Santarém é a musa inspiradora do jovem cineasta Chico Noras
Jovem realizador que tem uma curta-metragem, filmada em Santarém, premiada em festivais internacionais, diz que mais que os prémios quer fazer filmes que as pessoas vejam. Natural de Santarém, regressou à cidade depois de viver em Lisboa, onde tem os cenários que precisa para os seus filmes, a começar pelo património.
“Máfia Scalabitana” era o nome de um pequeno filme que Francisco Noras escreveu e criou com os colegas de turma, no 9º ano, para a disciplina de Área Projecto. Uma brincadeira baseada no filme norte-americano “O Padrinho”. “Deu-me um gozo tremendo fazer esse projecto e foi a partir daí que tive a certeza de que era isto que queria fazer profissionalmente”, conta o jovem realizador, natural de Santarém, que se licenciou em Cinema e Televisão pela Faculdade Nova de Lisboa e tirou um mestrado na mesma área.
Francisco Noras, mais conhecido por Chico Noras, tem 30 anos e realizou duas curtas-metragens em plena pandemia. Foram os seus dois primeiros filmes profissionais. O primeiro, intitulado “Por um punhado de trocos”, realizado em 2020, já foi premiado nos festivais de Praga (República Checa), Berlim (Alemanha), Nova Iorque (EUA) e Índia. Recebeu também uma menção especial da competição internacional de Curtas do Festival de Avanca (distrito de Aveiro) e foi aceite no Motel/x, Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa, que tem o maior prémio monetário português.
“Quando decidi que queria ser realizador imaginava e projectava os prémios e distinções mas aceito tudo com humildade. O mais importante é tentar fazer filmes que as pessoas vejam”, refere em entrevista a O MIRANTE.
O mais recente filme, outra curta-metragem, chama-se “José Maria José” e é baseado numa histórica verídica, um crime que ocorreu em Portugal no século XIX. As filmagens de ambos os filmes decorreram em Santarém, cidade que Chico Noras diz ser a sua musa inspiradora. “Quero dar a conhecer Santarém com os meus filmes. Quero mostrar a outros cineastas, portugueses e estrangeiros, que Santarém tem um património riquíssimo e que é muito cinematográfica. Podem vir contar histórias nesta cidade”, sublinha.
“José Maria José” foi filmado em locais como junto à Igreja da Graça, onde não faltaram cavalos e carroças, na Igreja da Misericórdia, e na casa dos avós de Chico Noras, na Póvoa da Isenta, com outros animais. “Esta curta tem o cinema de terror psicológico e humor negro. É este último traço que quero desenvolver nos meus trabalhos”, explica.
Viver do cinema em Portugal está reservado a uma pequena elite. Francisco Noras é produtor de conteúdos publicitários e promocionais para a internet e trabalha com a Associação Turismo de Lisboa, por exemplo. “Arranjar dinheiro para os projectos é uma grande ginástica. Recebemos alguns apoios, incluindo de empresas do concelho e fora da região, e a Câmara de Santarém também nos apoia ao disponibilizar os espaços públicos para filmar. Tem que se ter um grande amor à sétima arte para fazermos o que gostamos”, afirma.
“José Maria José” já está gravado mas ainda falta editar e colocá-lo no mercado, o que deve acontecer no próximo ano. Francisco Noras defende que o cinema é interessante pela fusão entre a parte de entretenimento e artístico. “Temos que conseguir trazer a quem não é cinéfilo de raiz este tipo de cinema e que façam a pessoa pensar. Mas essas pessoas precisam ter acesso, o cinema tem que chegar a eles de forma mais fácil, que é às grandes salas. Com este filme conseguimos a promessa de distribuição em circuito de cinema, o que é muito raro e estou muito feliz com isso”, realça.
Santarém poderia ser um pólo artístico e chamar artistas
Chico Noras destaca a ligação peculiar que tem a Santarém e pretende mostrá-la ao mundo. Apesar destes dois projectos serem recentes já está a pensar no próximo, também uma curta-metragem, mas depois quer aventurar-se numa longa-metragem. O realizador sabe que para isso vai ter que ter mais tempo e vai demorar mais do que as curtas.
O jovem quer continuar a apostar nas paisagens scalabitanas e defende fazer falta uma valorização cultural da cidade. “Santarém deveria abrir-se para que pessoas de fora trabalhem com quem é de cá. A cidade deveria ser um pólo artístico e chamar pessoas de fora para cá, não só artistas do cinema, também de outras áreas. Isso iria potenciar muito a cidade. Santarém tem um enorme potencial mas cabe-nos a nós, assim como ao poder político, abrir a cidade ao mundo”, afirma, acrescentando que é um prazer mostrar as paisagens da cidade onde nasceu.
Chico Noras já cresceu numa época em que sempre houve poucos apoios do Governo à cultura e por isso já não conta com esse tipo de ajudas. Na sua opinião, o cinema português deveria apostar na internet como está a acontecer em Espanha. “Lá existe uma injecção brutal de dinheiro por parte do Governo espanhol e privados para criação de conteúdos ficcionais, como séries e filmes, para plataformas como a Netflix e que está a ser um sucesso. Deveríamos replicar o que eles estão a fazer”, opina.
O realizador já viveu em Lisboa, mas actualmente vive em Santarém e não pretende sair da capital de distrito por ser uma cidade mais calma, segura e com qualidade de vida.