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João Silva é um cozinheiro autodidacta

João Silva é um cozinheiro autodidacta

No restaurante de João Silva encontram-se pratos e ingredientes que não são muito comuns. Cozinheiro profissional há 16 anos, aprendeu a arte na Suíça e optou por divulgar em Tomar a chamada cozinha moderna.

A placa situada numa das vielas empedradas do centro histórico de Tomar indica “Casinha da Avó Bia”. O nome manteve-se por questões burocráticas, mas a outra placa que indicava “comida tradicional” já desapareceu, retirada pela nova gerência do restaurante. Lá dentro, num ambiente moderno, envolvido por música jazz, descobrem-se os novos sabores apresentados pela chamada cozinha moderna. O conceito é simples. Baseia-se na confecção dos alimentos, feitos no momento, sem grandes temperos e aprumos. O arranjo do prato mostra cuidado, jogando cores com sabores, combinando ingredientes pouco habituais e cativando o olhar pelo pormenor. É na apresentação que a cozinha moderna tem o seu segredo.Natural de Lisboa, João Silva, 40 anos, cozinheiro profissional há 16, aprendeu a cozinhar na Suiça. Um cunhado, proprietário de um restaurante perto dos Alpes, empurrou-o para a nova profissão, coisa que nunca lhe tinha “passado pela cabeça”. Começou pelo nível mais baixo, nos pratos frios (saladas). “Só passamos para os quentes depois de ter experiência durante um ou dois anos”. Garante que se tornou num autodidacta na cozinha. E porque continuou? Viajante por vocação, João Silva já percorreu vários pontos do planeta. Conheceu a Austrália, a Índia, o Vietname, Tailândia e praticamente toda a América do Sul, sem esquecer o continente africano. Pelos sítios por onde andou, aprendeu a saborear os novos paladares, em particular as especiarias. E foram elas que lhe deram o prazer de cozinhar. No entanto, nunca comeu nada de estranho à cultura europeia. O animal mais invulgar que provou foi um ouriço - “Não gostei, aquilo só tinha ossos. Não vejo necessidade nenhuma em comer essas coisas”. Afinal, diz o cozinheiro, há tanta coisa boa para provar… É o caso das “gambas à indiana”, o seu prato favorito. Os ingredientes são simples e podem ser desvendados: gambas, caril e leite de coco. O segredo está na mistura. “Gosto mais de cozinhar peixe do que carne”, afirma. No entanto, não é este o prato que mais sai no restaurante tomarense. A “dourada com amêndoas” e o mais banal “peitos de frango com cogumelos” são os preferidos por quem por ali passa. E há quem peça o célebre “Ensopado de Borrego”, conta com ar divertido, mas “não há”. Para João Silva, o português ainda é fã da máxima “encher a pança e sair mal disposto”. Mas não é essa a filosofia da cozinha moderna. As quantidades são “as suficientes para que se saia satisfeito”, garante.Quando abriu a casa, a língua que mais se ouvia dentro do restaurante era o inglês. Os turistas eram praticamente os únicos clientes. Agora, um ano depois, são os locais que aparecem mais vezes. “Fiquei admirado. Nunca pensei que os tomarenses aderissem”. Os jovens são os mais difíceis de convencer. O cliente habitual anda na casa dos 40 anos de idade, talvez porque esteja mais disposto a arriscar. Os mais novos pedem, regra geral, o famoso bife, com batatas fritas e ovo estrelado – “também não há!”. Quanto aos preços de cada prato, João Silva assume que uma refeição no seu restaurante pode ter um valor mais elevado, mas “pelo que vejo aí nos outros restaurantes não sou assim tão caro”. E lembra que muitos dos ingredientes são encomendados de propósito e outros nem sequer os consegue encontrar em Tomar. No Verão passado, desesperou por descobrir um simples gelado de limão para elaborar uma nova sobremesa. Só conseguiu encontrar numa casa especializada, mas pediram-lhe 11 euros por litro. Desistiu de fazer a sobremesa. A baunilha, ingrediente de marca da sua cozinha, tem que vir especialmente da Suíça, porque em Portugal não se encontra. “É muito difícil encontrar certos ingredientes. No mercado tradicional é impossível e nos grandes supermercados, muitas vezes, só se encontra por encomenda”, revela. João Silva voltou para Tomar há um ano, por razões pessoais – “queria que a minha filha crescesse aqui”. E para já não pensa em voltar ao país que o acolheu durante 16 anos. Assim como não pensa deixar a profissão. “Isto é para a vida toda. A não ser que me saia o Euromilhões. Aí não faço mais nada!”, sonha alto. Mas a profissão é para manter só no restaurante. Em casa, a cozinha está entregue à mulher.
João Silva é um cozinheiro autodidacta

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