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Um radialista desbocado que assume a falha de ainda não ter sido processado

Um radialista desbocado que assume a falha de ainda não ter sido processado

Diogo Beja, a voz das manhãs da Antena 3 que começou aos microfones em Santarém

Foi em Santarém que entrou no mundo da rádio, então como Diogo Marona, e depois fez-se à vida em Lisboa, onde chegou, viu e venceu. Mudou de nome artístico por imposição de um director da Rádio Comercial, que apostou no apelido Beja. Assim nasceu o “The Diogo Beja Show”, um programa de rádio e uma marca de referência para muitos jovens deste país. A voz ganhou outro timbre aos 17 anos, após levar uma bolada numa zona mais sensível da anatomia masculina numa aula de Educação Física. A sorte esteve do lado dele nos efeitos colaterais: “Podia ter ficado com uma voz igual à da Júlia Pinheiro”.João Calhaz/António Palmeiro

Esta entrevista foge ao registo habitual em O MIRANTE por vontade expressa do entrevistado, que exigiu aos jornalistas que o tratassem por tu. Diogo Beja é o que se pode chamar um gajo porreiro e bem disposto que faz da voz e dos neurónios as suas ferramentas para vingar na difícil arte da comunicação. A entrevista decorreu nas instalações da RTP e RDP em Lisboa, onde é quase tão difícil entrar como num quartel. Depois de uma manhã aos microfones, onde teve como convidado o humorista dos Gato Fedorento Zé Diogo Quintela, Diogo Beja lá nos aturou durante uma hora de conversa informal e bem disposta. Ter um programa com o nome do autor não é para todos... É uma forma mais fácil de chegar à fama?Não. Há quem possa considerar que é presunção, mas é uma presunção irónica. Já fazia o programa com este nome na Rádio Comercial. Aliás, se calhar começou tudo com a Manuela Moura Guedes no Jornal Nacional onde dizia: eu sou a Manuela Moura Guedes. Eu detesto dizer: olá, eu sou o Diogo Beja. Não diria isso em rádio. A forma que usei para encapotar foi dar o meu nome ao programa. Isso já tem mais piada, até porque sou um grande fã dos talk shows americanos como o do Conan O’Brien. Juntei o útil ao agradável. Não tenho de dizer o meu nome e criei um pequeno formato a brincar com o meu nome.Não é uma demonstração de egocentrismo?Não. É uma brincadeira. E não é sinal que esteja a ter muito sucesso. Qualquer pessoa pode dar o seu próprio nome ao programa. Aliás, quando cheguei aqui muitos ouvintes que não conheciam o programa questionaram precisamente quem é este gajo que pôs o nome dele no programa.Mas tens a noção de que isso te dá uma projecção que não daria se o programa não tivesse o teu nome?Isso sim. Tem a ver com a tal ironia que procurei quando criei esse nome para o programa. Mas tem o lado negativo, das pessoas que não percebem a brincadeira e acham que é presunção pura e simples.E tem a vantagem de poderes passar a música que queres.Não, isso não funciona assim. Mas ainda bem que passa essa imagem. É bom sinal. Estás refém das playlists?Estamos todos. Mas tenho direito a passar algumas músicas por minha iniciativa. Há muita gente a querer saber quem está por detrás do microfone? A querer conhecer o rosto daquela voz?Hoje em dia essa magia já está um bocado esbatida. Passaste algumas situações engraçadas à conta disso?Ainda hoje passo. Nem sempre há essa ligação visual. Aliás, isso aconteceu comigo, quando conheci alguns dos meus ídolos. Quando os ouvia falar perguntava se aquela voz saía mesmo da boca deles. Aconteceu com o Paulino Coelho, que vocês também entrevistaram. Ele fala como fala na rádio. Não coloca a voz.Também foste fã do António Sala e da Olga Cardoso.Sim, quando era miúdo. Quando o meu pai me levava para a escola, entre a Portela das Padeiras e a Alexandre Herculano, levava ali 5 minutos com a Renascença, onde ainda estava o António Sala, ou com as entrevistas do Adelino Gomes na Antena 1. Já te aconteceu seres assediado por fãs?Só assédio normal.Gostavas que tivesse sido mais acentuado?(risos) Agora que estou casado, não tanto... Notaste as diferenças após a exposição na TV?Houve uma coisa que me deixou um pouco triste: a notoriedade que me deram na carreira radiofónica após ter aparecido na televisão. Já fazia rádio há muitos anos quando fui fazer televisão.Foi isso que te levou a dizer que agora, na TV, só fazes coisas que te divirtam?Foi por causa de situações que me levaram a descobrir que o mundo da televisão não é propriamente fácil. Mesmo quando estamos a fazer coisas pequenas. Às vezes estamos a expor-nos demasiado e não vale a pena. A minha vida é a rádio. Vou fazer o Rock in Rio para a SIC como pivôt de emissão e ainda não disse nada aqui... Nesse formato acho que vale a pena. Não seria mais fácil fazeres para a RTP. Que é mesmo aqui ao lado?Atenção que eu sou funcionário da RTP mas tenho autorização para ser voz da SIC Radical, que já sou há muito tempo. Teria muito gosto em fazer para a RTP, se surgisse oportunidade similar.Com esses empregos todos, deves ganhar muito dinheiro?(risos) Não. Tenho muitos empregos porque sou um gajo mal pago. Agora, só para não ser despedido: não me posso queixar daquilo que recebo, mas neste meio as pessoas tentam fazer o máximo de coisas possível porque é a forma de comporem os rendimentos. Consegues ter tempo para essas coisas todas?Agora menos, porque desde que casei, e depois quando fui pai, a família passou a ser uma prioridade. Comecei a ter menos tempo para dizer que sim a tudo. Houve uma fase da minha vida em que acordava para trabalhar às cinco e meia da manhã e deitava-me muitas vezes à uma e meia. Nessa fase ganhava muito dinheiro mas também andava a dar em maluco.A ideia que se tem do Diogo Beja, para quem te ouve, é que és um “grande maluco”. Corresponde à realidade?Essa é a magia da rádio. Eu não sou um grande maluco de saltar de bunging jumping, talvez um dia, ou de saltar de pára-quedas. No sentido radical não sou um grande maluco. No sentido de sair à noite e de andar sempre por aí também não. Mas um grande maluco, no sentido de ser uma pessoa bem disposta, sim. Acordo quase sempre bem disposto.Não vens para aqui fazer frete às 7 da manhã?Não, senão não fazia isto. Tenho sorte, não me posso queixar. Esse sentido do grande maluco tem a ver com o facto de ser um bocado desbocado, tem a ver com a forma como vejo o mundo.E não ficas por vezes com a sensação que te excedeste?Às vezes. Não sinto remorsos mas já fiquei a pensar que vou ser processado. Até agora não aconteceu. Acho que é uma falha. Não estou ainda a ser suficientemente corrosivo. O “lóbi” ribatejano nas manhãs das rádios nacionaisActualmente concorres no horário entre as 7 e as 10 da manhã com mais dois radialistas escalabitanos: José Coimbra na RFM e Paulino Coelho na Rádio Renascença. E concorro também com o meu padrinho de casamento, que é o Pedro Ribeiro da Comercial.É uma situação curiosa. Parece que há um lóbi escalabitano na rádio.Isto só significa aquilo que sempre disse: que há um microclima em Santarém de grande talento de rádio. Não podemos esquecer que temos também o Nelson Santos, o César Santos e o Paulo Cintrão na TSF, por exemplo. Não sei se é um lóbi, mas é bom que três pessoas de Santarém estejam a fazer os programas da manhã em rádios nacionais. Eles estão numa situação de maior protagonismo, porque estão nas duas rádios mais ouvidas do país. Eu estou numa coisinha mais pequena. São campeonatos totalmente diferentes.Tens contactos regulares com esses colegas de ofício?Hoje em dia mais pelo Facebook. Com o Paulino, durante muito tempo, falámos muito ao telefone, porque ele tentou ajudar-me quando eu ainda estava em Santarém. Cheguei a gravar algumas coisas para um programa que ele tinha à tarde, que era “A Grande Aventura”. A fase de orgulho do meu pai foi quando começou a ouvir o filho na Renascença. Essa voz é treinada ou é natural?Falo num registo diferente quando estou a apresentar música, por exemplo, mas não coloco a voz. Há uma situação curiosa com a minha voz. Já fazia rádio há dois anos quando tive um pequeno acidente no liceu que implicou uma operação numa zona bastante sensível. E a minha voz passado um mês mudou. Que acidente foi esse?Levei uma bolada numa aula de Educação Física nas partes genitais e tive de ser operado nessa noite por causa de um hematoma. Mas não foi nada de especial.Quer dizer que essa bolada teve uma influência decisiva.Ainda hoje agradeço a esse meu amigo, que já não vive em Portugal. Vive nos Estados Unidos mas ainda hoje lhe agradeço pelo Facebook por essa bolada, que foi a génese disto tudo (risos). Podias ter ficado com a voz noutro timbre.Pois, podia ter sido bem pior. Podia parecer a Cristina Ferreira ou a Júlia Pinheiro a falar. Isso era uma chatice (risos).De Diogo Marona a Diogo BejaDiogo Beja, 30 anos, começou aos 15 anos na rádio em Santarém, aos microfones da Rádio Piranha, já extinta, e passou pela 2000 FM e pela Ribatejo que também já não emitem na cidade, antes de se mudar para a Rádio Cartaxo, a única sobrevivente do naipe. Na altura o nome de guerra era Diogo Marona, o apelido paterno. Foi um amigo de liceu que o desafiou a tentarem a sorte juntos num mundo até aí desconhecido. De início só passava música e dizia as horas que correspondiam ao sinal horário. Quinze anos depois é um dos nomes de referência da Antena 3, para onde se transferiu recentemente vindo da Rádio Comercial, e tem conversa para preencher três horas diárias. “The Diogo Beja Show” é a marca irónica do programa que lhe dá projecção no éter, mas as suas primeiras influências pouco têm a ver com o universo dos talkshows americanos que lhe chegam pela TV e que o inspiram. Ainda deve ter em casa dos pais, na Portela das Padeiras, arredores de Santarém, cassetes de áudio onde registou as suas imitações do emblemático programa Despertar, da Rádio Renascença. “Imitava o António Sala e a Olga Cardoso. Fazia as duas vozes”, diz entre risos este fã dos Xutos & Pontapés e adepto do Sporting.Teve uma infância normal, pacata até. “Sempre fui muito caseiro, passava muito tempo ao computador, lia, ouvia música, via muita TV”. Que ainda hoje vê. Para além da paixão da rádio também quis ser detective, inspirado pela série Duarte e Companhia, e aprendeu a tocar guitarra para tentar ser músico. Uma aposta falhada, tal como a de ser futebolista. Tinha uma “inabilidade inata” para o futebol e o único troféu que ganhou foi uma rotura de ligamentos “ao mais alto nível”. “Mas não se pode ter jeito para tudo. O meu pai sempre me disse isso”. Outra das suas paixões é a que nutre pelos computadores. Chegou a estudar Engenharia Informática no Instituto Superior Técnico, a pensar num emprego estável caso a rádio desse para o torto. Deixou o curso a meio e apostou tudo na rádio, embora também trabalhe em televisão e noutras plataformas multimédia. Entretanto casou, é pai de uma filha com quase dois anos e assume-se como um homem de família.O músico falhado que foi o Baixinho do Cabaré da CoxaFoste músico, tiveste um grupo, mas optaste por passar música dos outros.Tive aulas de solfejo e guitarra em Santarém, na Calçada do Monte, com um maestro. Um homem muito espirituoso e com uma visão do mundo também muito peculiar. Mas na altura eu era muito novo para perceber isso. Tinha 15 ou 16 anos. Foi quando comecei também a fazer rádio com um colega na Rádio Piranha. Criámos depois uma banda, quando viemos para Lisboa, com outro colega de Santarém. Nunca chegámos a ter nome. Era eu, o Hugo e o Rui. Não tocávamos nada. Tocávamos para aí duas músicas do princípio ao fim. Eu cantava.Chegaste à conclusão que era muito arriscado ir para cima de um palco sujeito a seres alvejado com ovos e tomates?Sim. Nem ninguém nos queria em cima de um palco. Não havia razões para isso. Ficávamos todos contentes se os acordes, o baixo e a bateria acertavam durante cinco ou seis compassos. Era só aquilo. Os teus pais não pensaram deserdar-te quando lhes comunicaste que querias fazer da rádio a tua vida?Não. Os meus pais só me diziam: podes fazer o que tu quiseres mas tira o curso. O meu pai sempre foi mais reticente a esta coisa da rádio. Depois, quando comecei a fazer umas coisas ele era dos mais orgulhosos.Os teus pais são teus ouvintes?Hoje, se calhar, é mais difícil. Devem ouvir alguma coisa, mas na Comercial seria mais fácil.E não te puxavam as orelhas quando te esticavas no discurso?Não. Nem quando fiz o Curto Circuito isso chegou a acontecer. Talvez isso tenha acontecido quando fiz o Cabaré da Coxa com o Rui Unas. Talvez seja a primeira vez que revelo isto numa entrevista: eu era o baixinho do Cabaré da Coxa. Era a voz do papagaio que dizia aquelas asneiradas todas. Fiz isso no primeiro ano do Cabaré da Coxa. Tinhas um papel baixinho mas que deixava marcas.E de que maneira! Havia programas em que o Baixinho tinha um papel fundamental. Era tudo de improviso. As bocas saíam no momento.És um rapaz dado ao vernáculo?Nem sou muito asneirento. Mas mal entrei na rádio passei a ser mais. Na Rádio Ribatejo, em Santarém, aquilo era complicado. Ouvimos dizer que tens a árvore de Natal permanentemente montada em casa. Isso já acabou. Comecei a namorar e a minha mulher teve um papel fundamental na reestruturação da minha casa. Ela entrou lá a primeira vez e não sei como é que continuámos a namorar depois disso. Havia um carreirinho de CD que ia dar à sala. E na sala lá estava a árvore de Natal com bolinhas vermelhas, que condiziam com o tapete vermelho. Ela lá disse que aquilo tinha que levar uma limpeza e teve uma paciência de santa. Andou comigo a tirar coisas, muito lixo foi embora. Ficou uma casa decente. És um entusiasta do wrestling e foste comentador desse espectáculo na TV. Andas na musculação por causa disso? Gostavas de ter umas batatas nos braços como o Batista, por exemplo?Olhava para ele e pensava que ser assim era capaz de ser interessante. Houve uma fase mais deprimida, em que talvez precisasse de mais amor próprio, que comecei a cultivar o físico.Já te deixaste disso?Não deixei. Tenho é menos tempo. É uma coisa que me chateia. Este programa exige muita produção, muito tempo sentados aqui a ter ideias. “Não sei como Moita Flores tem tempo para tantas coisas”Santarém continua a fazer parte da tua vida ou Lisboa tornou-se a cidade da tua vida?Lisboa sempre foi um bocadinho a cidade da minha vida. Nasci cá, sempre tive uma paixão grande por Lisboa mas gosto muito de Santarém. O que mais gosto é de me deslocar a pé, porque é tudo longe mas é tudo perto. Essa é uma das grandes vantagens de Santarém, que é uma cidade linda. Vais lá habitualmente?Agora vou menos, mas de vez em quando vou lá ver a família. E quando lá vou encontro sempre alguma coisa nova. Há um sentido de trânsito invertido, uma rotunda nova…Nem que seja uma coisa para chatear.Às vezes é (risos)…E quando é que vemos o Diogo Beja a dar show em Santarém?O Diogo Beja nunca chegou a ter um show. Por acaso agora, com este programa, se as coisas resultarem, no futuro talvez se possa preparar um espectáculo e correr algumas cidades. E gostava de ir a Santarém. Já pensaste em convidar o presidente da Câmara de Santarém para ir ao teu programa? Ainda não pensei nisso. Se estivesse a fazer rádio em Santarém sim. Aliás, quando escrevia no jornal da escola em Santarém, não sei se era director se era vogal, cheguei a entrevistar o presidente da altura, o José Miguel Noras. Agora o Moita Flores, se ele lançasse um livro ou uma série que fizesse sentido vir cá…Ele vai lançar um livro em breve.Não sei como é que ele tem tempo para essas coisas todas. Honestamente. A sério. Não consigo perceber.A cidade ganha em ter uma figura mediática à frente da câmara municipal?Acho que sim. E ele está na televisão quase todos os dias. Não fala é de Santarém. Mas gosto do Moita Flores.Moita Flores já disse que não se recandidata à câmara. É a hora de Diogo Beja assumir as suas responsabilidades e avançar?Não. Claramente, o Diogo Beja não se mete em políticas. Por acaso, há tempos vi a Inês de Medeiros a chegar à Assembleia da República e pensei que se ela está lá eu também podia fazer aquilo. Aquele primeiro dia deve ser engraçado, mas depois o resto do mandato deve ser uma grande seca.
Um radialista desbocado que assume a falha de ainda não ter sido processado

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