A motorista que transporta dezenas de crianças diariamente
Desde criança que Anabela Santos tem paixão por motas e carros
A motorista do Instituto Conde Sobral adora o que faz e não trocava esta profissão por outra. Confessa que os laços construídos com as crianças são enormes.
Anabela Santos, 40 anos, entra pontualmente às oito da manhã na carrinha do Instituto Conde Sobral e faz o percurso habitual pelas ruas de Almeirim e Fazendas de Almeirim. Já lá vão 14 anos. O objectivo é trazer as crianças que não têm quem as transporte até ao edifício do jardim-de-infância que frequentam em Almeirim. São duas viagens de manhã e três ao final do dia. Cada viagem transporta 18 crianças devidamente acomodadas em carrinhos ou bancos com cintos de segurança, consoante a idade.Durante 12 anos as crianças eram transportadas numa carrinha de nove lugares. Sete crianças de cada vez supervisionadas por duas funcionárias. Como Anabela era a única funcionária do Conde Sobral que possuía carta de pesados de mercadorias e adorava conduzir pediu para ser motorista. Pedido aceite pela direcção. Com o passar do tempo, os responsáveis do instituto aperceberam-se que era necessário adquirirem um transporte maior para fazer face ao aumento de crianças que necessitavam de transporte.Há cerca de um ano e meio foi comprada uma viatura maior - com capacidade máxima para 18 crianças - que só começou a funcionar em Setembro passado. Para conduzir a nova viatura do instituto seria necessário possuir a carta de pesados de passageiros. Foi nessa altura que Anabela Santos resolveu concluir um projecto que andava adiado há mais de uma década.Desde criança que a funcionária do Instituto Conde Sobral tem paixão por motas e carros. Confessa que quanto maior for a viatura mais gozo lhe dá conduzir. “Não gosto de carros pequenos”, confidencia. Aos 18 anos tirou a carta de condução de ligeiros. Mas antes já conduzia carros e motorizadas com frequência. Desde os 12 anos que anda de mota. E nunca teve medo de ser apanhada. “Quando o meu namorado andava na tropa eu é que o ia levar de mota até à estação ferroviária para ele apanhar o comboio. E nunca fui apanhada sem carta”, recorda entre risos.O facto de ter começado a trabalhar com o pai, dono de uma suinicultura que fazia transportes com frequência, levou-a a obter a carta de pesados de mercadorias. Aproveitou e tirou ainda a carta de motociclos. Entretanto casou e ficou grávida. A sua vida mudou e decidiu procurar um emprego diferente. Encontrou-o no Instituto Conde Sobral. Começou por trabalhar como auxiliar. Ajudava na cozinha e onde fosse preciso. Mas, confessa que, não gostava muito do que fazia. “Como se costuma dizer, galinha de campo não gosta de capoeira e eu não gostava de estar fechada”, conta a O MIRANTE.Quando a instituição começou a fazer transporte de crianças Anabela Santos tornou-se a motorista oficial. Garante que foi a melhor coisa que lhe podia ter acontecido. A mãe diz-lhe com frequência que nasceu para homem uma vez que detesta os trabalhos atribuídos às mulheres. “Passar a ferro, limpar o pó, cozinhar não é para mim. Na carrinha faço quilómetros, vejo paisagens diferentes, converso com as pessoas. Sou muito mais feliz assim”, diz.Apesar de achar que já não existem profissões destinadas a homens e mulheres, Anabela tem consciência que esta ainda é considerada uma profissão masculina. Ideias preconcebidas que a motorista tenta derrubar. Mas nem sempre consegue. “Sinto que ainda olham de lado quando percebem que é uma mulher que vai a conduzir a carrinha. Alguns homens fazem comentários ou gozam mas finjo que não oiço e ignoro. Até porque levo crianças comigo”, diz.Anabela Santos garante não existirem diferenças na condução de veículos de maiores dimensões. “Deve-se ter maior atenção às distâncias e ao facto de transportarmos crianças connosco. Deve-se conduzir com prudência e não ter o pé pesado”, refere.A motorista adora o que faz e não trocava esta profissão por outra. Confessa que os laços construídos com as crianças são enormes. E é com emoção que os vê deixarem a Instituição e partirem rumo a novos desafios. “Não há nada mais reconfortante do que vermos que as primeiras palavras que as crianças dizem é o nosso nome. E quando eles já são adolescentes e passo por eles e me tratam por “tia Bela” e ficam a conversar comigo. É o melhor do mundo”, confessa, acrescentando que alguns dos “seus meninos” já frequentam a universidade.
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