Cavalos, castanhas e muita água-pé
São Martinho na Golegã até terça-feira
As ruas da Golegã em tempo de São Martinho estão cheias de cavaleiros e de amazonas, de charretes e de outros carros de tracção animal. Mesmo os burricos que por lá se vão vendo ajudam a compor a emblemática feira que tem o mundo equestre como mote. A festa abriu na sexta-feira, 31 de Outubro, mas o grande movimento espera-se a partir de hoje, quinta-feira.
Sem cerimónias oficiais, nem apresentação na Casa do Ribatejo, em Lisboa, como vinha sendo hábito, a 28ª edição da Feira Nacional do Cavalo e 5ª Internacional do Cavalo Lusitano, mais vulgarmente conhecida como São Martinho, abriu na sexta-feira com uma pequena recepção no picadeiro Lusitanus.“Este ano optámos por fazer a apresentação na Golegã, porque a feira é aqui”, justificou o presidente da câmara, Veiga Maltez. E foi sem cerimónia que se esperou mais de duas horas pelos jornalistas de uma das cadeias de televisão que ficaram retidos no trânsito. No picadeiro, os cavaleiros aguardavam pacientemente. Se a feira é do cavalo há que mostrar os trajes e a forma como os cavaleiros conseguem dominar as suas montadas levando-as a fazer passos e andamentos complicados. Para além dos cavalos, a arte equestre e os concursos hípicos e de atrelagem são os pontos altos da feira.No entanto, como frisou Veiga Maltez, o certame tem também “uma componente cultural”. E, na galeria do antigo museu Martins Correia, actualmente denominada Praça, foram inauguradas duas exposições de pintura cuja temática é a Golegã, o cavalo e o mundo taurino.Também na sede da ANTE, no picadeiro Lusitanus, Rui Fernandes tem patente uma mostra de escultura, desenho e aguarela. O artista plástico, residente na Golegã, é autor da maioria da estatuária da vila e é também da sua autoria o troféu do vencedor do concurso do melhor cavalo de sela. No Largo do Arneiro, o coração da feira, bem junto à manga, há uma paragem de táxi. Um possante cavalo francês, de nome Prado, puxa o veículo com lugares sentados para oito ou dez passageiros. “Somos de Vila Franca de Xira”, diz Rui Quintino, o dono da viatura, que acrescenta: “Criámos o táxi em 1995, para mostrarmos a lezíria aos turistas, e no S. Martinho vimos para a Golegã”. Quem quiser subir paga dois euros e dá uma voltinha pelo largo. Não é barato, mas andar de táxi não é barato em lado nenhum e, neste caso, não há bandeirada.O fumo dos assadores de castanhas espalha-se no ar, dando uma mistura de cinzento ao céu carregado a ameaçar chuva. Os lugares de assadores, 12 no total, são vendidos pela câmara e alguns chegam a atingir 2.500 euros. “Eu paguei 1.000 euros, que é o mais barato, porque fui das primeiras. Quando começa a picar chega aos 2.500 euros”, diz Rita, uma vendedora de olhos azuis que todos os anos vem de Lisboa para vender castanhas no S. Martinho da Golegã. “Há 26 anos que vendo castanhas no Rossio e já não sei quando comecei a vir ao S. Martinho. No início não pagávamos nada, depois começámos a pagar 10 contos e já vai em 200”.No entanto, o negócio deve ser rentável. Há quem venda cinco toneladas de castanhas durante a feira. E agora elas custam 1,5 euros a dúzia, bem quentinhas a queimar as mãos, porque o cartucho feito em folha de lista telefónica não conserva tanto o calor como a folha de jornal de outros tempos.E se as castanhas são imagem de marca, a água-pé ainda é mais. A Golegã teve mesmo a prerrogativa de ser a única terra no país onde se podia vender água-pé do ano pelo S. Martinho. “E esta pode beber-se, é feita de uvas, não tem cá mais nada, sou eu que a faço”, afirma peremptoriamente Francisco Moita, proprietário da “Taberna do Baco”.Para este ano, Francisco Moita fez oito mil litros de água-pé, branca e tinta, mais uns litros de abafado. Quando o S. Martinho chegar ao fim espera que os depósitos estejam vazios: “Penso vender tudo, tirando uns litros que ficam para mim”. E a freguesia não se faz rogada. Em copinhos, ou levando garrafas e garrafões para mais tarde, a água-pé vai saindo a um euro o litro. “Não saem daqui sem provar. É branca, tinta ou abafado?” Quem prova não paga nada, só quem fica. “Nós só vendemos a água-pé, mas ali atrás temos sempre um assador, para quem quiser trazer coisas para assar e ficar aqui a comer”, diz Francisco Moita. “Faz-se o intercâmbio de comédias”, acrescenta José Colaço, o “relações públicas” da Taberna do Baco, que fala pelos cotovelos, amigo do dono da casa desde os tempos da tropa em Timor. “Somos nós dois e estes amigos, fomos todos no mesmo barco e todos os anos pelo S. Martinho eles vêm à Golegã. Nem queira saber as histórias da tropa”, diz. O pior são as exigências impostas por uma legislação bem rigorosa para a abertura de bares. “A casa pode ver-se como está, toda arranjada. No ano passado, fiz obras na casa-de-banho e resolvi instalar uma sanita turca, em vez de uma de pé. É mais higiénico. Este ano dizem que preciso de uma das outras. Vejam lá se isto se entende. Exigem tantas coisas que acabam com as tabernas”, lamenta Francisco Moita.No primeiro fim-de-semana não faltaram sítios onde comer e muitos deles estavam “às moscas”, porque é a partir de hoje que gente de todo o lado começa a chegar. As vistorias iniciaram-se ontem e pelo caminho talvez possam ficar algumas portas fechadas.
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