uma parceria com o Jornal Expresso

Edição Diária >

Edição Semanal >

Assine O Mirante e receba o jornal em casa
31 anos do jornal o Mirante
João Ventura

João Ventura

55 anos, administrador da Trifoto, Santarém

Apaixonou-se pela fotografia aos 14 anos. Aos 55 é um empresário de Santarém desiludido com a cidade e com o ramo de negócio. João Ventura receia ter que fechar. O digital tornou moribundas as casas de fotografia e o Governo deu a última machadada ao fazer Cartões de Cidadão e Passaportes com recurso a máquinas que fazem as fotografias.

Comecei a trabalhar aos 11 anos como marçano. Aos 14 anos era quando os jovens da época tinham que ir aprender um ofício. Ou eram mecânicos ou topógrafos. Apareceu a possibilidade da fotografia. Tudo aconteceu por acaso. Uma fotografia ali, uma reportagem aqui. Os meus pais ficaram relutantes quando lhes disse que ia para fotógrafo, ainda se fosse para mecânico... Foi um época interessante. Não se começava logo a tirar fotografias. Ia-se para o laboratório. A preto e branco. Agora é tudo muito mais rápido. Ser fotógrafo não é só dar ao botão. O Estado faz concorrência desleal aos fotógrafos. Deixámos de fazer as fotografias para os passaportes e para os bilhetes de identidade. Era isto que complementava o nosso trabalho. O que é curioso é que obrigam a pessoa a tirar lá a fotografia, mas quando não conseguem fazer mandam ao fotógrafo. É obrigatório por um lado e por outro já não é? Foi uma maneira de tirarem o trabalho a milhares de pessoas. Depois dos 20 decidi montar negócio com um sócio. Estamos em Santarém há 30 anos. Na altura era considerado um negócio com possibilidades de crescimento. Também éramos chamados a casa das pessoas. Quando era preciso registar algo. Um prédio que caiu, fazer um levantamento qualquer. O fotógrafo é que tinha as máquinas para registar as coisas. Nas empresas, nas repartições, nas instituições públicas. Na câmara, no governo civil, na segurança social. Hoje todos os serviços têm máquinas digitais. Quem me diz que daqui a 20 anos as pessoas conseguem abrir aqueles suportes digitais? Não sei. Conheço casos de pessoas que tentaram abrir CD's e não conseguiram abrir as imagens. E aqueles CD’s só têm meia dúzia de anos. Para se ser um bom fotógrafo é preciso ter sensibilidade. Tem que se ter arte. Há pessoas que disparam muito bem, mas não basta. Tem que saber procurar-se o ângulo. Gosto muito de estúdio. Como gosto de reportagem... Se calhar estou mais ligado ao estúdio que é um serviço que se faz todos os dias. Para se ser fotógrafo completo deve ser-se um pouco as duas coisas. O cartão único acabou com tudo. O digital ajudou, mas esta foi a machadada final nos fotógrafos. Foi a ruína. Vivemos de um casamento ou outro, algumas reportagens e algumas pessoas que ainda vêm ao estúdio. Não sei se foi por má fé. O Governo fala do desemprego, mas arruinaram milhares de postos de trabalho em todo o país. A nossa actividade ficou reduzida a um terço. Chegámos a ter vinte colaboradores e agora temos seis. Caiu uma praga em Santarém que são as grandes superfícies. A autarquia esqueceu-se dos comerciantes pequenos. Quanto se chega às sete horas a cidade fecha. Porque não há ninguém. Enquanto não se puser as pessoas a morar no centro da cidade não há revitalização nenhuma. É só conversa. Quem investir dentro da cidade de Santarém é um herói. Às sete horas a cidade fechou. A culpa é dos políticos. Não se podem modernizar as lojas porque as pessoas não têm autonomia financeira para fazer obras. Há dias em que em algumas lojas do centro histórico não entra um cêntimo numa caixa. Se me tivesse acontecido a mim já teria fechado. Temo estas obras do Campo Sá da Bandeira, o tal passeio da liberdade. Fazemos molduras e carimbos. Não é só fotografia. É o que ainda nos vai safando. Há muitas pessoas que tiram fotografias e imprimem aqui. Sai muito mais barato. Com os rolos havia muito mais trabalho. Era aquela curiosidade de querer revelar para ir ver. Matou-se a curiosidade. Tenho três filhas e uma neta. Gosto de viajar. Também gosto de descansar e ter alguns bocados com a família, mas nunca tive grandes hipóteses ao longo dos anos. Faço duas semanas de férias por ano. Depois é trabalhar todos os dias. Às vezes de noite.
João Ventura

Mais Notícias

    A carregar...