Cavalos ajudam a melhorar vida de crianças em Azambuja
O autismo, a hiperactividade e a paralisia cerebral trouxeram barreiras e dificuldades a duas dezenas de crianças de Azambuja. O Centro Hípico do Lebreiro decidiu esbatê-las através do projecto “Saltando Obstáculos” onde todos montam a cavalo e se superam a cada passada.
Martim Lopes solta uma gargalhada e corre pelo picadeiro respondendo à chamada do equitador. Luís Ilaco ajuda-o a pôr o capacete e a subir para o dorso do Pipoca, o cavalo mais dócil do Centro Hípico do Lebreiro, em Azambuja. Aos seis anos, Martim é um menino meigo que parece viver num mundo só seu, onde ignora com facilidade as perguntas dos pais, muda o rumo das conversas e abraça sem avisar. “Ser pai de um filho autista não é fácil”, diz Hélder Lopes, para quem a equitação terapêutica “ajuda a perder medos e a trazer melhorias” no desenvolvimento social e controlo emocional da criança.
A paixão pelos equinos parece já ter nascido com o pequeno Martim que desde muito novo pedia aos pais para visitar o picadeiro, onde podia passar horas a admirar os animais. “Agora já não fica só a olhar e o dia da equitação passou a ser o preferido”, conta o pai que sempre que pode acompanha as aulas só para ver a alegria estampada no rosto do filho. “Quando acaba a vez dele montar e perguntamos qual a cor ou o nome do cavalo ele responde. Pode parecer banal, mas para a família de um autista é uma vitória”, conta.
Foi para dar alegria e benefícios que se reflectem a nível neuromotor, cognitivo e psicossocial em crianças como Martim, que o Centro Hípico do Lebreiro apresentou uma candidatura ao Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ). O projecto, que se chama “Saltando Obstáculos”, arrancou no final de Julho e até Setembro vai garantir aulas gratuitas de equitação a duas dezenas de crianças com necessidades educativas especiais que frequentam o Centro Social Paroquial de Azambuja, Santa Casa da Misericórdia de Azambuja e Agrupamento de Escolas de Azambuja.
A maioria dos novos alunos sofre de autismo, um transtorno neurológico que afecta a comunicação, a interacção social e o comportamento, que tende a ser rotineiro. Alguns, explica o treinador, demoraram horas a conseguir fazer uma aproximação ao cavalo. Mas, completa a presidente do centro hípico, Isabel Nolasco, todos “são especiais e poder dar-lhes a alegria de montar duas vezes por semana com todos os benefícios que isso traz não podia trazer maior satisfação para quem vê de fora.
Uma criança hiperactiva muito mais calma
À entrada do picadeiro António Henriques e os gémeos Gustavo e Flávio Anselmo aguardam a sua vez de montar. António, de 10 anos, é o mais irrequieto e impaciente. Características típicas da hiperactividade que lhe foi diagnosticada aos cinco anos. “Fico mais calmo e posso brincar com eles. Os cavalos são bons amigos como os da escola”, partilha António sem tirar os olhos de Napoleão, o cavalo de cor castanha que mais gosta de montar.
“O António sabe que para manter o equilíbrio e conseguir fazer os exercícios tem que estar calmo”, vinca o equitador Luís Ilaco explicando que no caso de crianças hiperactivas a equitação ajuda a descontrair e a melhorar o controlo das emoções. A mãe da criança, Anabela Cartaxo, lembra que há muito que esse controlo só se conseguia com medicação. “Agora não está a tomar nada e sai daqui muito mais calmo e feliz”, nota a mãe do menino sublinhando que se não fosse este projecto dificilmente conseguirira suportar os custos da modalidade.
Uma luta para manter a postura
Em cima do cavalo os olhos de Gustavo Anselmo ficam mais brilhantes. Quando nasceu, há oito anos, era um bebé saudável, mas um vírus hospitalar tornou os seus primeiros meses de vida num calvário para a sua família. Lutou e sobreviveu, mas ficou com paralisia cerebral causada pela falta de oxigénio no cérebro que o impede de acompanhar o desenvolvimento natural do seu irmão gémeo, Flávio.
“O Gustavo tenta fazer o que o irmão faz, como se o Flávio fosse uma espécie de estímulo para ele próprio conseguir evoluir”, diz Tiago Anselmo, pai dos gémeos. Também em casos de paralisia cerebral a equitação tem benefícios. O movimento do cavalo ajuda o menino a manter o equilíbrio e a melhorar a postura, explica Luís Ilaco, acrescentando que o ideal seria o projecto ter continuidade.
Para o projecto ter continuidade era necessário aparecerem patrocinadores. A verba atribuída pelo IPDJ (3.500 euros) não é suficiente para continuar a cobrir os gastos além das oito semanas previstas. Depois de ter sido o primeiro centro hípico a ter desporto escolar, esta escola de equitação com 57 anos tem a ambição de poder continuar a ser um exemplo e a ajudar crianças.