Família de Tofu aceita acordo com seguradora cansada de esperar por justiça
Jovem de Alpiarça ficou paraplégico há dez anos na sequência de um acidente de viação. Caso arrastou-se na justiça e os pais, desgastados com todo o processo, aceitaram um valor abaixo do que foi inicialmente estabelecido pelo tribunal.
Depois de quase dez anos à espera de justiça, os pais do jovem Gonçalo Neves, que ficou paraplégico na sequência de um acidente de viação, aceitaram a proposta de indemnização da seguradora.
Em 2017 houve uma decisão do Tribunal do Cartaxo no sentido de atribuir uma indemnização de mais de um milhão de euros à família do jovem, residente em Alpiarça. Entretanto houve recursos e novas diligências, com o processo a ameaçar arrastar-se na justiça. Em Fevereiro deste ano, a seguradora propôs o pagamento de uma indemnização com um valor abaixo do que já havia sido estabelecido pelo tribunal, que a família aceitou, preferindo não divulgar o montante em causa.
“Estamos cansados e precisamos de virar a página com urgência para termos paz. Vamos poder dar outra qualidade de vida ao Gonçalo com esta indemnização. Agora vamos poder comprar o carro adaptado para o nosso filho; e para nós também não termos de estar sempre presos em casa”, afirmou Sandra Martins a O MIRANTE, visivelmente desgastada com toda a situação.
A mãe de Tofu acrescenta que se deixassem correr o recurso e o Tribunal da Relação confirmasse a sentença da primeira instância ainda poderia haver outro recurso para o Supremo Tribunal, Tribunal Constitucional e Tribunal Europeu, arrastando ainda mais o processo.
Recorde-se que houve uma sentença proferida em 2017 em que o juiz condenou a companhia de seguros da empresa de camionagem a pagar uma indemnização de mais de um milhão de euros mas a família residente em Alpiarça nunca chegou a ver um cêntimo a que tinha direito. O processo de recurso esteve parado durante vários anos no Tribunal de Évora à espera que o Tribunal do Cartaxo decidisse se a seguradora do carro em que Gonçalo seguia também tinha direito a ser indemnizada. Situação que chega agora ao fim com o acordo entre as partes.
A família esperou durante mais de nove anos para que se fizesse justiça pelo acidente que deixou o jovem, na altura com 20 anos, paraplégico e preso a uma cadeira de rodas. Em Novembro do ano passado, em conversa com O MIRANTE, os pais de Tofu não escondiam o desespero por não verem o processo encerrado e os apoios chegarem. “Tudo o que nos poderia acontecer de mau neste processo aconteceu. Durante quatro ou cinco anos conseguimos aguentar as despesas mas neste momento já não”, admitiam na altura.
Actualmente os pais de Gonçalo só têm capacidade para pagar três sessões de fisioterapia por semana e já não conseguem pagar terapia da fala. Óscar Neves reformou-se para poder acompanhar o filho e Sandra Martins trabalha apenas de manhã para estar disponível à tarde. São eles que vão exercitando o filho para que não perca massa muscular.
Tofu sonhava com carreira militar
Gonçalo Neves, actualmente com 30 anos, sofreu em Setembro de 2011 um grave acidente de automóvel, tendo ficado em estado vegetativo devido a um traumatismo crânio-encefálico. Os pais nunca desistiram de recuperar o filho e procuraram respostas clínicas em Portugal e em Espanha. O jovem esteve cerca de três anos numa clínica em Santiago de Compostela, tendo apresentado algumas evoluções. Tiveram que regressar a Alpiarça quando as poupanças acabaram.
Tofu era militar voluntário desde Abril de 2011 e queria entrar para a Academia Militar. No final de Agosto de 2011 foi passar uns dias a casa. Na noite do acidente resolveu ir com um amigo ao Cartaxo mas no regresso, cerca da uma da madrugada, na Estrada Nacional 3, na zona de Vila Chã de Ourique, tiveram um acidente de automóvel que envolveu um camião. O amigo partiu apenas um dedo tendo o embate com o veículo pesado sido todo do lado de Gonçalo Neves, que conduzia a viatura.
À margem
Em lutas desiguais não há resultados justos
O caso da família de Tofu é exemplar no que toca à insensibilidade que os poderes públicos têm perante situações em que a solidariedade e o conforto do Estado mais eram necessários e pertinentes. Todos sabemos que quem tem bons advogados pode levar os casos a arrastarem-se em tribunal até às calendas. Aliás, exemplos desses não faltam neste país. Pena é que a resposta operacional dos vários sectores da administração pública não seja igual à que existe na cobrança de impostos. Neste caso, tratava-se à partida de uma luta desigual. E em lutas desiguais é difícil haver um resultado justo porque a parte mais fraca acaba quase sempre por ceder, vencida pelo cansaço, pela descrença ou pela falta de recursos.