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“Digo sempre o que penso mesmo quando sei que isso pode não agradar a quem ouve”

“Digo sempre o que penso mesmo quando sei que isso pode não agradar a quem ouve”

António Salvador, 52 anos, motorista do presidente da Câmara de Vila Franca de Xira. Nasceu e vive na Calhandriz, concelho de Vila Franca de Xira. Diz que a terra não evoluiu nos últimos anos. Foi o último presidente de junta antes da união de freguesias que colocou a Calhandriz junto de Alhandra e São João dos Montes. Diz que o processo foi feito de forma desonesta. É uma pessoa incapaz de estar fechada dentro de casa. Há 33 anos que é funcionário da câmara e nos últimos anos é motorista do presidente

Sou do tempo em que as pessoas deixavam a porta de casa com a chave na fechadura. A minha avó e outras pessoas da altura todas tinham a chave na porta, toda a gente se conhecia. Eu entrava na casa deste e daquele sem que alguém dissesse alguma coisa.
Cresci e vivi sempre na Calhandriz, é uma terra que adoro e onde me sinto bem. O meu pai trabalhava em Alverca e muitas vezes eu ia com ele para o trabalho. Acabei por crescer em Alverca, na rua, foi uma boa infância. Toda a gente se conhecia e sabia-se sempre onde estávamos. Conhecíamo-nos todos e isso não acontece hoje em dia.
Havia dias de sair de casa de manhã em Alverca e só aparecer em casa pela hora de almoço. Era um rapaz ruim para comer, acabava por petiscar nas casas de amigos por onde ia passando e depois, claro, na hora das refeições não tinha apetite (risos).
Fui presidente da Junta de Freguesia da Calhandriz, pelo Partido Socialista, durante oito anos. Antes já tinha sido Secretário. Fui o último presidente antes da união com Alhandra e São João dos Montes.
Para mim a união de freguesias foi um choque. Ter nascido dentro de uma freguesia e vê-la acabar. Mais choque ainda foi a forma como todo o processo foi feito. Deviam ter perguntado às pessoas se estavam de acordo e para onde queriam ir. Fomos para Alhandra quando, hoje em dia e historicamente, não temos nada a ver com Alhandra.
A união das freguesias, da forma como foi feita, foi uma desonestidade. Juntaram a Calhandriz com Alhandra mas estamos mais ligados a Alverca, quer ao nível de transportes, centro de saúde e escolas. Até consigo concordar que tivesse havido a união de freguesias, mas primeiro deviam ter feito a união de concelhos.
Orgulho-me do que fiz pela Calhandriz. Sobretudo ao nível dos acessos. Mas tenho pena de não ter conseguido alargar a rua do mato e o cemitério. Infelizmente a terra tem estado na mesma, com pouca evolução. A junta continua lá no mesmo sítio com uma delegação mas não tem havido evolução nenhuma.
A Calhandriz é uma terra onde a maioria das pessoas tem mais de setenta anos. Os mais novos não se fixam lá porque não conseguem construir em terrenos dos pais que estão em zonas protegidas. Os outros não arranjam trabalho e vão para fora. E quem viver ali tem de ter carro, senão não consegue ir a lado nenhum, porque só tem autocarro de manhã, à hora de almoço e à noite.
Não gosto de estar fechado num gabinete. Para mim, que fui criado no campo, passar os dias fechado dentro de quatro paredes deixa-me doente. Trabalho na câmara há 33 anos e ultimamente sou também motorista do presidente da câmara.
Sou um poço sem fundo. Não ligo às conversas do carro e faço por não ligar. A honestidade neste trabalho é fundamental, bem como cumprir horários e estar nos locais a tempo, fazer o trabalho de casa e planear percursos. Estes são trabalhos que nos tiram muito tempo e o apoio da família é fundamental. Aprendemos a colocar o trabalho à frente da família. Felizmente a minha família ajuda-me imenso. Aqui temos de ter muito empenho e dedicação. O segredo para o sucesso é esse. E ter muito sangue frio.
Gosto de chegar a casa, jantar e ir ao café. É aí que gosto de descomprimir e para mim é obrigatório todos os dias. Por vezes também ajudo o meu pai na agricultura, ele tem uma pequena vinha e árvores e tento sempre dar uma ajuda e ao mesmo tempo estar entretido. É difícil tirarem-me do sério. Sou uma pessoa muito calma e o mais certo é ouvir e calar e, mais tarde, responder com calma. Digo sempre o que penso mesmo quando sei que isso pode não agradar a quem me ouve.
Sou um bocadinho refilão mas não sou pessoa de conflitos. Gosto de futebol, sou benfiquista mas não sou doente. Não tenho grandes sonhos. Quero sobretudo ter saúde e gosto muito de passear. Mas não gosto de praia. Ir um dia à praia por ano para mim chega. Quando vou passear gosto sobretudo de ver museus, conhecer novas terras ou visitar igrejas, apesar de não ser católico praticante. Do nosso país gosto muito da zona norte, não só pela montanha como também pelos monumentos.

“Digo sempre o que penso mesmo quando sei que isso pode não agradar a quem ouve”

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