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Para evitar a inalação do fumo algumas pessoas cobriram a boca e o nariz com lenços

O retrato do inferno

Fogo deixou habitantes da Chamusca em pânico

Instalou-se o pânico na vila da Chamusca quando as labaredas começaram a lamber as casas situadas na zona mais elevada, junto ao Bairro 1º de Maio. Pessoas corriam desordenadamente tentando salvar o que podiam. Ouviam-se as sirenes de bombeiros e ambulâncias e, na falta de bombeiros, eram populares que tentavam apagar pequenos focos de incêndio. Uma nuvem de fumo fez a noite cair às quatro da tarde. Isto é p retrato do inferno, ouvia-se por todo o lado.

Sábado, a meio da tarde, a 20 quilómetros a sul da vila da Chamusca já se sentia o pânico. À beira da Estrada Nacional 118 , junto a Vale de Cavalos, centenas de pessoas olhavam para a enorme nuvem de fumo preto que se via no horizonte. Condutores faziam apressadas inversões de marcha para fugir das labaredas que lambiam o mato junto à estrada.Na Chamusca instalava-se o pânico. O fumo era sufocante. O ambiente era de pânico. Pessoas corriam de um lado para o outro sem objectivo definido. Três agentes da GNR faziam tudo para controlar o trânsito na Rua Direita de S. Pedro, no centro da vila, onde circulavam carros a alta velocidade com os quatro piscas ligados. O sol era uma bola roxa. Eram quatro da tarde e parecia que a noite já tinha caído.No largo dos bombeiros voluntários, onde se situa também o centro de saúde, havia pessoas com lenços a tapar a boca e o nariz. Olhos assustados interrogavam quem passava. Por entre sirenes e o corrupio de ambulâncias e auto-tanques, só se ouvia “isto é um inferno”. Mulheres ao telemóvel, com a voz a soluçar, tentavam falar com maridos e outros familiares. À porta do quartel um autocarro da câmara estava preparado para evacuar moradores, se fosse necessário. Antes já tinham sido transportados para as instalações dos bombeiros os utentes do lar de idosos, situado no bairro 1º de Maio, na zona alta da povoação, onde o fogo rondou as casas. Também as mulheres grávidas e crianças foram retiradas para a vizinha vila da Golegã, para prevenir eventuais complicações por inalação de fumo. No gabinete da protecção civil municipal o presidente da autarquia, Sérgio Carrinho, tentava manter a calma. O autarca ia marcando num mapa o avanço das várias frentes de incêndio. As informações que chegavam eram alarmantes. As chamas propagavam-se a enorme velocidade. “Nunca nos passou pela cabeça que isto pudesse acontecer”, comentava Sérgio Carrinho com ar preocupado. A mesma frase era repetida por Esmeralda Lino, que mora no alto da igreja de Nossa Senhora do Bonfim. “As chamas eram muito altas. Tive que fugir porque o fumo era tanto que já não conseguia respirar. Só tive tempo de trazer uma muda de roupa”, explicava.Pelas ruas do Bairro 1º de Maio, constituído essencialmente por casas pré-fabricadas em madeira, havia pessoas num corrupio desmedido a tirar bilhas de gás do interior das habitações. Nos passeios estavam embalagens de pacotes de leite. Maria Emília Ferreira não conseguia conter as lágrimas. “Ardeu-me a criação toda. Fiquei sem galinhas, patos e ovelhas que estavam no quintal da casa do meu irmão. Por sorte a casa não ardeu”, contava. A caminho da zona do Outeiro do Pranto, o alvoroço ainda era maior. João Marmelo corria de um lado para o outro, preocupado com a esposa que estava no Hospital de Santarém. Aflito ao ver as labaredas a caminhar para o seu terreno, o morador num acto desesperado soltou os dois cavalos que pastavam no local. No meio da atrapalhação a sua mulher caiu e foi pisada por um dos animais. No chão era visível uma poça de sangue. Na Rua Nova do Casalinho, dois homens tentavam evitar que o telhado de um barracão abandonado fosse consumido pelas chamas. Havia gente com baldes de água para ajudar, enquanto uma mulher, junto a uma mangueira calcinada gritava para que os homens saíssem de cima telhado. Entrar na vila nesta altura era a mesma coisa que entrar num inferno. Que o diga Maria José Marmelo que regressava da praia. “Quando cheguei à Chamusca nem queria acreditar. Fiquei numa enorme aflição”, conta, acrescentando que nunca tinha visto tamanha tragédia. Enquanto Elsa Ribeiro descrevia o sentimento geral. “Andamos todos aqui a toque de calmantes e a chorar. Se isto não é o inferno deve andar lá perto”.António Palmeiro
Para evitar a inalação do fumo algumas pessoas cobriram a boca e o nariz com lenços

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