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Quatro cães e uma história de amor que a guerra matou

Quatro cães e uma história de amor que a guerra matou

Chama-se Mário dos Reis, tem 64 anos, e é um antigo combatente do Ultramar. Vive com quatro cães numa casa sem água ou luz em Santarém. Na segunda-feira o homem, que costuma passar os dias no jardim frente ao tribunal, recebeu a visita de dois dirigentes da Associação de Combatentes do Ultramar Português, que viajaram 300 quilómetros desde Castelo de Paiva, para o tirar da rua. A Segurança Social está a dar prioridade no acesso a lares públicos a ex-combatentes sinalizados pela associação, mas a hipótese de alugar um quarto ou integrar uma instituição está fora de questão. Mário não teria possibilidade de levar os companheiros. “Mário dos cães” já se habituou a ter o céu como tecto e não troca a liberdade pelo conforto limitado de quatro paredes. Prefere continuar a procurar uma quinta onde possa trabalhar a troco de um lugar para dormir e de um espaço para os animais. Usa boné camuflado, barba aparada e roupa limpa. O banho é tomado na Misericórdia de Santarém, morada para onde seguem 187 euros de rendimento social de inserção. “Gosto da vida que levo! O meu problema é o mesmo de todos os que combateram no Ultramar”, desabafa. Hoje traz queijo para o almoço. Sabe fazer pão, amassá-lo e até produzi-lo. De alguma coisa lhe serviu o curso de regentes agrícolas. Evita cozinhados à falta de um frigorífico onde possa manter os alimentos. Foi operário, tipógrafo, soldador, trabalhou na indústria química e foi vidreiro. Nasceu em Atouguia, Ourém. Gosta de cantar e fazer poesia sobre os desencontros da vida. Quando fala de amor os olhos enchem-se de lágrimas. Falar do coração é falar de Manuela “a miúda com quem ia casar”, mas que a guerra apartou. Hoje é insensível a quase tudo, mas tem alguns amigos. Despreza o cinismo e a vaidade. Foi legionário e foi às voltas pelo mundo que aprendeu a falar alemão, castelhano e árabe. São os cães que o seguram à cidade e ao país. Se assim não fosse voltaria a fazer-se à estrada. A liberdade é a sua forma de vida. Ana Santiago
Quatro cães e uma história de amor que a guerra matou

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