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A serpente de sete cabeças ou o “11 de Setembro Português”

Miguel Noras

A juntar a este quadro deplorável, emergiu uma “espécie incendiária” que parece actuar, cirurgicamente, na floresta portuguesa, obrigando os heróis da luta contra as chamas a usar a mesma força de Hércules quando este defrontou a serpente das sete cabeças.

O calor excessivo e a mão humana, agindo com negligência ou de forma criminosa, puseram aos seus pés os tesouros florestais do país. A “serpente de fogo” que está a devorar o interior de Portugal provocou lágrimas de raiva, de consternação e de luto, também, no nosso distrito.O Governo decretou o estado de “calamidade pública” para todas as zonas atingidas e definiu os apoios destinados a compensar os cidadãos lesados pela fúria incendiária, cumprindo, sem atrasos, o que dispõe a legislação vigente.Os montantes financeiros, agora estabelecidos, poderão ser considerados apreciáveis, tendo em conta a recessão que se vive dentro e fora de Portugal. Todavia, essas verbas, ainda que pareçam gigantescas, representam uma diminuta fracção dos vultuosos prejuízos resultantes da acentuada “litoralização” do país e do consequente abandono do seu interior, somados à insuficiência de reformas nos planos do ordenamento e da prevenção.Por outro lado, a mudança de um país rural para uma “sociedade de serviços”, completamente alheada da “carta dos direitos da natureza”, tem vindo a provocar uma enorme acumulação de hábitos e de práticas errados para com a protecção do ambiente – ninguém, ou quase ninguém, se sente responsável pela limpeza das florestas, dos rios, dos campos, das valas, dos caminhos e dos canais.A juntar a este quadro deplorável, emergiu uma “espécie incendiária” que parece actuar, cirurgicamente, na floresta portuguesa, obrigando os heróis da luta contra as chamas a usar a mesma força de Hércules quando este defrontou a serpente das sete cabeças. O Governador Civil de Bragança fez esta síntese: “Relativamente ao que é criminoso, nunca haverá meios de combate suficientes. O problema só desapareceria se cada cidadão fosse bombeiro”. Tem, a meu ver, inteira razão: independentemente da existência de acções dolosas, este problema é de todos nós, como vem lembrando o Instituto da Conservação da Natureza. Como Ajudar? Cumprindo, integralmente, as leis já existentes visando reduzir os riscos de incêndio, o que evitará despender, instantaneamente, verbas como aquelas que acabam de ser anunciadas.Aos Governos caberá, ainda, a complexa tarefa de inverter a propensão do país para tamanhas calamidades. Nesta dimensão do problema, a receita já foi dada pelo nosso Chefe de Estado: “prevenir, prevenir, prevenir, prevenir!” – prevenir porque remediar significa a tragédia provocada, quer pela fúria das “hidras de fogo”, quer pela violência das águas das cheias que, por esta ordem de ideias, já deveríamos estar a prevenir!Post ScriptumUnidade NacionalHouve políticos que se instituíram como arautos da crítica, neste momento de grande desgraça colectiva. Não se aperceberam da extemporaneidade das suas farpas, nem – em alguns casos – da sua completa ignorância. É por isso de enaltecer a posição de estadista evidenciada por Ferro Rodrigues, ao afirmar, neste distrito, que a prioridade é apoiar quem luta contra as chamas e o momento é de “unidade nacional”. Não faltarão oportunidades para os combates partidários em sede própria e no momento certo. No terrenoO Governador Civil de Santarém andou no terreno (com a sua equipa) e mobilizou recursos civis e militares para dar maior eficácia ao combate aos incêndios, nesta região. Sempre ao lado dos autarcas dos municípios atingidos, o representante do Governo no nosso distrito terá, agora, uma nova tarefa: acompanhar a atribuição dos apoios “decretados” pelo Governo para minimizar as consequências deste “11 de Setembro Português”. Póvoa da Isenta (Santarém), 4 de Agosto de 2003.jmnoras@mail.telepac.pt

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