uma parceria com o Jornal Expresso

Edição Diária >

Edição Semanal >

Assine O Mirante e receba o jornal em casa
31 anos do jornal o Mirante
“Não me deixo influenciar pelo imaginário dos toiros e toureiros”

“Não me deixo influenciar pelo imaginário dos toiros e toureiros”

Carla de Oliveira, uma pintora que nasceu em Vila Franca de Xira e tem o Tejo no horizonte

Nasceu em Vila Franca de Xira com o Tejo por pano de fundo, mas foi em Alverca que viveu sempre. Aos 28 anos, Carla de Oliveira é mãe, técnica oficial de contas e pintora nas horas vagas. Prefere o figurativo ao abstracto. Dalí é uma referência. Pinta a carvão e a pastel e não se lembra de todos os sítios onde já expôs. Mas a primeira vez que deu um autógrafo corou de vergonha.

Quem é a Carla Sofia Freitas de Oliveira?É uma pessoa muito simples e que gosta essencialmente de pintar.E quando é que o gosto pela pintura entrou na sua vida?Entrou quando teria uns 16 anos. Começou por mera curiosidade e depois passou a gosto pessoal. Comecei por observar muito. Os artistas a pintarem na praia, por exemplo. E a partir daí quis aprender ao máximo. Sempre mais e mais. Depois foi sempre o querer desenvolver mais e mais. Como define a sua arte?É uma arte muito académica, muito embrionária. Sei que ainda tenho de evoluir muito e apreender bastante.Tem algum professor que a tenha marcado?Sim! O primeiro foi, obviamente, o Júlio Carmo Santos - o meu mestre na Sociedade Filarmónica Recreio Alverquence. Com ele aprendi o básico que sei. Mais tarde, comecei a frequentar as aulas de pintura da Sociedade Nacional de Belas Artes e aqui recordo-me de um outro grande mestre: o professor Jaime Silva.E pintores, admira o trabalho de algum em especial?A Paula Rego continua a ser para mim aquele supra sumo. Também gosto muito do trabalho do Pedro Cabrita Reis.Numa escala mais internacional, quem é o seu pintor de eleição?Confesso que adoro o trabalho de Dalí. Gosto da maneira que ele arranjava para se expressar. O surrealismo na pintura fascina-me bastante.Que museu gostaria de visitar?Ai tantos! Gostaria de visitar todos os europeus e também alguns nos Estados Unidos. De que maneira é que as paisagens de Vila Franca de Xira a influenciam?Apesar de viver em Alverca, Vila Franca de Xira é a terra onde eu nasci e isso terá, com certeza, o seu peso. Mas não tenho nenhuma tágide em especial. E confesso que não me deixo influenciar muito pelo imaginário dos toiros e dos toureiros. Qual é o peso da inspiração?O peso da inspiração vem do dia-a-dia, das situações que ocorrem, dos flash’s momentâneos. Uma coisa banal pode ser a base de um grande trabalho.Se falarmos em percentagem quanto para a inspiração e quanto para o trabalho?O trabalho ganha de longe! Eu diria 15 por cento de inspiração e o resto de trabalho.São as mãos que trabalham ou existe uma visão original?Acho que é mais o coração que trabalha e é a emoção do momento que me faz avançar. Geralmente não tenho uma ideia preconcebida. Tenho uma memória, qualquer coisa que me marcou no quotidiano e daí a obra surge. Se de repente lhe mencionar a palavra cor o que é que lhe vem à cabeça?Uma panóplia de coisas: pintura, telas… a expressão da cor!A arte é uma forma de libertação?Sem dúvida! Seja ela qual for! Escultura, pintura, literatura…Para uma pintora o acto de estar só é importante?É importante, sim. E não acho que seja só para os artistas, mas em todos nós. Afinal é um momento de introspecção. De que maneira é que a pintura e as contas de complementam? Não se complementam de forma nenhuma. A arte é um processo muito criativo e a contabilidade não pode ser criativo, até ficava mal dizer o contrário (risos). No entanto, complementam sim, a minha vida. A arte dá-me a liberdade de me expressar, de me mostrar aos outros e a contabilidade é algo de mais exacto, de mais certo.A Carla artista e a Carla contabilista são pessoas diferentes?Não… sou sempre a mesma.Acha que a sensibilidade de uma pintora é mais aguçada do que a das outras pessoas?Acho é que a pintora é mais atenta aos pormenores.Nunca pensou dedicar-se exclusivamente à pintura?Nunca vi a pintura de tal forma. Para mim é algo de muito livre. Faço quando me apetece. Sem obrigações, nem pressões. Acho que a arte é isso mesmo, algo de muito espontâneo.Se tivesse de escolher um quadro seu o que escolheria?Talvez escolhesse um da fase em que eu andei na Filarmónica Alverquence e outro da fase em que andei na Sociedade de Belas Artes. Mas eu não gosto muito, ou nada mesmo, de atribuir nomes aos quadros.Porque condiciona a interpretação?Também. Acho que cada pessoa deve olhar para um quadro e ver nele o que sente. Se lhe atribuímos um nome, estamos a impor uma sugestão, que a meu ver, é redutora, limitativa e condiciona a perspectiva de quem vê.De que maneira os seus quadros estão ao serviço da sociedade?Toda a arte é crítica. E a minha não deixa de o ser. De que maneira? Está em cada um dar uma interpretação. A Carla inscreve-se nalgum movimento ou nalguma escola?Eu faço parte do GART (Grupo de Artistas e Amigos da Arte).Olhando para os seus quadros de fora – se for possível – consegue identificar traços de outros pintores?Sim, identifica-se sempre traços de outros pintores. Eu consigo reconhecer nos meus quadros, traços do Júlio Carmo Santos, por exemplo. Eu aprendi muito por observação, a ler livros, a examinar pormenores. Aprende-se muito assim. É natural que ao longo do tempo a gente absorva certas técnicas. E depois a pouco e pouco tentamos inventar novas técnicas. Se fosse ministra da cultura e se tivesse de aplicar uma política imediata em relação à arte o que faria?Mais financiamento para as Belas Artes e uma grande aposta nos jovens talentos. A nova geração – onde me incluo - demonstra um grande gosto pela arte e uma enorme vontade de aprender. Portanto, devem existir políticas de apoio e incentivo.Qual é a interpretação que faz sobre a pintura contemporânea portuguesa?Acho que cada vez mais se está a trabalhar e a trabalhar bem. Há uma maior diversidade naquilo que se faz. E isso só pode ser bom.Qual foi o melhor conselho que lhe deram, quando quis começar a pintar?Não foi nenhum em especial. Disseram-me para trabalhar muito. Porque quando se trabalha muito, aprimora-se a obra.Tem algum capricho de artista que possa confessar?Não! Não! Não é fácil falar de nós, mas acho que não sou nada caprichosa. (risos)De todas as qualidades que lhe reconhecem qual é a mais verdadeira?Talvez a autenticidade!O próximo quadro vai ser um retrato do seu filho Afonso?Não. Eu já me recusei a fazer retratos. Não gosto de fazer retratos. Inicialmente fiz vários. Foi na altura em que andava à procura daquilo que gostava e queria. Hoje não gosto porque sinto que há pouca imaginação e pouca criatividade nos retratos.E já tem alguma ideia da sua próxima obra?Ideias tenho sempre muitas e as que não aponto no meu bloco, esqueço-me! A última que tive foi fazer quadros para crianças. Fiz imensos quando estava grávida.Onde é que gostava de expor?A minha actividade profissional não é a pintura. Sou técnica oficial de contas. A pintura para mim é um lazer. Obviamente que gostaria de ir o mais longe possível, mas sempre com a pintura na perspectiva de lazer. Também não tenho muitas pretensões em relação a isso. E neste momento estou muito focada na maternidade. É muito difícil escolher um sítio para expor. Há tantos e tão bons! Se sonhar alto, talvez o Museu do Prado! Qual é o lema que invoca mais frequentemente?“Tenta aproveitar todos os momentos da tua vida, são as pequenas coisas que fazem a felicidade”.
“Não me deixo influenciar pelo imaginário dos toiros e toureiros”

Mais Notícias

    A carregar...