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“Sou uma fadista tradicional que canta como reza”

A jovem fadista ribatejana canta sempre de xaile e com os olhos fechados. O cantor José Cid acredita no seu valor e desafiou-a para dar a voz a poemas de Maria Manuela Cid e a alguns fados imortalizados por Hermínia Silva.

Como é que surge o fado na sua vida?Foi com a Dulce Guimarães quando tinha onze anos. Um dia a Rádio Voz de Alcanena convidou-me para participar numa entrevista e puseram-me a falar com a Dulce. Ela perguntou-me se gostava de fado e eu disse-lhe que não. Ela achou uma reacção tão natural que nunca mais se esqueceu deste momento e eu também não. Curiosamente, foi com a Dulce Guimarães que comecei a gostar de fado.Vivia no concelho de Alcanena. Foi lá que cresceu?Eu nasci e cresci em Moitas Venda. Tive uma infância bonita.Quando é que cantou o primeiro fado?Foi num teatro amador lá na terra. Tinha apenas oito anos e participei na peça com o “Retrato Sagrado”. Foi muito giro. Eu tinha um grande à vontade e as pessoas achavam imensa piada. Cantou sem guitarra e viola? Foi sem guitarristas, mas com outros instrumentos. Tinha saxofone, viola baixo, violino e bateria.Mais tarde a estreia a sério foi em Lisboa?Foi no Teatro Maria Matos num programa da Rádio Renascença com o Fernando de Almeida que promovia os novos valores. Levava a música em play-back, mas o Fernando Almeida disse-me que tinha de cantar com guitarra e viola.A partir daí foi sempre a cantar?Cantei muito em festas das aldeias e em espectáculos de beneficência para crianças, idosos e pessoas doentes. Sempre gostei de ajudar quem precisa e sinto-me bem a cantar por boas causas.E nas casas de fado?Só fui uma vez a uma casa de fados no Intendente, em Lisboa. Era uma zona com má fama e o meu pai ia caindo para o lado, mas adorou. Cantei com a Anita Guerreiro que é uma artista e uma mulher fabulosa de quem gosto muito.Porque é que nunca optou por cantar em casas de fado?Eu gosto de liberdade e nas casas muitas vezes canta-se para ganhar dinheiro e por obrigação. Entendo o fado como um património da nossa cultura que deve ser muito cuidado. Em Portugal não se valoriza o fado como ele merece. O fado é sempre tristeza e nostalgia?O fado pode ser tudo. Depende do nosso estado de espírito, não tem que ser só fatalidade. Tem a expectativa de vir a ser fadista a tempo inteiro?É o que vou tentar fazer com este projecto que estamos a produzir. Já tentei com outros projectos mas foi complicado porque precisamos de alguém que nos dê a mão duma forma desinteressada e nos ajude a crescer.Descobriu a pessoa certa. É o José Cid com quem está a trabalhar?O José Cid tem sido um grande companheiro e amigo. Estou a gostar imenso de participar no projecto Sons do Tejo com o José Cid. É uma nova forma de promover o fado ribatejano, a dança e os seus bailadores e os poetas ribatejanos. O seu novo trabalho é só fado?É um álbum de fado com um grande envolvimento do José Cid que fez três músicas e tem estado a escolher a dedo os fados que vou gravar. É o produtor deste trabalho que muito me honra. Vamos recuperar fados de Hermínia Silva, que foi uma grande fadista e tem andado esquecida. Vamos gravar poemas de Maria Manuela Cid, uma grande poetisa ribatejana, natural da Chamusca, e que o José Cid muito admira.Vais ser acompanhada por dois excelentes guitarristas?O Pedro Amendoeira na guitarra portuguesa e o Tiago Silva na viola de fado vão gravar connosco este álbum que espero seja lançado brevemente.Porque é que escolheu o nome Maria Veneno?O meu nome é Adília Pedroso e não me parecia um nome forte. Escolhi Maria porque é o nome mais popular em Portugal, somos um país de Marias. O Veneno fui buscar ao avô materno Francisco Duarte Veneno, pastor de profissão.Pode ser interpretada como uma mulher veneno?Não sou. De veneno só tenho o nome. Sou uma mulher muito doce.O projecto da Maria Veneno vai mudar a sua vida?Eu acredito que sim. Tenho uma grande fé e esperança de que com muito trabalho e humildade vou conquistar o público. Vou ter fados com muito sentimento e outros mais picadinhos e alegres que vão tocar as pessoas.Uma fadista tem de cantar de xaile e de olhos fechados?Não me sinto bem se não o fizer. O fado exige-o.Não se revê no novo fado?Eu sou uma fadista tradicional que canta como reza. Para mim o fado é uma letra com uma mensagem e um contexto e o fadista é o personagem dessa mensagem. O fado moderno não me diz nada. O fadista tem de encarnar a letra do fado?Por vezes envolvo-me tanto no fado que canto que me arrepio. O fado resulta muito melhor se sentirmos o que estamos a cantar. Eu canto de olhos fechados mas sinto o público.Nos últimos anos surgiram imensas escolas de fado…Apareceram várias escolas e ainda bem porque estão a surgir muitos jovens a cantar bem. Para mim a escola mais importante é a da vida. Onde se aprende melhor é cantando em frente do público e ouvindo quem canta e toca bem.

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