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“Quem precisa de casa não deve esperar muito tempo para comprar”

“Quem precisa de casa não deve esperar muito tempo para comprar”

Preço das habitações vai subir dentro de dois anos, diz Vasco Tavares

Fundador da delegação de Santarém da Associação de Empresas de Construção, Obras Públicas e Serviços (AECOPS), Vasco Tavares tem toda uma vida ligada ao sector imobiliário. Em entrevista a O MIRANTE o empresário de Santarém diz-se preocupado com a crise que já levou ao fecho de várias empresas mas confiante no futuro e nos sinais positivos que já vão surgindo no sector. Aconselha as pessoas a não esperarem para comprar casa, pois antevê um aumento do preço da habitação num prazo de dois anos.

Como analisa o momento actual do sector imobiliário?Preocupante e um pouco complexo. Parte da crise deve-se ao excesso da oferta. Até uma determinada altura houve uma euforia porque a banca incentivava a compra de casa. Mas os bancos não têm nada a ver com o número de pessoas que moram numa determinada cidade. Ou há população para comprar ou não há. E Santarém não tem crescido muito a esse nível. Os construtores dos prédios para venda são os que têm sofrido mais. Nos últimos dois anos fecharam portas cerca de uma dúzia de empresas de Santarém. Em Torres Novas, Abrantes e Tomar também houve falências. Está difícil vender em todo o lado. O pequeno construtor de moradias também tem menos trabalho. Algumas lojas de materiais de construção civil tiveram que fechar portas. As empresas que faliram não lhes pagaram. É um ciclo vicioso.O mercado está parado?Usando um termo de pescador, está a picar. Mas está difícil trazê-los para o anzol. Isso é tudo fruto da crise?Sim. As pessoas têm compromissos com a banca. Deixaram de vender ou diminuíram drasticamente as vendas. Eu próprio estou a construir e tenho dificuldades em vender. Não há quem compre e Santarém até não é uma cidade onde a habitação seja cara. Mas na questão do imobiliário compete a nós construtores analisar bem a situação e ver onde é que nos metemos. Não acho que as câmaras nem o Estado possam resolver todos os problemas. Cada um tem que ter a competência para gerir a sua actividade. Encontrar nichos de mercado que ainda os há.A cidade não tem compradores para a oferta que há no mercado?No momento não. Tenho vendido andares a compradores que já tinham casa própria ou alugada. São pessoas com uma certa idade, com a vida estabilizada e que quiseram mudar de casa. Isso não representa um aumento de população. Compram uma casa nova mas entra uma usada no mercado. Houve uma altura em que os andares usados se vendiam muito bem porque havia procura de casas para arrendar para estudantes. Mas como o número de estudantes diminuiu essa procura também decresceu.O que tem faltado a Santarém?Há uma tendência para dizer que a câmara deve fazer tudo. O problema não é só da autarquia mas também do tecido social. Sempre foi uma capital de distrito com muito funcionalismo público. Nunca houve um grande empreendedorismo. Nas freguesias do norte do concelho como Alcanede, Tremês ou Amiais há pessoas com mais capacidade. Quanto mais próxima está do centro, menos empreendedora é a população.Em 2006 disse que as análises de mercado são fundamentais. Mantém a mesma opinião?A realidade é que não fazemos análise de mercado. Vemos é se o colega está a vender bem. Deveríamos agir de outra forma. Saber quais são as reais necessidades do mercado. Se há compradores para aquele tipo de produto naquele local. Desde 2006 que isto tem vindo a piorar e o custo real da construção tem aumentado 5 por cento ao ano para os construtores. Mas não podemos criar um clima negativo. Dentro de dois anos, as pessoas vão ser confrontadas com a subida do preço das casas. Se pagamos mais ordenados e colocamos mais equipamentos nas casas, é inevitável esse aumento. Isto deve estar a chegar aos preços mínimos. Não será uma explosão mas daqui para a frente a tendência é para aumentar.Tendo em conta esse facto e apesar da crise este é um bom momento para comprar casa?Depende do que é que a pessoa precisa. Não aconselho ninguém a comprar casa para investimento. Ao contrário de muitos colegas, considero que a casa é um bem de consumo. Há uns anos as pessoas investiam para depois revender. Isso acabou. Os últimos a fazer isso já se viram aflitos para pagar aos construtores. Hoje, com o fisco a controlar o lucro e as escrituras a terem que ser feitas pelos valores reais, comprar para arrendar não é um bom investimento.Que conselho daria então aos potenciais compradores?Devem acreditar que as coisas vão melhorar. E que quem precisa de casa não deve esperar muito tempo para comprar. As poucas casas que existirem à venda daqui a dois anos vão estar mais caras. Porque os custos gerais e os projectos que são entregues agora nas câmaras, fruto da legislação europeia, como o aproveitamento da energia solar, vão encarecer o custo final.Mas os andares de luxo continuam a ter procura e a vender-se…Não têm como já tiveram. Prédios luxuosos, em Santarém, não há muitos. Podia ser um andar de cinco assoalhadas ou um duplex. Fui eu que fiz os primeiros quando houve a moda dos duplexes. Porque isto também é de modas.Mas a nível nacional têm tido saída…Quando se fala que o luxo vende, gostava de saber quantas unidades. Vende-se o luxo em Cascais, na Quinta da Marinha. Em Santarém não há uma classe com possibilidades de comprar coisas muito caras. Temos de somar dois ordenados. O da professora e do marido que é parecido com o da professora. E pouco mais.Há muitas pessoas a saírem dos meios rurais e a irem viver para o centro?Esse movimento sempre houve. A pessoa do meio rural que estudou, que arranjou um emprego na cidade e que vem para cá. Mas hoje as aldeias já não são o que eram. Houve melhorias significativas ao nível das acessibilidades e estão muito mais bem equipadas. Morar hoje na zona rural já não é um problema como o era no passado.Quem é que compra?Tenho vendido andares a raparigas formadas, com emprego, que têm alguma poupança ou a família ajuda. Mas não há um jovem rapaz a comprar um apartamento e a pensar no futuro. São alterações profundas da sociedade. Há mais raparigas nas universidades, elas estão mais estáveis, lutam mais e quando podem compram para terem a sua independência. São essas raparigas, algumas divorciadas, uma ou outra viúva que nos compram. É mais fácil vender hoje a mulheres que a homens. Um rapaz que acaba o curso e arranja um emprego encosta-se e fica em casa dos pais. Em Itália passa-se exactamente o mesmo. Lá são chamados de “mamones”. Encostam-se às mães. Mesmo os casais, eles têm as namoradas a jeito. Ela compra mas ele não colabora. É um fenómeno que alterou o conceito tradicional de família e que merece uma análise sociológica. Há muita gente a querer mudar de casa?As casas usadas valem muito pouco hoje em dia. As pessoas compravam uma casa por 20 mil contos e passado um ano vendiam-na por 25 mil. Agora não a vendem nem por 15 mil. Aparece gente a querer comprar casa nova mas querem vender a casa que têm noutros bairros, mas depois verificam que o andar deles vale pouco.“É preferível comprar do que arrendar casa”Como está o sector do arrendamento?Ainda se conseguem arrendar os andares usados que as pessoas foram herdando. Fazerem-se casas novas para arrendar é que é muito complicado. A legislação fiscal em vigor cria problemas muito graves. Se comprar um andar, está a investir. Para uma renda não ultrapassar os valores que as pessoas podem pagar, mas que seja ao mesmo tempo rentável, o arrendatário não pode alugar fazendo as contas a 5 por cento mas sim a 8 por cento. E isso atira a renda para valores incomportáveis. Os impostos que os donos são obrigados a pagar dificulta o arrendamento?Principalmente nas casas novas. O que poderia ser feito?Baixar o IRS nos arrendamentos. Fiz esta pergunta várias vezes a secretários de Estado. A resposta era que o Governo teria cuidado com a legislação fiscal nesse aspecto. Nunca fizeram nada. Quando se compra uma casa está-se a pagar duas prestações. A amortização de capital e o juro. Na renda paga-se o juro de um capital que não se tem, em condições desfavoráveis e que actualmente não compensa. É preferível comprar. Ou mexem na legislação fiscal para valer a pena arrendar casas novas ou então o arrendamento vai ficar para as casas antigas.Fundador da delegação da AECOPS em Santarém e presidente durante 20 anosVasco Tavares nasceu em Lisboa em 1932 e é pai de sete filhos. Criado na capital rumou depois ao Brasil onde conheceu a sua esposa e esteve durante 15 anos. Nesse período trabalhou na agricultura e foi empresário no sector da construção civil. Em 1963, juntamente com o seu pai, veio a Santarém para comprar os terrenos – hoje, Rua Padre João Rodrigues Ribeiro – que estavam à venda com projecto de urbanização parcialmente aprovado pela autarquia, como forma de dar enquadramento à Praça de Touros, que ainda estava no papel.Em 1972 fixou-se definitivamente em Santarém e fundou a empresa Vasco A. Tavares – Construções, Lda. Depois seguiu-se o 25 de Abril e o empresário recorda que nessa altura estava a construir a urbanização da Avenida Bernardo Santareno e que as coisas tremeram um pouco mas conseguiu dar a volta.Vasco Tavares foi o fundador da delegação da Associação de Empresas de Construção, Obras Públicas e Serviços (AECOPS) em Santarém, formada em 1988. Acérrimo defensor das delegações, orgulha-se de a de Santarém ter sido a segunda a ser criada, logo a seguir à de Faro. Foi seu presidente durante 20 anos. No ano passado decidiu abandonar o cargo e assumiu a presidência da assembleia da delegação da AECOPS de Santarém.Hoje com 76 anos – fará 77 em 16 de Outubro – Vasco Tavares tem toda uma vida ligado ao sector imobiliário, é um empresário de sucesso e um profundo conhecedor da realidade do mercado da habitação, principalmente na região, onde a sua voz é ouvida e a sua opinião é respeitada.É mais fácil vender hoje a mulheres que a homens. Um rapaz que acaba o curso e arranja um emprego encosta-se e fica em casa dos pais“Está na altura de falar de empresas que são exemplo de sucesso”Em tempo de eleições há muitas obras adjudicadas pelo Governo e autarquias… Isso é positivo e tem sido a tábua de salvação de muita gente. As obras são adjudicadas a grandes empresas que depois subempreitam muita coisa a empreiteiros que não são construtores de prédios para vendas. Conheço alguns que conseguem, andando de um lado para o outro e lutando, não estar em crise. São essas obras e mais algumas lançadas pelas câmaras que, fundamentalmente, estão a salvá-los. Toda a gente fala dos desempregados e ninguém fala dos empregados. Se há 10% de desempregados há 90% empregados.E quando terminarem essas obras?Há-de vir alguma coisa. E a situação estará melhor um pouco. Tendo em conta a realidade do país, 10% de desempregados não é valor considerável?Se não falarmos na percentagem de empregados, é. Mas não há desemprego no funcionalismo público. Aparecem nos jornais as empresas que fecharam. Penso que está na altura de fazermos as contas às empresas que não faliram. Mesmo em Santarém seria importante divulgarem essas empresas de sucesso.Houve desaceleração na construção?Estou a construir com licenças de há 10 anos. Tenho vários prédios licenciados em que tive a necessidade de diminuir o ritmo de construção. Mas não despedi ninguém. Há mais empresas nessa situação?Sim. Várias empresas diminuíram o ritmo de construção e outras obras tiveram mesmo que parar. A construção é uma actividade de capital incentivo. Somos financiados pela banca. Se acabamos os prédios e não vendemos é impossível continuar. Não há uma margem tão grande de capital próprio e financiamento que nos permita aguentar.Falou nos bancos. Acha que estão a provar do próprio veneno quando incentivaram ao consumo?É conforme a situação do momento. Houve uma alteração que foi importante. Havia três bancos especializados em Portugal em crédito habitação. A CGD, o Crédito Predial e o Montepio Geral. De repente a banca comercial começou a entrar no crédito habitação e isso veio criar uma grande concorrência entre eles. Não viu ninguém da construção civil a fazer publicidade na televisão. Mas isso levou a que agora haja crédito mal parado… Não é tanto como se diz. Os bancos resolveram apertar as regras nos empréstimos quer para os compradores de andares quer para os construtores. A banca está a exagerar em relação aos financiamentos para a construção. Para a compra, a banca está a emprestar dinheiro com spreads baixos mas só a pessoas que tenham capacidade financeira. Seguindo as recomendações internacionais de que uma pessoa não pode pagar mais do que um terço da sua renda familiar para a habitação. Até há bem pouco tempo, a banca emprestava dinheiro e fazia contas em que a taxa de esforço era muito superior.Mas há pessoas que tiveram de entregar as chaves das casas aos bancos…Há algumas mas também não são assim tantas quantas se pensam. Haverá uns leilões mas isso mais cedo ou mais tarde irá acabar.Vivemos numa sociedade de consumo. Isso é um aspecto que não ajuda a ultrapassar esta fase menos boa?O que funciona é a publicidade. Não chega ter um automóvel, um telemóvel, um computador ou uma televisão. Não há ninguém nem nenhum governo que vai alterar a mentalidade. Está na moda consumir. As pessoas endividam-se para viajar a prestações. Em Santarém haviam três agências de viagens hoje há 14. Se o dinheiro vai para as viagens não sobra para o resto.
“Quem precisa de casa não deve esperar muito tempo para comprar”

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