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No mundo dos problemas

No mundo dos problemas

Alunos de todo o país participaram em Tomar na XXII Olimpíadas Portuguesas da Matemática

Chamam-lhes “loucos”, “anormais” ou “marrões”, por serem simplesmente os melhores estudantes nacionais na disciplina.Seis dezenas de jovens participaram nas XXII Olimpíadas Portuguesas da Matemática, realizadas em Tomar.

O aluno de camisola azul clara, sentado na primeira fila de uma sala de aulas da Escola Secundária Santa Maria do Olival, Tomar, brincava nervosamente com a caneta, talvez à espera que ela lhe pudesse dar a solução dos problemas que tinha à sua frente. Ele e mais 59 estudantes de todo o país participavam na décima segunda edição Olimpíadas Portuguesas da Matemática.Chamam-lhes “loucos”, “anormais” ou “marrões”, por serem simplesmente os melhores estudantes nacionais na disciplina da Matemática. Na sexta-feira de manhã 60 alunos de todo o país iniciaram o primeiro de dois exames (o segundo realizou-se no sábado), mas só no domingo souberam quem foi o grande vencedor desta mini-maratona de problemas, equações e números.O silêncio era total na sala de aula onde 12 alunos do 10º, 11º e 12º anos faziam o teste inicial. Uns completamente concentrados, outros parecendo ter a mente baralhada de tantos números. Como o rapaz da camisa xadrez, sentado na segunda fila, que coçava o queixo com a esferográfica e perdia o olhar no horizonte. Conseguiria ele decifrar o problema das galinhas do patrão do senhor Manuel? Quanto tempo é que o senhor esteve fora era o que a primeira pergunta do enunciado pedia aos estudantes, sabendo que o senhor tinha deixado um saco de comida por cada semana em que estaria ausente e que o patrão tinha decidido vender todas as galinhas, uma por semana. E ainda que, quando o senhor Manuel, ao regressar, tinha verificado que, quando a comida que tinha preparado terminou, esta tinha durado o dobro do tempo inicialmente previsto...O gaiato de cabelos louros e óculos, acomodado na última fila, fazia freneticamente contas na folha de rascunho branca e verde, enquanto descansava a cabeça na outra mão. A noção de que todos os bons estudantes de Matemática não são “normais”, ou melhor, têm qualquer coisa que à primeira vista os diferencia dos restantes alunos ficou esbatida naquela sala de aulas.A adolescente de longos cabelos castanhos sentada ao lado do rapaz louro, por exemplo, poderia perfeitamente passar por modelo fotográfico em qualquer revista teenager. E muito dificilmente alguém diria que aquela cara laroca era “barra” em Matemática.Assim como também poucos acreditariam que o jovem de blusão de penas sem mangas verde tropa, com ar bronzeado de quem pratica surf ou outros desportos ao ar livre é um dos 60 melhores alunos de Matemática a nível nacional.O professor de cabelos brancos que vigiava o exame levantou-se entretanto da cadeira para desentorpecer as pernas. Por detrás dele, um mapa a cor de rosa que tem a ver com uma Matemática bem mais negra – “A Europa hitleriana em 1942”.Mas para estes pequenos grandes génios, a batalha da semana passada não foi esgrimida com armas bélicas mas sim com caneta, borracha, esquadro e régua. Porque o futuro do país também precisa de homens que saibam se existe algum número da forma qqpp que seja quadrado perfeito, onde q e p são algarismos e q ¹ 0.Margarida CabeleiraMatemática mas não só As seis dezenas de estudantes que participaram na XXII Olimpíadas Portuguesas da Matemática, realizadas em Tomar nos dias 2, 3 e 4 (entrega dos prémios) deste mês, tiveram oportunidade de fazer outras coisas que não problemas e equações. Na sexta-feira, após a primeira prova, os estudantes partiram para uma viagem ao longo dos rios Nabão, Zêzere e Tejo, com paragem obrigatória no Castelo de Almourol.No sábado à tarde, visitaram o Convento de Cristo e à noite foram ao teatro, assistindo à peça T. de Lemptika, encenada pelo grupo Fatias de Cá.Para os responsáveis da Sociedade Portuguesa da Matemática esta foi uma forma de os alunos se descontraírem e absterem-se um pouco dos exames, ao mesmo tempo que ficaram a conhecer melhor uma região que muitos visitaram pela primeira vez. Mas isto não seria possível sem o apoio de diversos patrocínios, desde câmaras (Tomar e Constância) e escolas (Escola Prática de Cavalaria e Escola de Futebol de Tomar) a outros organismos de âmbito nacional, como a Fundação Calouste Gulbenkian, Porto Editora, Gradiva Publicações, Instituto Politécnico de Tomar, CP, Convento de Cristo, Texas Instruments ou Casio – Beltrão Coelho.Génios das contasJosé Eduardo Lopes, de Coimbra, Rita Serrano, de Lisboa, e Paulo Santos, da Marinha Grande, foram os grandes vencedores das XXII Olimpíadas Portuguesas da Matemática. No último domingo os três vencedores receberam das mãos do ministro da Educação a medalha de ouro por terem conseguido decifrar todos os problemas de geometria e probabilidades.Para eles a Matemática não é um papão e até tem “piada”, desde que se goste. Apesar disso os três medalhados pensam enveredar pela Medicina, embora esperem continuar a resolver problemas matemáticos.Não se sentem génios, nem sequer diferentes dos outros colegas, mas há ainda quem os aponte na escola como os “malucos” da Matemática.Para se ser bom aluno a matemática basta gostar. E interessar-se. Mas na opinião do José Eduardo, da Rita e do Paulo tem de haver também uma boa dose de incentivo por parte dos professores.Catarina vai mais longe e diz que os maus resultados nacionais desta disciplina se devem principalmente a uma questão de cultura. “As pessoas consideram normal fugir-se da matemática e não ter jeito nenhum para a disciplina, a começar pelos próprios pais”, refere a galardoada.Mas o que é que a Matemática nos traz de mais valia para o nosso dia a dia? “Desenvolve o raciocínio”, dizem em uníssono os alunos, adiantando que a mente fica muito mais clara e pronta para poder resolver os problemas que se nos deparam todos os dias.Desenvolver o gosto pela Matemática As Olimpíadas Portuguesas da Matemática são um concurso de resolução de problemas de matemática dirigido a estudantes do ensino secundário de diversas escolas do país, organizado pela Sociedade Portuguesa da Matemática. O objectivo do concurso é incentivar e desenvolver o gosto por esta disciplina, detectando vocações precoces nesta área.As Olimpíadas realizam-se anualmente, disputadas em três categorias – pré-olimpíadas, destinadas a estudantes que frequentam o 7º ano de escolaridade; categoria A, orientada para alunos do 8º e 9º ano e categoria B, para estudantes do 10º, 11º e 12º ano.Nas categorias A e B há duas eliminatórias e uma final nacional, enquanto nas pré-olimpíadas existe apenas uma prova que tem como objectivo despertar o interesse dos estudantes pela participação em futuras edições.A primeira eliminatória da prova decorreu em Novembro de 2003 em todas as escolas que manifestaram interesse em participar, tendo concorrido cerca de 15 mil estudantes de 840 estabelecimento de ensino. Na segunda fase, em que participaram 1400 alunos, a Sociedade Portuguesa da Matemática “dividiu” o país em três zonas – Norte, Centro, e Sul – tendo escolhido os 50 melhores alunos de cada zona (nas categorias A e B) e o melhor aluno de cada escola.Na final nacional, este ano realizada na Escola Secundária Santa Maria do Olival, Tomar, participaram 60 estudantes de Matemática de todo o país que nos dias 2 e 3 deste mês prestaram provas.Os 12 medalhados da categoria B – ouro, prata e bronze – vão fazer um curso de preparação no departamento de Matemática da Universidade de Coimbra para competirem em Julho nas Olimpíadas Internacionais da Matemática, a realizar este ano em Atenas, e nas Olimpíadas Ibero-americanas, previstas para Setembro, em Espanha.
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