para aqueles que matam uma pessoa como quem mata uma barata. Foi preciso um Ventura para avisar a malta do PS, PSD, PCP e Bloco que andam a brincar aos polícias e ladrões, esquecendo a reforma do Estado, a democratização dos lugares de chefias das instituições do país, escolhendo os melhores e não os caciques do costume.
Por último: não consigo esquecer a facilidade com que os adversários de Ventura lhe chamaram em directo vigarista e fascista. Com o empurrão dos jornalistas moderadores que, certamente, estavam à espera de bater audiências ao cavalgarem as discussões ofensivas. Confesso que senti em todos eles o brilho nos olhos de quem dá a primeira queca; a alegria de ultrapassarem uma barreira, de cometerem a primeira perversidade das suas vidas; foi mais uma queca tântrica que violenta, mas não deixou de ser uma coisa parecida com a satisfação de uma trepada, com alguns fetiches à mistura. O que me espanta, sinceramente, por que o que é habitual nesta gente da política é tratarem-se todos por senhores doutores, professores e engenheiros; como aliás acontece ainda hoje com José Sócrates que, embora a Ordem dos Engenheiros tenha informado que usa o título indevidamente, todos o tratam pelo título que ele acha que tem. JAE.