Um novo rumo para o ensino
Câmara de Torres Novas apresenta carta educativa
A Câmara de Torres Novas apresentou um documento guia para a reestruturação do ensino no concelho. As alterações programadas são profundas e a sua passagem à prática implica tempo e dinheiro. Muito dinheiro. A carta educativa foi apresentada pelo presidente da autarquia como um documento inédito e inovador, mas já em 1995 tinha sido elaborado e editado em livro uma carta escolar da autoria do então vereador responsável pela educação, Carlos Tomé.
O reordenamento de toda a rede escolar do concelho é o ponto chave da carta Educativa de Torres Novas, apresentada na quarta-feira, 25 de Junho. O objectivo é acabar com a dispersão geográfica e as más condições escolares dos actuais 79 estabelecimentos de ensino pré-escolar e do 1º ciclo básico agrupando-as em dez centros educativos, modernos e funcionais.Não existem datas nem prazos para a concretização do ambicioso projecto que, segundo as palavras do presidente da autarquia de Torres Novas, poderá chegar aos 25 milhões de euros (cinco milhões de contos). Valor que, como salientou António Rodrigues, a câmara está longe de poder desembolsar.“A carta escolar é um excelente documento, que tem uma virtude que pode tornar-se um defeito”, disse o autarca, adiantando que ela “é muito optimista, e bem”, em prever um novo figurino educacional para o concelho, “porque de uma vez por todas temos de acabar uma vez por todas com escolas de dois, três ou quatro alunos”.O reverso da medalha é o financiamento para a concretização real do reordenamento educacional do concelho – “é que estamos a fazer um plano que pretende revolucionar o sistema educativo de Torres Novas e não há verbas para este tipo de investimentos”.António Rodrigues “avisou” os (poucos) presidentes de junta presentes no auditório da Nersant que “estas coisas não se fazem todas em dois ou três anos”.RIACHOS VAI TER CAMPUS ESCOLARO primeiro projecto a avançar é denominado campus escolar da vila de Riachos. Segundo o autarca o projecto está já em fase final de execução e “há-de ser um grande azar não lançarmos este ano o concurso para a obra”. O campus de Riachos irá englobar a escola básica dos 2º e 3º ciclos e a futura escola básica do 1º ciclo e jardim de infância. Apesar de manterem as respectivas autonomias dos estabelecimentos, o campus escolar irá ficar fisicamente unido, em termos geográficos.O antigo edifício do centro de saúde, onde funciona actualmente o jardim de infância, irá ser adaptado e a actual escola básica do 1º ciclo sofrerá obras. Com o campus escolar deixará de haver os actuais dois jardins de infância e as duas escolas básicas do 1º ciclo, passando a haver a chamada EB1/JI, isto é, apenas uma escola de 1º ciclo que integra também um único jardim de infância, sendo que o número de alunos será o mesmo.Se as crianças de Riachos poderão usufruir dentro em breve de melhores condições escolares e sociais, as restantes crianças do concelho terão ainda que “penar” muito. E algumas até nem chegarão sequer a usufruir do novo equipamento.“Só podemos avançar para a construção dos centros escolares, respeitando o espírito da carta, quando tivermos financiamento para eles. Ou financiamento protocolado pelo governo e acredito que ele mais cedo ou mais tarde vai ter de fazer isso, ou por apoios comunitários, o que é cada vez mais difícil”.Então a carta escolar é um mero documento de prosa, podendo não passar do papel? Para António Rodrigues a carta escolar é necessária “quanto mais não seja para percebermos que é preciso muito dinheiro para fazermos obras e para sabermos o que queremos fazer”.“Timings” é que não há. Tudo irá depender das disponibilidades financeiras. No fundo, como disse o autarca, a carta “é uma flor muito bonita mas metida num canteiro cheio de areia, sem água e muito seco”.O reordenamento escolar prevê também a construção de uma escola básica integrada (EBI) a Norte do concelho, agrupando os 490 alunos das freguesias de Assentis, Chancelaria e Paço; uma escola básica do 1º ciclo com jardim de infância (EB1/JI) para o Pedrógão e Ribeira Branca (154 alunos) assim como outra EB1/JI para Zibreira, Parceiros de Igreja e zona rural da freguesia de S.Maria (157 alunos.Alcorochel e Brogueira (87 alunos) também vai surgir uma EB1/JI, assim como nas freguesias de Olaia e Santiago. Na recém criada freguesia da Meia Via, irá funcionar um jardim de infância (para 20 crianças) e uma EB1 (33 alunos) independentes.Na zona urbana da cidade, que compreenderá também Lapas, passará a existir apenas um jardim de infância em vez dos quatro actuais, no Bairro de Tufeiras, com 59 alunos, continuando a manter-se a EB1 Visconde de S. Gião nos actuais moldes. A parte urbana de Santa Maria também terá uma EB1, com capacidade para 277 alunos. O segundo e terceiro ciclo do ensino básico irá manter-se na EB 2/3 Manuel Figueiredo.A carta aponta ainda para a manutenção do ritmo de crescimento da escola profissional, de modo a sustentar a expansão deste sistema alternativo de ensino e propõe a criação de duas escolas superiores – escola superior de contabilidade e tecnologia e escola superior de engenharia – partindo do pressuposto da vinda da Universidade Lusíada para Torres Novas. A carta, considerada como “a mais bem feita que até agora apareceu” pelo professor Sousa Fernandes, da Universidade do Minho, assenta em oito parâmetros, desde o enquadramento legislativo até à monitorização do processo, este feito em parceria com a Universidade Católica.Uma carta escolar escondida na gavetaO presidente da Câmara de Torres Novas apresentou a carta escolar como se fosse um documento inédito no concelho mas a verdade é que já em 1995 Carlos Tomé, vereador da CDU então com o pelouro da educação, tinha apresentado uma carta escolar para Torres Novas, documento esse que foi pioneiro em todo o distrito.A carta escolar de 1995 resultou de trabalho científico da responsabilidade de João Freire, professor doutorado em sociologia do ISCTE, após análise de dados relativos a inquéritos formulados a todos os professores, encarregados de educação e alunos das escolas do concelho.A mesma carta escolar mereceu até apresentação pública numa cerimónia em que participou o então secretário de Estado da Educação, Jorge Lemos, tendo custado mais de mil contos à autarquia de Torres Novas.Segundo Carlos Tomé, “a carta nasceu do facto de não existir no concelho um levantamento da situação do ensino nas suas diversas vertentes, ter constituído um documento fundamental de estudo das condições de ensino e um instrumento de trabalho privilegiado para a definição e planeamento da intervenção das várias entidades neste sector”.“Na altura , penso ter-se tratado de um estudo inédito no distrito, ao qual não foi dada a devida atenção por parte da câmara”, diz o ainda vereador, agora sem pelouro. Em declarações ao nosso jornal, Carlos Tomé refere que a câmara “escondeu a carta escolar na gaveta” e nunca aproveitou os elementos tratados nem seguiu quaisquer recomendações resultantes da mesma.Aliás, algumas das conclusões da nova carta escolar de 2003 já a carta de 1995 apresentava. Mas durante estes oito anos de intervalo nada se fez no sentido de resolver as situações.Por isso, Carlos Tomé lamenta que a câmara apareça agora com um documento novo “como se tivesse tido uma grande ideia e uma grande iniciativa quando esse caminho já foi trilhado há oito anos com um trabalho inovador”.O vereador da CDU lamenta também que a autarquia tenha elaborado a carta escolar de 1995 mas não tenha assumido qualquer das 11 recomendações nela apresentada e “pretenda agora ignorar um trabalho pago pelo erário público que foi pioneiro na altura”.
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