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Família denuncia terceira morte  em lar de Riachos e procura respostas 
Protecção Civil junto à casa de Ana Alves que está acusada de maos tratos e profanação de cadáver

Família denuncia terceira morte  em lar de Riachos e procura respostas 

Uma terceira morte no lar ilegal já está a ser investigada pela Polícia Judiciária. Filha do falecido apresentou queixa no dia em que a proprietária foi detida, por suspeita de maus tratos e profanação de cadáver.

A primeira morte no lar ilegal, em Riachos, Torres Novas, ocorrida em Dezembro de 2020, está a ser investigada pela Polícia Judiciária. Diz respeito a um homem de 72 anos, diagnosticado com Alzheimer e foi denunciada pela filha a 5 de Março, dia em que a proprietária do lar, Ana Alves, foi detida. Esta é mais uma morte suspeita que se junta às das idosas de 90 e 92 anos.
A filha do falecido, Sónia Lopes, dá a O MIRANTE o seu testemunho dias depois de ter entrado nas instalações da Polícia Judiciária para contar o que sabe sobre a morte do pai. Certezas tem pelo menos uma: “Foi para debaixo da terra cadavérico, muito magro mesmo”.
O telefonema soou a 19 de Dezembro de 2020 pelas 15h00. “O teu pai está morto, disse-me. Nem chamou os bombeiros. Deu-me logo como sugestão ligar para o senhor da funerária”, conta a filha do idoso. Em choque e desorientada diz que “não [lhe] ocorreu sequer chamar os bombeiros ou a GNR”. Fez como Ana Alves lhe indicou e telefonou para uma funerária. Do outro lado da linha o responsável disse-lhe que não conseguia fazer o serviço no imediato e foi aí que Sónia Lopes ouviu as palavras que não consegue esquecer: “Se a funerária não fosse imediatamente embrulhava o meu pai num lençol e metia-o na garagem, porque não queria um morto dentro da casa dela”.

“Quero saber se já estava morto há mais horas”
Nesse dia, enquanto o corpo do homem arrefecia, dava entrada no lar clandestino uma das idosas nonagenárias que faleceu em Março deste ano. Quando Sónia Lopes e o marido lá chegaram, a detida estava a receber os familiares dessa idosa, já na altura acamada. “O que quero saber no meio disto tudo é se o meu pai já estava morto há mais horas e ela fechou a porta do quarto e deixou-o ficar ali enquanto mostrava a casa a outros familiares”, diz indignada com a “frieza e falta de humanidade” da pessoa à qual confiou os cuidados do seu pai.
Além disso, Sónia Lopes, suspeita que o pai “pode ter estado horas a agonizar sem socorro” já que depois da morte, alega, percebeu que Ana Alves não passava o dia, muito menos a noite, com os utentes. “Só ia lá de manhã e à hora de almoço, por isso, não sei se o meu pai morreu nessa tarde, a do telefonema, ou se já estava morto desde a noite anterior”.

Idoso morreu ao fim de cinco meses no lar
Até ao dia da morte do seu pai, Sónia Lopes nunca levou a sério as desconfianças que começaram a surgir. Tinham-lhe referenciado os bons serviços prestados por Ana Alves num outro lar onde trabalhou e onde as duas primeiras idosas que recebeu no apartamento do bairro Sópovo tinham sido utentes. Visitou a residência e em Julho de 2020 mudou para lá o seu pai, pagando uma mensalidade de 650 euros com fraldas incluídas e medicação à parte.
Devido à pandemia contactava com o pai quase exclusivamente por telefone. Em Outubro o seu marido entrou no apartamento para levar “pijamas e meias quentes para o Inverno e, aparentemente, “estava tudo bem” com o idoso. “A partir daí nunca mais o vimos. Com a desculpa da pandemia nunca mais nos deixou entrar lá em casa”, conta, acrescentando que os pagamentos das mensalidades eram feitos à porta do prédio e sempre com aviso prévio através de chamada telefónica.
Passados três meses da morte do pai, Sónia Lopes admite que teve medo de denunciar às autoridades, mas que com a mulher detida ganhou a coragem que faltava. Ana Alves é suspeita da prática de dois crimes de maus tratos agravados que resultaram na morte de duas idosas, do crime de profanação de cadáver e outros dois crimes de maus tratos a outras duas idosas que estavam ao seu cuidado.

Corpo de idosa embrulhado num lençol

O corpo da primeira idosa que morreu em Março, além de extremamente magro, apresentava uma grande mancha verde no abdómen, que aparece durante o estado de putrefacção devido à actividade bacteriana no intestino. Geralmente essa mancha começa a formar-se entre as primeiras 24 horas após a morte, mas no Inverno, com temperaturas mais baixas, pode demorar até 48 horas a aparecer. Neste caso, com a idosa embrulhada num lençol, suspeita-se que pudesse estar morta há mais de um dia e a família só viesse a saber depois de 8 de Março, dia do pagamento das mensalidades. Recorde-se que esta morte foi descoberta depois de familiares chamarem as autoridades porque queriam levar a idosa para outro lar e Ana Alves não lhes abria a porta.

MP diz que a detida não zelou pelos idosos

O Ministério Público (MP) justifica a medida de coacção de prisão preventiva, aplicada pelo tribunal a Ana Alves com os “perigos de perturbação do decurso do inquérito, perturbação da ordem e tranquilidade pública e de continuação da actividade criminosa”. Em comunicado o MP refere ainda que há fortes indícios que a arguida não prestou os cuidados de saúde, de alimentação e higiene e acolhimento residencial, nem zelou pelo bem-estar físico e emocional das pessoas idosas que estavam ao seu cuidado.

Lutava pela guarda do filho menor

Ana Alves, 41 anos, natural da Lamarosa, Torres Novas, está divorciada e lutava, antes de ser detida, pela guarda do filho de 12 anos. Ao que O MIRANTE apurou, o menor reside em casa dos avós maternos. Quem conhece a mulher de perto conta que estava a passar por uma “má fase” e de descontrolo emocional. Também há quem diga que era viciada em fazer compras de artigos online. Antes de decidir arrendar, em Junho de 2020, o apartamento em Riachos, para receber idosos, Ana Alves trabalhou num lar ilegal em Atalaia, Vila Nova da Barquinha, que encerrou em 2020 após um surto de Covid-19. Sabe-se ainda que trabalhou numa funerária em Elvas.

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