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A história do homem que fintou a morte e a sua aventura em busca da felicidade

A história do homem que fintou a morte e a sua aventura em busca da felicidade

Vítor Costa continua a recuperar de um acidente que quase o deixou paralisado

Aos 16 anos fintou a morte num acidente de moto. Voltou a falar e a andar contrariando todos os diagnósticos dos médicos. A deficiência não foi um condicionalismo para Vítor Costa. Aos 20 anos criou o seu próprio negócio e comprou uma casa. Aos 42 diz que já realizou quase todos os sonhos.

O cidadão anónimo que compra o jornal no quiosque em frente à estação de comboios de Azambuja, do outro lado da Estrada Nacional 3, estará longe de saber por que razão se demoram os gestos de Vítor Costa. O homem de 42 anos, encasacado nas manhãs gélidas, abre devagar a mão para dar o troco e treme levemente a cabeça. A pronúncia mantém-se ligeiramente distorcida, mas para movimentar-se já pouco ou nada utiliza a bengala.Um acidente de moto, na madrugada dos seus 16 anos, na estrada do Malcurado, entre o Vale do Paraíso e Azambuja, deixou-o em coma. Vinha de um bar com o amigo a quem ofereceu o capacete minutos antes. O companheiro saiu ileso. Vítor Costa foi projectado a 50 metros para uma lixeira de onde saiu já inconsciente e com fractura no crânio. O diagnóstico que os médicos passaram aos pais não foi animador. “Se chegar a acordar do coma ficará para sempre numa cama”, sentenciaram. Dezanove dias depois do acidente Vítor Costa acordou no Hospital de Santa Maria, em Lisboa. Durante três meses não conseguiu falar e esteve totalmente dependente de terceiros. Seguiu-se uma temporada em casa à espera do tratamento. “Lembro-me de estar deitado, rodeado de amigos, com o meu avô a descascar um pêro”, conta referindo-se às primeiras memórias depois do acidente. O Centro de Reabilitação de Alcoitão, onde entrou de maca, foi meio caminho andado para a sua recuperação. Os pais sempre acreditaram na recuperação e talvez por isso as primeiras duas palavras que Vítor Costa proferiu foram para dedicar a eles: “Disse «pai, mãe» e pela primeira vez vi os meus pais a chorar”, recorda o irmão do meio da família. Em meses passou da cadeira de rodas para o andarilho com terapia da fala pelo meio. O tratamento foi concluído já em Azambuja. Voltou a estudar, mas deixou a meio o décimo ano. Com a ajuda da bengala, que hoje usa raramente, foi até ao Instituto de Emprego e Formação Profissional de Vila Franca de Xira. “Soube que estavam a facilitar empréstimos sem juros a pessoas com deficiência que quisessem montar o seu próprio negócio”, conta entusiasmado. Pagou em 10 anos os 2250 contos [11.250 euros] que lhe custou o quiosque “Pirilampo”, o seu ganha-pão há 22 anos. Deu sozinho todas as voltas necessárias para pedir a licença e comprar os livros de facturas. “Sou filho de ferroviário e não pagava comboio”, diz com humor. Não se queixou da burocracia e sempre andou para a frente. O quiosque foi o melhor investimento da sua vida. A seguir foi o apartamento de Azambuja. Já concretizou quase todos os sonhos, assegura. “Sempre sonhei ter uma casa em frente ao mar. Tenho uma casa frente à lezíria e o céu a perder de vista lembra o oceano”, diz meio a sério meio a brincar. Anda a pé ou de comboio, mas ainda não colocou de lado o objectivo de tirar a carta e comprar um carro adaptado, mas cada projecto a seu tempo. A pressa é inimiga de Vítor Costa.Sabe cozinhar grelhados, mas é a mãe, que de vez em quando o ajuda na banca, que lhe leva o almoço numa marmita. Vítor Costa agradece porque o tempo é pouco. Trabalha todos os dias e pouco depois das 6h00 já vai a caminho do local de trabalho. Só deixa as quatro paredes do seu “escritório” quando já passa das 19h00. Já teve algumas aventuras (diz com um sorriso rasgado), mas vive sozinho. “Quem sabe se um dia não aparece uma princesa encantada”. Vítor Costa diz o que ficou por dizer nesta entrevista, algumas horas depois, numa mensagem enviada por telemóvel, em jeito de quem aconselha um amigo: “Ser teimoso naquilo que se quer com base na razão; construir objectivos questionando junto das entidades competentes sobre qual é o melhor caminho. Se não conseguir à primeira tentar à segunda. Tentar outros caminhos e outras conquistas. Acreditar sempre. Muito”.
A história do homem que fintou a morte e a sua aventura em busca da felicidade

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