Lobo Antunes regressa a Tomar sem sinais de polémica
O escritor ficou “comovido” por revisitar a cidade onde viveu há 40 anos
António Lobo Antunes não falou da sua ausência numa tertúlia organizada pela Entidade Regional de Turismo nem da celeuma que se registou na altura e que teve repercussões políticas, como a retirada de pelouros ao vereador Luís Ferreira.
Tranquilo e envolvido no carisma que o caracteriza, o escritor António Lobo Antunes deslocou-se na tarde de sábado, 13 de Novembro, a Tomar para apresentar o seu último livro “Sôbolos Rios Que Vão”, a convite da Livraria “Ao Pé das Letras”. Fumando um cigarro, o escritor chegou acompanhado pelo editor e por António Arnaut (antigo ministro dos Assuntos Sociais, responsável pelo lançamento do Sistema Nacional de Saúde) e foi recebido pelo presidente da Câmara de Tomar, Corvêlo de Sousa (PSD), que o esperava à entrada da Biblioteca António do Cartaxo Fonseca onde decorreu a sessão, presenciada por uma centena de pessoas. Para além da vereadora da Educação e Turismo, Rosário Simões (PSD), mais nenhum elemento do actual executivo municipal esteve presente na sessão. A vinda de Lobo Antunes à cidade templária era aguardada com grande expectativa dois meses depois da polémica gerada pela sua recusa em participar numa iniciativa promovida pela Entidade Regional de Turismo e Vale do Tejo (E-TLVT). Na altura, o escritor alegou que tinha existido um “aproveitamento indevido” da sua imagem por parte do vice-presidente dessa instituição, Manuel Faria. Seguiu-se uma polémica ainda maior, quando o então vereador da Cultura da Câmara de Tomar, o socialista Luís Ferreira, teceu considerações menos abonatórias sobre o escritor na rede social facebook, o que levou inclusivamente a Assembleia Municipal de Tomar a aprovar no final de Setembro uma moção de censura relativa ao seu comportamento e a recomendar que lhe fossem retirados os pelouros que detinha. Uma polémica que o escritor considera encerrada, preferindo falar do desafio que os seus livros constituem para os leitores e do tempo em que esteve no Hospital Militar de Tomar, em 1970, antes de partir para Angola, para prestar serviço militar. Sem nunca fazer referência ao incidente recente, o escritor de 68 anos afirmou ter ficado “comovido” com o regresso a Tomar, quarenta anos depois. No sábado de manhã deu uma volta pelo centro histórico da cidade e confessa que se não fosse a ameaça de chuva tinha pensado em dar uma volta de barco no rio Nabão. “A cidade cresceu e mudou. A sensação é muito estranha porque nunca cá estive no Outono e hoje parece-me algo triste e cinzenta”, disse.“Comovi-me, mas para dentro. Como as grutas. Para dentro”, disse António Lobo Antunes que, num tom nostálgico recordou “os meses de Primavera e Verão passados em Tomar, destacando “o sol, as flores, os cheiros, os passeios de barco no rio Nabão e as mulheres bonitas”. O escritor recordou ainda o dia em que foi informado que tinha sido convocado para prestar serviço na Guerra Colonial. “A minha felicidade acabou nesse dia e Tomar foi-se afastando de mim. Aqui fui feliz sem manchas. Foi estranho ter voltado. Foi doce e amargo ao mesmo tempo”, considerou. “Sôbolos Rios que vão”, o seu último romance, foi apresentado pela investigadora de literatura Ana Paula Arnaut como um livro onde a escrita é reduzida ao seu osso. O livro, um dos mais autobiográficos do autor sendo o narrador, designado como “Antoninho” e “Senhor Antunes”, um homem que, após uma operação a um tumor no intestino recupera, num estado entre o torpor e a dor, fragmentos da sua vida, numa reflexão sobre a vida e a morte. Lobo Antunes, que revelou ter começado a trabalhar num novo livro há 9 meses, disse ainda que continua a escrever os seus livros à mão, não sabe abrir um computador, não tem telemóvel ou cartão de crédito e que “precisaria de mais 200 anos” para poder escrever tudo o que tem dentro de si.
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