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Por amor à arte

Elsa Baptista é especialista em ícones russos

Elsa Baptista é uma das 27 especialistas em ícones russos que existem no mundo. Trabalha com imagens pintadas da virgem, dos santos e anjos ou de cenas bíblicas, usadas principalmente nas igrejas orientais católicas ou nas igrejas ortodoxas. A especialista, a residir no Vale de Santarém, serve de intermediária entre quem vende e compra as obras religiosas. Garante que ninguém enriquece a trabalhar com ícones. “É um trabalho que se faz por amor à arte”.

Um cristo pantocrator bordado a prata e enriquecido por pedras granadas e turmalinas do sul da Rússia, século XIX, estilo nazareno, é uma das peças que integra a exposição de ícones russos no átrio do Hotel Corinthia, em Santarém, organizada por Elsa Baptista, uma das 27 especialistas em ícones russos que existem em todo o mundo.Uma imagem dos dias de festa, século XVII, com as cenas da paixão de cristo em miniatura, também prendem a atenção do visitante. Tal como as representações de Nossa Senhora que são as mais procuradas.O ícone de Nossa Senhora da Sarça Ardente, de Vladimir e das Três Mãos completam a exposição de imagens que eram utilizadas para a oração. A especialista, 44 anos, a residir no Vale de Santarém, gosta de expor as peças para poder convidar as pessoas a ver o conjunto de obras de arte. “É muito diferente chegar a casa das pessoas e levar as peças do que ver uma exposição no hotel com calma e a beber o seu chá”. Organiza muitas exposições para promover as obras de arte que vai encontrando. Umas vezes ganha, outras vezes não. “Gosto imenso que as pessoas conheçam e que tenham gosto em ouvir aquilo que tenho para explicar. Tenho pessoas que ao princípio nem gostavam destas peças e que com o tempo começaram a perceber e a sensibilizar-se com este tipo de arte”.Com a peça entrega sempre um certificado e um trabalho sobre os ícones. “Há clientes que já identificam as peças com facilidade”, diz orgulhosa. O Hotel de Santarém é um dos seus espaços preferidos para expor. Em Março terá uma exposição de antiguidades no Convento do Beato e durante o mês de Maio estará em Fátima. A especialista escolhe os hotéis por questões de segurança e porque ao fim de semana são espaços muito procurados. Elsa Baptista é contactada por pessoas que têm peças para vender, mas nem todas interessam. “A maior parte das peças ou estão restauradas – e não vendo peças restauradas – ou estão danificadas ou então são cópias e nada disso me interessa. Em média em 300 peças vejo cinco que me interessam”, explica. Trabalha sobretudo com colecções particulares. São peças boas, genuínas e também é bom porque não faço um investimento tão grande”. Quem vende as peças são sobretudo estrangeiros. Para encontrar as peças vai a leilões à Suíça, Áustria, Alemanha ou compra a russos que já estão na Europa.A experiência ensinou-lhe a diferenciar uma peça original de uma cópia com um simples olhar. “Varia muito o tipo de pintura, a própria cor e a camada das tintas. Apesar de haver escolas que pintam à maneira antiga quando olho para um ícone, vejo logo se é antigo”.A especialista sabe identificar em que escola é que foram pintados. “Os ícones são mesmo apaixonantes porque quanto mais se conhece mais se gosta”. São as avaliações que lhe ocupam a maior parte do tempo. Não tem uma horário definido, mas é raro ter um fim de semana livre.As peças são compradas por novos e velhos de diferentes estratos económicos. “Tenho pessoas que estão um ano a juntar dinheiro para comprar uma peça. E também há as pessoas que compram a peça porque fica muito bem com a decoração”, explica. Os preços, que atingem os milhares que euros, dependem da antiguidade e da escola. “A pintura feita à lupa é sempre mais dispendiosa porque é uma pintura muito mais rara de encontrar em boas condições. São figurinhas muito pequeninas”. As escolas da zona de Moscovo são mais dispendiosas. “São escolas que pintavam pouco e só por encomenda. O que aparece mais são os pintores ambulantes. Monges que andavam de aldeia em aldeia a pintar”.Existem 365 diferentes imagens de nossas senhoras da arte ortodoxa – as mais procuradas - e quatro mil santos. “Ainda hoje me aparecem de vez em quando santos de regiões específicas que não conheço”.Só trabalha com peças que gosta. “Tenho que me apaixonar por cada peça para conseguir fazer transmitir à pessoa que gosta dela aquilo que sinto porque o ícone é uma coisa espiritual.”. Elsa Baptista garante que não é uma actividade muito rentável. “Ninguém fica rico a trabalhar com ícones. É um trabalho que se faz por amor à arte e não por interesses económicos”. Por vezes ganha mais com uma avaliação do que a vender uma peça.As viagens são o grande sacrifício da profissão. “O que gosto mais é da descoberta das peças. Adoro entrar numa casa e ver o que as pessoas têm e só com um simples olhar saber quais são as peças que vou querer levar”. Aprendeu a ler as legendas dos ícones que são escritas a eslavo eclástico, o russo da antiguidade que era escrito pelos monges, que muitas vezes não escreviam a frase completa. Trabalha desde cedo com antiguidades. Há 17 anos, quando conheceu o marido, passou a dedicar-se só aos ícones. Há sete anos, depois da morte do marido, passou a trabalhar sozinha. No início foi difícil porque era uma matéria que as pessoas não conheciam. “Ao princípio eram sobretudo pessoas mais velhas, mas agora é interessante ver que os casais jovens que vão casar já querem um ícone”.Ana Santiago

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