uma parceria com o Jornal Expresso

Edição Diária >

Edição Semanal >

Assine O Mirante e receba o jornal em casa
31 anos do jornal o Mirante
“Tenho orgulho no meu percurso na dança e agora quero ser político”
Joseph Azevedo é funcionário público, mas continua a dar aulas num ginásio em Samora Correia

“Tenho orgulho no meu percurso na dança e agora quero ser político”

Joseph Azevedo é técnico superior na Área Metropolitana de Lisboa, está a tirar um doutoramento em História e dá aulas de dança em Samora Correia. Aos 49 anos e sem experiência em cargos políticos é a escolha do PS para a Câmara de Benavente.

Foi a loucura dos preços das casas em Lisboa que arrastou Joseph Azevedo para Samora Correia há 12 anos depois de ter visitado a cidade do concelho de Benavente durante as tradicionais festas de Agosto. O sossego do bairro, a ruralidade e as tradições seculares fizeram-no ficar e apaixonar-se pelo território. Mas isso não basta: “Falta inovação, atractividades para os jovens e acessibilidades para dar mais qualidade de vida e potenciar a instalação de empresas e desenvolvimento do turismo”.

É exigente consigo próprio e levanta-se todos os dias às seis da manhã. Para poder ir trabalhar tem de enfrentar as dificuldades de “um serviço parco” de transportes públicos. Mas o facto de não ter carta de condução tem uma vantagem: “faz com que não entre em hipermercados e compre no comércio local, que está a morrer pela falta de políticas de mobilidade de aproximação”.

Técnico superior da cultura, desporto, educação, juventude, relações internacionais e fundos comunitários na Área Metropolitana de Lisboa (AML), está em paralelo a tirar um doutoramento em História, na vertente de Estudos Avançados do Património. A sua tese de mestrado foi sobre o Museu Municipal de Benavente que está a ser requalificado, seguindo um “projecto feito em cima do joelho que não vai responder às necessidades futuras”. Continua a dar aulas de dança e ballet num ginásio em Samora Correia e colabora, como bailarino, no movimento associativo local.

A dança “surgiu por acidente” na sua vida quando tinha seis anos. Emigrado na Alemanha com os pais, um professor reparou no seu potencial e não houve quem na família o tivesse tentado impedir de dançar. Integrou a companhia do bailarino e coreógrafo Rui Horta e trabalhou com o professor de bailado Vasco Wellenkamp. Foi emigrante na Holanda e chegou a viver só da dança. Diz que não se incomoda com estereótipos, mas admite algum receio de ouvir dizer com desdém: “Lá vem o sujeito da dança para a política”. E vai. Mas fá-lo, garante, pelo serviço público e não para atingir fins pessoais.

Sobre o concelho que escolheu para viver não tem dúvidas: “Benavente tem potencial para se tornar num grande pólo citadino mas está adormecido”. Sem assento anterior em cargos políticos, o candidato considera-se “diferente de todos os outros” e promete não entrar em jogos de maledicência.

O que fez um bailarino candidatar-se a presidente de câmara aos 49 anos sem nunca ter exercido qualquer cargo político?

O facto de ser um cidadão que prefere levantar-se do sofá e mostrar aos outros que na política não somos todos iguais; que não sou mais do mesmo e que tenho um projecto de futuro para um concelho parado no tempo. Lido há 20 anos com autarcas na AML e como militante sempre estive nos bastidores da concelhia e distrital do PS. Depois importa dizer que não me envergonho, e até tenho orgulho, de ter um projecto artístico e ter feito um percurso na dança e na ginástica e agora ir para a política. Não é demérito nenhum.

O que traz de diferente?

O querer exercer política como um acto de pura cidadania e serviço público e não para atingir fins pessoais. O que posso desde já garantir é que não entrarei no caminho da maledicência e que terei sempre uma visão construtiva para o desenvolvimento do município em áreas como a mobilidade, educação, saúde, cultura e inclusão.

Já assistiu presencialmente a alguma reunião da Câmara ou Assembleia Municipal de Benavente?

Não, apenas participei nas reuniões preparatórias. Sei que são reuniões e assembleias onde se discute o território pela rama, que é o que acontece quando só se vai lavar roupa suja com uma postura de agressividade.

O PS de Benavente além de não ter conseguido derrubar o bastião comunista com 46 anos está a ter um mandato polémico, que envolveu a retirada de confiança política ao último cabeça-de-lista à câmara, o vereador Pedro Pereira. A imagem do PS tem andado pelas ruas da amargura?

Quem ficou melindrado com esse tipo de política de maledicência e do contra-ataque sem conteúdo acabou por não ser o PS, mas o papel do político na sociedade. Agora, acredito que as pessoas estejam cansadas da forma como se faz política neste concelho e isso é grave. Repare-se que Benavente é, a nível nacional, o concelho com maior taxa de abstenção e esta vai ser a minha maior inimiga. Mas estou cá para mostrar que o PS traz uma estratégia bem definida com promessas exequíveis e que não é aquilo que as pessoas viram nos últimos anos.

Reside em Samora Correia e trabalha em Lisboa. Vai de carro ou de transportes públicos?

De transportes públicos, não tenho carta de condução. Mas não é fácil, tendo em conta que um dos grandes problemas deste concelho é a mobilidade. Não se compreende como um território às portas de Lisboa tem uma oferta tão parca para os que aqui vivem e trabalham como para aqueles que procuram o território para implementar tecido empresarial ou para os que o querem visitar. O município já devia ter reivindicado melhor oferta ou ter aberto o território a concursos para exploração de linhas a outras empresas.

Enquanto técnico superior da Área Metropolitana de Lisboa tem experiência na gestão de fundos comunitários. Na sua opinião, Benavente tem sabido aproveitar esses fundos?

Não, de todo. Tem havido fundos para a promoção da cultura e ambiente, nomeadamente no plano estrutural das alterações climáticas, que seriam uma mais valia para este concelho e ninguém se mexeu. Não basta dizer que as lezírias de Benavente e Samora Correia são o pulmão da AML quando não há uma política ambiental nem de mobilidade. Houve um investimento brutal à custa de fundos comunitários, ou seja, de dinheiro que é de todos nós, na construção de ciclovias e em bicicletas de rede partilhada que estão há anos num armazém. E a leveza com que se fez tudo isto é assustadora.

Um documento intitulado “Estudo Património Cultural em Portugal: Avaliação do Valor Económico e Social” conclui que o património imóvel classificado em Portugal pode gerar o dobro dos visitantes e o triplo das receitas. Como analisa a forma como Benavente tem colocado o património nas suas políticas públicas?

O património edificado em Benavente é riquíssimo, mas não está potenciado nem em termos de sinalética nem de demonstração em site dos espaços que podem ser visitados. Pior ainda, não se percebe como é que esse património, como o Palácio do Infantado ou o Museu Municipal, esteja fechado ao fim de semana. Se o problema são os recursos humanos, a solução pode estar no recrutamento de voluntários reformados, daqueles que pelas suas vivências são parte da história e tradições deste território.

Concorda com a opção da Câmara de Benavente em ter candidatado a figura do campino a património imaterial da humanidade?

Concordo, claro, mas a câmara meteu-se numa camisa de 11 varas, pois a defesa de uma candidatura tem que estar muito bem elaborada e aí tenho as minhas dúvidas. Não basta defender o campino como património imaterial, é preciso potenciar a sua figura e para isso não basta fazer-lhe uma homenagem uma vez ao ano e pôr figurinhas em rotundas. É preciso valorizar o seu trabalho no campo, dá-lo a conhecer, por exemplo, através de workshops e quintas pedagógicas.

Voltando à dança: nunca o incomodou o preconceito que existe na dança em relação ao género e orientação sexual?

O estereótipo está na cabeça das pessoas e não me incomoda nada. Felizmente sempre tive uma relação muito aberta com os meus pais, que nunca tiveram esse preconceito tacanho de um rapaz não poder dançar. A única contrapartida foi ter de conciliar a dança com o percurso académico, algo que fiz sem grande esforço.

É um homem com auto-estima elevada?

Tenho as minhas fraquezas. Como sou muito exigente comigo nunca estou satisfeito, mas a dança ajudou-me muito. Estar exposto a olhares em cima de um palco ajudou-me a ter segurança em mim.

Muito se tem falado de assaltos, furtos e episódios de violência em Samora Correia. Sente-se inseguro a viver nesta cidade?

O que posso afirmar é que a insegurança aumentou e que os recursos da GNR, além de parcos, não oferecem um serviço de proximidade ao cidadão. Sou, por isso, defensor da criação de polícia municipal neste concelho.

Vive com o cão e é viciado em livros

Joseph Azevedo nasceu em Coimbra a 3 de Setembro de 1972. O seu núcleo familiar “foge ao tradicional”: não é casado, não tem filhos e não tenciona regressar à sua terra natal, a não ser para visitar os pais, o pilar da sua vida. Vive sozinho com Artur, um cão da raça bulldog francês. Tem preferência pela música clássica e pelo fado e é viciado em comprar e ler livros. Garante que é uma pessoa calma e paciente, mas não sabe lidar com a hipocrisia. Não vai a touradas - “nada contra mas não aprecio” - mas é aficcionado pelas largadas de toiros. Além da dança, a fotografia é outra arte que o apaixona.

“Tenho orgulho no meu percurso na dança e agora quero ser político”

Mais Notícias

    A carregar...

    Capas

    Assine O MIRANTE e receba o Jornal em casa
    Clique para fazer o pedido