“Sinto orgulho de ser sapateiro”
Pedro Valentim quis aprender o antigo ofício do avô paterno
Pedro Valentim nunca sonhou em ser doutor ou engenheiro. O jovem de 22 anos, residente em Quebradas, concelho de Azambuja, quis aprender o antigo ofício do avô. Hoje é sapateiro de profissão. Com três casas abertas. E muito orgulho.
“Sapateiro – serviços rápidos”, lê-se na porta de entrada da pequena loja da Rua Boavida Canada, frente à estação de comboios de Azambuja. Lá dentro um rapaz de rosto jovem e ar dedicado e profissional recebe o cliente. É Pedro Valentim, 22 anos, sapateiro de profissão. O jovem artífice residente em Quebradas, Alcoentre, concelho de Azambuja, já está habituado aos olhares admirados de quem procura a sua oficina. “Um sapateiro tão jovem?”, interrogam-se os clientes.Nessas alturas Pedro Valentim prepara-se para contar a história de sempre: “O meu avô era sapateiro e o meu pai aprendeu o ofício. Como eu gostava da área pedi ao meu pai que me ensinasse”, elucida o jovem.A escola não o motivou. Concluiu o nono ano, mas depois a vontade de garantir o próprio rendimento mensal levou-o a procurar trabalho. Trabalhou à noite no bar dos pais, conduziu máquinas e foi calceteiro. Até que decidiu pedir ao pai que lhe ensinasse o antigo ofício do avô paterno.Foi em Janeiro de 2005. Abriu a primeira oficina em Aveiras de Cima, Azambuja, com a ajuda do pai, guarda prisional de profissão. De dia trabalhava a fazer calçadas. À noite aprendia o ofício de sapateiro. A clientela aumentou depressa e em Março de 2006 decidiu abrir a loja em Azambuja. Um mês depois apareceu a possibilidade de comprar um espaço perto de um antigo sapateiro do Cartaxo e Pedro Valentim não desperdiçou a oportunidade.Tem três espaços de recolha e entrega de calçado, que mantém com a ajuda dos familiares, mas o seu quartel-general é em Azambuja. É lá que trabalha 18 horas por dia para dar resposta a todas as solicitações. “Começo às 07h00 e só termino à noite quando o cansaço do corpo já não me permite mais”, confessa.Foi o pai que o ajudou a montar a loja. A banca não acreditou no projecto do jovem. “Basicamente o que me explicaram foi que até aos 25 anos ninguém confia em nós”, afirma resignado. Sem a ajuda de um empréstimo bancário Pedro Valentim foi obrigado a avançar com pouco dinheiro e muita imaginação.A oficina de Aveiras de Cima foi montada com as ancestrais máquinas e instrumentos de sapateiro do avô. A máquina de coser Singer é centenária e as formas de sapatos já levam muitas décadas de uso. As máquinas que faltavam foram adquiridas em segunda mão. A máquina registradora da oficina de Azambuja foi comprada a uma empresa que fechou na vila e o balcão é um móvel antigo comprado a um amigo que estava a recuperar a casa da avó. Para angariar mais clientes Pedro Valentim inovou. Criou postos de recolha de sapatos para consertar e serviços invulgares, como o de alargar o cano das botas de senhora. “Nunca vi isso em mais lado nenhum, mas comecei a fazer com a ajuda do meu pai. Fazemos um efeito muito giro entrelaçado atrás da bota”, descreve entusiasmado.Pedro Valentim gosta de fazer todo o tipo de serviço, sejam capas ou meias solas. Cada serviço é um desafio. Sapato que sai da oficina de Pedro Valentim sai como novo, limpo e engraxado. “Foi um dos truques que o meu pai me ensinou”.O sonho do jovem, que nunca quis ser doutor ou engenheiro, é fazer um curso de formação de formadores para perpetuar os conhecimentos técnicos. “Não conheço nenhum curso de sapateiro. Daqui a pouco não há quem ensine o ofício e isto ainda acaba”, avisa.Pedro Valentim já teve dois aprendizes na oficina de Azambuja, mas acabaram por desistir. “Não tinham vontade de aprender. O nome de sapateiro parece que assusta. Eu não tenho vergonha nenhuma. Tenho até muito orgulho em dizer que sou sapateiro”.À segunda-feira também trabalha. Os tempos evoluíram e a profissão já não tem os “vícios” de outros tempos. “Antigamente ia-se buscar o calçado ao domingo. Dizia-se que ‘segunda-feira não é dia de sapateiro’”. O jovem empreendedor acredita que este é um nicho de mercado com futuro. “Hoje mais do que nunca qualquer calçado de senhora precisa de capas”, constata.Ana Santiago
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