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“Urbanização Vila Rio é um atentado ambiental”
Catarina Lourenço é da Póvoa de Santa Iria e acredita que é possível fazer mais e melhor pela cidade

“Urbanização Vila Rio é um atentado ambiental”

Catarina Lourenço é investigadora de neurociências e está a completar uma licenciatura em medicina. Perfeccionista e viciada no trabalho, foi o rosto escolhido pelo Bloco de Esquerda para ser candidata à União de Freguesias da Póvoa de Santa Iria e Forte da Casa. Nesta entrevista a O MIRANTE fala do estado da sua cidade, dos prédios que estão a nascer à beira do Tejo, da falta de dinamização cultural, do trânsito caótico em horas de ponta e da nova vaga de jovens que vão a votos este ano.

É eleita da Assembleia de Freguesia da União de Freguesias de Póvoa de Santa Iria e Forte da Casa desde 2013 e já foi candidata a presidente de junta em 2017. O que a fez avançar novamente para a corrida eleitoral?

É a minha forma de poder participar. Já estou ambientada às discussões e aos dossiês da freguesia. Temos ideias diferentes, fora do que tem sido o habitual da gestão que tem passado pela junta e acreditamos que podemos fazer a diferença pela positiva. Tenho uma vida profissional e académica bastante ocupada por isso tive algumas reticências quando me convidaram mas aceitei.

É da Póvoa de Santa Iria. Como vê a cidade?

É uma terra com muito por fazer. Uma cidade muito jovem, senão das mais jovens do país, mas tem uma oferta muito reduzida para as necessidades da população. A Póvoa tem muito mais potencial do que aquilo que oferece. Acaba por se limitar a ser designada como um dormitório e não se tem visto muito esforço da junta para mudar isso nos últimos anos, bem pelo contrário. O que tem acontecido é meter na habitação o único foco de desenvolvimento e isso é errado. Para mim a cidade não deve nunca ser um dormitório de Lisboa.

Que balanço faz deste mandato? Valeu a pena?

Vale sempre a pena e tivemos a oportunidade de apresentar algumas propostas que ajudaram a melhorar a vida da comunidade. Gosto quando consigo levar propostas que reúnem consensos e lhes é reconhecido mérito. Embora às vezes também sejam chumbadas por meros jogos políticos. Podia haver mais cooperação entre os partidos, o que seria benéfico para a população. Infelizmente isso não acontece porque há conflitos que não interessam a ninguém excepto às próprias pessoas, por jogadas de poder, interesses próprios e finca pé, muitas vezes para fazer oposição por fazer sem nenhuma crítica construtiva. Neste mandato sentiu-se muito mais isso do que no anterior.

Pode dar um exemplo?

Propusemos criar um transporte para ajudar as pessoas mais idosas para ir à farmácia ou centro de saúde mediante marcação e criar pequenos espaços de partilha de livros em alguns locais da cidade. Foi tudo chumbado porque sim, com argumentação fraca e pouco convincente.

O que falta na União de Freguesias que gostasse de mudar?

Uma visão que permita que as estruturas da união acompanhem o crescimento. A visão que muita gente tem é que sendo uma freguesia com muita população é uma grande freguesia. Mas essa visão é limitada. Temos de criar condições para que as pessoas que aqui vivem tenham qualidade. Temos pouca oferta cultural e o espaço cultural que temos é demasiado pequeno para as necessidades. A biblioteca não consegue suprir as necessidades das pessoas e o centro de saúde é outro problema, não consegue corresponder às necessidades da população. Em 15 anos o centro de saúde rebentou e logo por aí nota-se que falta planeamento a longo prazo. E ainda assim continua-se a promover esse crescimento habitacional desestruturado.

Está a referir-se à urbanização Vila Rio da Teixeira Duarte junto ao passeio ribeirinho?

Queremos aproximar as pessoas do rio com a requalificação da frente ribeirinha e tornar aquela zona num espaço privilegiado de lazer, mas em contrapartida temos de favorecer grupos económicos privados que vão beneficiar com a existência do passeio ribeirinho. Já reunimos com a Teixeira Duarte e já lhes comunicámos a nossa opinião. Não sabemos também até que ponto a construção naquele local não causa impactos ambientais num ecossistema que deve ser preservado. Sem contar com o facto de estar numa zona de cheia. Entristece-me ver nascer aquela urbanização, não faz sentido. Já temos tantas muralhas de betão na cidade e esta é mais uma. É mais um erro a somar a outros.

Há preocupações também com o aumento de trânsito quando os apartamentos forem vendidos.

Os acessos da Póvoa a Lisboa estão completamente entupidos. Os promotores e a câmara pensam que as soluções que trazem a nível de infra-estruturas para a nova urbanização vão resolver o problema mas não vão. Vamos tapar o sol com a peneira. O trânsito vai fluir todo para a Estrada Nacional 10 e fica tudo pior do que está hoje.

Avizinham-se dias sombrios para quem tenha de andar de carro na cidade?

Não, porque eles já são sombrios. Estamos a demorar mais de uma hora a chegar a Lisboa. Seria mais benéfico promover a deslocalização das pessoas para os transportes públicos mas neste momento a estação da Póvoa também está sobrelotada e completamente saturada. E os comboios não têm as condições desejáveis. O ideal seria abandonar o carro mas não se têm criado condições para se poder fazer isso.

Os anos de gestão de Jorge Ribeiro foram uma oportunidade perdida?

Não iria tão longe. Algumas coisas foram positivas mas sem dúvida que muito se poderia ter feito. Houve uma estagnação. A bancada do Bloco introduziu algum estímulo para se promoverem mudanças mas muitas das propostas aprovadas ainda não foram concretizadas, o que mostra uma imensa inactividade. Continuamos a sentir muitas queixas de falta de limpeza e tratamento dos espaços verdes. É o assunto mais transversal que é difícil de resolver.

Como analisa o controverso projecto municipal de sinalização de ciclovias no centro da Póvoa que acabou interrompido?

Demonstra que não há envolvimento da população nos projectos que são planeados. A câmara criou um projecto de milhares de euros a achar que ia servir a população mas como se viu foi um erro. Não somos contra as ciclovias, pelo contrário, mas obviamente que o planeamento deveria ter sido feito de outra forma. Deviam ter ouvido a população que circula e conhece a Póvoa. Podíamos todos ter ajudado a resolver alguns dos problemas que a câmara encontrou quando a obra já ia avançada. O que acabou por ser pouco produtivo.

“O Forte da Casa não pode ser o parente pobre desta união de freguesias”

Concorda com a união de Póvoa e Forte?

A criação da união de freguesias foi um processo atabalhoado e feito às três pancadas. Foi um facto consumado. A população do Forte sente algum abandono e estando a pensar-se numa nova reestruturação administrativa acho que devemos ouvir todos os moradores para ver os benefícios e desvantagens desta fusão para decidir o caminho a seguir. O Forte da Casa não pode ser visto como o parente pobre desta união de freguesias. Isso não é justo para quem lá está e é uma vila que precisa de muita intervenção e dinamização. Temos ali imensas oportunidades de aproveitamento que estão esquecidas.

Nestas eleições há vários jovens a concorrer. Isso significa que a política já não é só para velhos?

É positivo ver os jovens a avançar. Trazemos renovação às velhas ideias e novas formas de ver as coisas. Pode haver a associação da falta de experiência mas o que vejo é que a maior parte destes jovens candidatos são pessoas informadas, que fazem o trabalho de casa, trazem propostas diferentes e fazem críticas construtivas e não apenas a crítica por oposição. Às vezes perde-se demasiado tempo em discussões improdutivas.

O município esqueceu-se da vossa união de freguesias na hora de investir?

Ouvimos sempre o argumento do passeio ribeirinho mas o que vejo ser construído na Póvoa é apenas prédios e mais prédios. Há muito mais investimento a fazer olhando para o público. Veja-se por exemplo o programa de ocupação de jovens do município: foca-se maioritariamente em VFX, os grandes eventos culturais são todos em VFX e a zona sul acaba por ser esquecida. Devia haver uma maior descentralização.

Uma investigadora apaixonada por viagens

Catarina Lourenço tem 29 anos, é da Póvoa de Santa Iria e está a concluir o doutoramento em neurociências com um trabalho de investigação focado no síndrome de Rett, uma doença rara do desenvolvimento que afecta maioritariamente meninas devido às suas características genéticas. É investigadora no Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes. Fez uma licenciatura em Bioquímica e está no quarto ano da licenciatura em Medicina.

Assume-se como perfeccionista, moderada e viciada em trabalho. Gosta de fazer compras na cidade e viver a Póvoa sempre que pode. Adora viajar e gostava de atravessar a América do Sul de mochila às costas. Tira-a do sério os oportunistas. “Na política estamos a ver o crescimento de um certo movimento extremista que já combatemos no passado e temos de voltar a combater de forma mais afincada. Temos tendência para os desvalorizar e as coisas vão ganhando força”, nota.

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