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Uma vida “encaixilhada”

Rui Escudeiro é serralheiro civil

Aos 35 anos, Rui Manuel Escudeiro Pereira já teve mais de meia dúzia de profissões mas, como não há amor como o primeiro, decidiu enveredar pela serralharia civil, actividade que foi “forçado” a exercer aos 15 anos de idade, quando o seu pai achou que já era altura de deixar de “passear” os livros e entrar no mundo do trabalho. Passados nove anos sobre a sua primeira experiência trabalha sete dias por semana, não tem horários e férias só mesmo uma semanita por ano. Ser dono de si próprio e não depender de patrões traz algumas vantagens, mas também “muitas dores de cabeça”.

Nunca foi grande entusiasta da escola e por isso, quando tinha apenas 15 anos, o pai decidiu-lhe o futuro e arranjou-lhe um trabalho numa serralharia civil. Hoje Rui Escudeiro Pereira pode agradecer ao progenitor esse acto que na altura lhe custou a digerir. Não é fácil deixar uma “actividade” tão leve como “passear” livros e passar para um trabalho “pesado”, que deixa marcas nas mãos.Foi aprendiz de serralharia até aos 19 anos, altura em que foi chamado para a tropa. Os 15 meses passados na messe de oficiais levaram-no a pensar enveredar pelo caminho da restauração, entrando numa equipa que servia casamentos e outros eventos em restaurantes da zona. Depois de uma semana fechado no quartel, os fins-de-semana eram passados dentro de um restaurante, a servir bodas.Uma actividade que, nunca sendo a principal, se manteve até há pouco tempo, quando decidiu arrepiar caminho por conta própria. “Gostava muito de servir à mesa, só não o faço agora porque o tempo não estica”, diz o morador em Fungalvaz, concelho de Torres Novas.Acabado o serviço militar obrigatório Rui Escudeiro pensou voltar para a serralharia onde tinha iniciado a actividade como aprendiz mas o vencimento então proposto pelo patrão não o convenceu. Foi então que durante cinco anos fez um pouco de tudo – “nesse meio tempo foi estivador, trabalhei numa fábrica de sofás, fui empregado de balcão”, refere.Não chegava a aquecer o lugar por onde passava – “não gostava do que fazia e para fazer bem tenho de gostar do que faço”, diz o serralheiro. Durante uns tempos esteve também à frente do Café Castiço, propriedade do seu pai, mas um dia teve um desaguisado com ele e acabou por deixar de servir imperiais e cafés para voltar à serralharia.Durante quatro anos teve numa empresa de caixilharia de alumínios onde fez de tudo um pouco. Esse facto levou-o a adquirir um know how que lhe permitia partir para outros voos – “sempre quis ter um negócio meu, ser patrão de mim próprio”, diz. Um sonho que concretizou em 1999.“Partir do zero é sempre difícil” diz, acrescentando que teve muita ajuda da família. E dos amigos, que “espalharam” a informação. “Neste tipo de negócio, a melhor publicidade é a que funciona boca a boca. Porque se alguém refere o meu nome a outro é porque está satisfeito com o meu trabalho.Começou com o mínimo necessário, num barracão do pai. Pediu empréstimo para comprar algum equipamento – “não o que queria mas o que podia pagar” – e avançou. Em Janeiro do próximo ano comemora três anos de actividade e diz não se poder queixar. “Há meses bons e menos bons, mas isso acontece em todos os negócios”.Portas, janelas, clarabóbias e portões são o mundo de Rui Escudeiro. Compra o material “à vara”, um perfil de alumínio de seis metros que pode vir já com cor – branco, verde, amarelo ou a cor que o cliente quiser – ou em bruto. Para fazer uma porta, por exemplo, são necessárias quatro tipos de vara de alumínio – “uma de aro, uma de z, uma de bico e outra de travessa”. Rui Escudeiro diz ainda que qualquer profissional que queira apresentar um trabalho digno tem de ter uma boa máquina de corte, um cunho para medidas específicas, uma freza copiadora e uma máquina de emalhetar. Com boas máquinas, em quatro horas faz-se uma porta de medidas normais.A segurança no emprego é ponto de honra para o serralheiro, talvez por isso nunca tenha tido problemas de maior no exercício da sua actividade. É raro esquecer-se de usar auriculares e óculos de protecção – “não quer dizer que isso não suceda de vez em quando”- e tenta que os empregados sigam o seu exemplo.Trabalhar por conta própria traz algumas vantagens mas também algumas coisas menos boas. Desde há três anos a esta parte que foram poucos os fins-de-semana completos que o serralheiro teve. “Há sempre obras para ver, medidas para tirar, ou simplesmente a feitura de um orçamento”, diz, adiantando que já houve casos em que deixou a confraternização com os amigos para atender um potencial cliente.Se fins-de-semana são poucos férias é só mesmo uma semana, nunca em Julho ou Agosto porque são geralmente os meses de mais trabalho. “Porque sou patrão de mim próprio imponho um ritmo mais exigente, horários mais rígidos”.Normalmente entra às 8 da manhã e só quando vai pôr o filho mais velho ao jardim de infância é que toma o pequeno almoço, sempre no café. A única hora definida é a de almoço, “porque os empregados vão almoçar e ”. Lanche nem pensar e jantar tanto pode ser às 20 ou às 23 horas.E não raras vezes faz serão – ou a acabar trabalhos ou a receber clientes, “porque as pessoas também trabalham e só podem cá vir depois do expediente”. Para entregar uma obra no prazo acordado já trabalhou até às seis da manhã e faz muitas vezes noitada até às duas ou três da madrugada. Sempre com o rádio por companhia, “para quebrar um pouco o ambiente e ouvir algumas notícias”. Uma vida agitada que só consegue fazer porque tem uma mulher compreensiva. “A minha mulher ajuda-me muito, como é contabilista eu nem mexo nos papéis, deixo a parte burocrática para ela”. Já diz o velho ditado que por detrás de um grande homem está sempre uma grande mulher...Margarida Cabeleira

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