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Um espectador privilegiado da evolução tecnológica

Um espectador privilegiado da evolução tecnológica

Luís Santos é um homem da electrónica que desde os 18 anos faz o que gosta

Aos 60 anos, diz que a sua profissão está em vias de extinção. Ocupa os seus dias a reparar tudo o que tenha um chip electrónico, de televisões a aparelhagens. Assistiu à chegada do primeiro televisor a cores e ao primeiro LCD. “O lema agora é avariar e deitar fora”, assegura.

Dentro da pequena loja na Azambuja estão empilhadas várias dezenas de televisores, alguns leitores de DVD e aparelhagens. Alguns estão “curados” das suas maleitas, enquanto outros aguardam por algum componente específico que tem de ser importado. Luís Santos, 60 anos, é técnico de electrónica de consumo, uma profissão que está a entrar em extinção rapidamente. O seu trabalho é reparar tudo o que tenha a ver com electrónica, como televisores, leitores de DVD e aparelhagens Hi-Fi.O técnico é responsável por desenhar, projectar e montar componentes electrónicos, para todo o tipo de utilizações. Existem outras especializações, como a electromecânica, electromedicina e a electrónica de automóveis. Luís Santos especializou-se na de consumo, que todos os dias afecta directamente a vida das pessoas. “Quando a televisão avaria isso é sempre motivo de transtorno”, refere o homem que, aos 14 anos, tomou o gosto pela electrónica. Nasceu em Lisboa e mudou-se para Azambuja há 22 anos. Foi talhante e serralheiro para ganhar a vida, mas foi na electricidade que começou o fascínio pela sua profissão.“Fui assistente de electricista e daí até estudar electrónica foi um pulo. Depois de concluir o curso no Instituto de Instrução Técnica estive em várias marcas e tirei especializações em cada uma delas, incluindo no estrangeiro. Depois comecei a trabalhar por conta própria”, conta a O MIRANTE. Logo nas primeiras experiências criou uma consola de luzes e som, com circuitos, “stronglights” e vários LED a piscar em sequência.Na sua profissão, Luís usa alguns equipamentos básicos, como o osciloscópio (aparelho que mede sinais rádio), uma fonte de alimentação estabilizada, ferro de soldar e vários aparelhos de medida (tensão, resistências e intensidade de corrente). “E a cabeça, sobretudo a cabeça”, diz com um sorriso, enquanto assegura que antigamente os equipamentos avariavam-se menos. “Antigamente os componentes eram mais robustos e suportavam muito bem, por exemplo, as variações de temperatura e corrente. Esta nova microelectrónica não aguenta”, explica. Ainda assim, as reparações dos novos aparelhos são, na maioria das vezes, tão caros como um novo sistema, e há quem prefira deitar fora em vez de reparar. Para exemplificar a complexidade dos novos sistemas, Luís mostra-nos um “tuner” (sintonizador) que tem na mão. Este aparelho, parte integrante dos novos televisores, é o responsável por captar imagem e som. Tem mais de 500 peças microscópicas. A sua fonte principal de rendimentos é a reparação de televisores. Entre as avarias mais comuns estão a falta de imagem, som ou ambas. A profissão não é fácil. Requer estudo permanente para estar informado das esquemáticas de cada aparelho e requer muita matemática aplicada. “Depois temos ainda os códigos das resistências e dos condensadores. E eu ainda sou do tempo da válvula...”, diz com um sorriso o homem que assegura ter tido a sorte de acompanhar toda a evolução tecnológica. Dominar a electrónica tem as suas vantagens. A escolher um televisor na loja, por exemplo. “Nas grandes superfícies os vendedores têm super-amplificadores de sinal, que permitem mostrar uma imagem perfeita e nítida nas televisões, porque é muito forte. Porém, quando o cliente chega a casa e se tiver uma antena velha com sinal deficiente o aparelho fica cheio de chuva. Pode ter uma óptima imagem na loja mas em casa é sempre diferente”, avisa. E quanto menor é a avaria mais difícil se torna. “Uma avaria intermitente, um mau contacto, por exemplo, é terrível. Os condensadores são hoje microcomponentes que só se vêem através de uma lupa”, explica o nosso interlocutor, apontando para um pedaço de circuito que aloja milhares de pequenos transístores. “No futuro vamos compactar mais a tecnologia e reduzir cada vez mais os componentes. Vamos entrar num período em que o produto é feito para ser atirado fora quando se avaria fora do tempo de garantia”, lamenta, como que pressentindo que isso será o fim definitivo da sua profissão. “É triste mas ainda assim tenho a sorte de estar a fazer o que gosto”, assegura.
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