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Santarém versus Tomar

Uma resposta a José Miguel Noras
José Miguel Noras, em artigo de opinião publicado na edição de O MIRANTE de 19 de Dezembro p.p., realizou um conjunto de comparações irónicas e bem dispostas sobre as cidades de Santarém e de Tomar.Segundo o autor o sarcasmo tomarense sobre Tomar ter sido elevado a cidade 24 anos antes da capital do distrito está bem patente na simples frase “Da cidade de Tomar para a vila de Santarém”. Esta frase esteve presente na memória dos cidadãos de ambas as urbes entre 1844 (elevação de Tomar) e 1868 (data da elevação de Santarém a cidade). Prossegue o autor com as comparações não deixando de recordar que o Convento de Cristo foi classificado como Património da Humanidade em 1983. Se os 24 anos de diferença forem aplicados à situação da candidatura de Santarém a Património da Humanidade então só teremos notícias desta candidatura lá para 2007.No meio da ironia, o Dr. José Miguel Noras chama Santarém à colação. Historicamente a situação da dependência de Santarém em relação a outrém virá, porventura de 1147. A tomada de Santarém em 15/3/1147, ponto importante de vigilância e domínio dos campos da Balata, representa uma viragem importante na presença muçulmana na região bem como na dependência escalabitana em relação a Lisboa.A tomada de Santarém implica a obtenção de mais-valias para certas elites como foi o caso dos Templários. Graças à conquista ganharam o Eclesiástico de Santarém. A tomada de Lisboa, pela quantidade de meios militares envolvidos propicia o ressurgimento de um bispado que existia desde o Séc. IV. A conquista de Lisboa, a 21 de Outubro de 1147 (após cerco de quatro meses) foi o resultado concertado de forças portuguesas apoiadas por cerca de 10.000 cruzados. Com eles vinham o Bispo do Porto D. Pedro e o Arcebispo de Braga D. João Peculiar. Estas foram as figuras que convenceram os cruzados a ajudar à conquista de Lisboa e o resultado natural de uma conquista apoiada pela Igreja foi a restauração do bispado de Lisboa confiado às mãos de D. Gilberto (1148?-1164?). Para o novo bispado ter poder era necessário possuir território e a região de Santarém era a todos os títulos apetecível. Para o poder político convinha ter a Igreja a seu lado e Lisboa era um novo centro de poder. O centro político estava em deslocação e Lisboa seria o futuro.Voltemos a Santarém. Esta foi conquistada pelos exércitos de D. Afonso Henriques contando com o auxílio de um corpo militar: os templários. A mais-valia obtida pelos cavaleiros templários seria o Eclesiástico de Santarém, o que na prática lhes daria o pleno domínio da região. A rejeição desta doação real por parte do Bispo de Lisboa provoca um pleito que se arrastou até 1159 e que mostrou bem o papel e a força da Igreja no processo da Reconquista. O monarca interveio (diz-se que Afonso Henriques era um cavaleiro templário) e conseguiu que os templários desistissem a favor do Bispo de Lisboa e, em troca, receberiam toda a região de Ceras/Tomar em 1159. Tal decisão valeu que Santarém ficasse sem sede de bispado- estava em Lisboa- e perdeu o domínio templário cujo poder religioso estava na pessoa do D. Prior, o qual passou a governar um território “ nullius diocesis” de Tomar (isento da diocese). Na prática detinha o poder de um bispo e respondia directamente ao Sumo Pontificie. Santarém também perdeu esta oportunidade de poder ter a sede templária. Em 1975, o Papa cria a nova dioceses de Santarém. Foram 828 anos depois da conquista. Repôs-se a verdade.O facto de não ser sede episcopal impediu provavelmente de ser capital. As capitais da Europa como Paris ou Londres localizam-se a algumas dezenas de quilómetros da costa. Madrid ainda é um caso “sui generis” pois dista largas centenas de quilómetros. Lisboa é uma cidade à beira-mar plantada com todas as vantagens e desvantagens daí decorrentes. Mas não se deve esquecer o cerco naval ocorrido na Revolução de 1383-85, a presença da esquadra filipina em 1580 ou as esquadras de ingleses e franceses nas águas do Tejo. Se a capital de Portugal fosse Santarém estes factos não teriam tido lugar.Uma das lendas estruturantes para a região é a tão aclamada história de Santa Iria. O grosso da história passa-se em Tomar ( a Tomar sede de “ nullius diocesis”) e Santarém recebe o corpo da santa. Quando se conta a história é a vida e martírio que é referida. O local da sepultura fica um pouco na sombra. É verdade que tem a Lenda do Milagre mas como me dizia o Dr. Aurélio Lopes, Santarém não tem uma festividade que a projecte a nível nacional como acontece com as Festas dos Tabuleiros de Tomar e da Senhora da Agonia, de Viana do Castelo.Um último pormenor, desta feita urbanístico para demonstrar a fragilidade de Santarém. Qual é a praça , o largo de Santarém? Podem falar da Praça do Giraldo (Évora), da Praça D. Pedro IV ou Rossio (Lisboa), da Praça da República (Tomar) e estamos a falar de espaços hoje multifuncionais que tiveram desde sempre a função de unir pessoas através dos mais variados aspectos que formam a vida do Homem. Santarém usa como Praça o largo do Seminário. As pessoas habituaram-se a passar lá, os alunos do Politécnico usam-no como espaço para uma determinada fase da praxe. Mas não é sentida como o fórum, a praça, o Rossio de Santarém. E pelo que é dado ouvir não será com a construção do novo centro comercial que tal irá acontecer.Os escalabitanos olham para Santarém como o centro do mundo (em que o mundo é a sua região) e parecem não olhar para a lezíria e sua envolvente. Quem sabe não foi essa a falha na candidatura a Património da Humanidade. A situação deve ser alterada com o apoio de todos os que vivem e trabalham na região. A esperança deverá ser algo que se respira e um suporte para a tão almejada mudança de mentalidade.Ernesto Jana - Tomar

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