Beja Santos defende que comprar o mais barato pode ter efeitos perversos
O especialista em assuntos de defesa dos consumidores acredita em grandes mudanças
O Estado vai passar a ter um papel mais interventivo. O espaço de manobra dos especuladores é cada vez mais reduzido. Os consumidores vão passar a optar por produtos recicláveis e vão reflectir sobre o custo de comprar barato.
A crise mundial vai provocar uma mudança de atitude das empresas e do Estado face aos consumidores. A opinião é do especialista em assuntos de consumo Mário Beja Santos. “O especulador irresponsável vai deixar de ter tanto campo de manobra como teve no passado e o Estado vai deixar de poder esconder-se atrás de um biombo em que só sai de vez em quando para agir a favor o interesse público. Vai ser obrigado a ser mais interveniente”, afirma.Falando a O MIRANTE à margem de um colóquio sobre a guerra colonial – Beja Santos foi oficial miliciano na Guiné-Bissau e tem dois livros editados sobre essa experiência (O MIRANTE de 28 de Maio) – disse acreditar que a nova situação vai mexer também com o posicionamento partidário. “Estou crente que vai haver uma atitude diferente. Tudo isso vai ser um acontecimento exaltante. O problema ideológico vai passar por aí. Aquilo que, no futuro, vai diferenciar a esquerda, o centro e a direita é a maneira como atribuímos um papel de responsabilidade e regulação ao Estado e a maneira como vemos os papéis do investidor, do empresário, do sindicato, do trabalhador…”Beja Santos diz que os consumidores estão relativamente bem protegidos em termos legais mas que têm que mudar a sua mentalidade a outros níveis. “As pessoas confiam demasiadamente no papel do Estado, que aliás tem tido muitos méritos. Mas ao verificarem que em certas circunstâncias as empresas não são castigadas consideram que pouco lhes compete fazer. Aí é que está o grande engano. Os consumidores deviam pensar, em primeiro ligar se tudo quanto compram é útil. Estamos a falar agora de uma nova realidade, que é o desenvolvimento sustentável. O Mundo em que vivemos precisa de sustentabilidade. Não podemos pensar que tudo o que se produz não é para ser reciclado. É perigoso esse juízo. Nós temos que comprar coisas que sejam recicláveis. Não se pode andar constantemente a deitar fora”.“Estão claramente referenciadas as áreas em que há grandes queixas e práticas comerciais desleais. Os problemas da segurança alimentar melhoraram significativamente nos últimos dez anos. O que tem que mudar é o comportamento das pessoas”, explica Mário Beja Santos. “Para além de optarmos por produtos recicláveis, temos que pensar nos custos de comprar mais barato. O muito barato pode significar a deslocalização de empresas para países de mão-de-obra barata. Pode significar que quem produziu aquele produto esteja a trabalhar 16 horas por dia e receba em paga um dólar e uma tigela de arroz. Ou seja, o comprar barato pode ser a atitude mais perversa do consumidor. É ter benefício à custa de milhões de operários que vivem miseravelmente”, conclui.
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