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O jovem poeta de Almeirim que quer aprender a plantar uma couve

O jovem poeta de Almeirim que quer aprender a plantar uma couve

Miguel-Manso, 31 anos, já editou três livros de poesia e vai fazendo uns “biscates” para ganhar a vida

É a jogar com as palavras que Miguel-Manso se sente confortável. Mas viver da poesia não é fácil nem para os consagrados, quanto mais para um jovem que procura um lugar ao sol. Por isso vai arranjando trabalhos que lhe permitam pagar as contas e lhe proporcionem algum tempo para a escrita.

“É noite. Está mar”. A epígrafe que abre o primeiro livro de poesia de Miguel-Manso intitulado “Contra a Manhã Burra” foi retirada do diário “Nos mares do fim do mundo” que o escritor escalabitano Bernardo Santareno escreveu a bordo de um navio de frota bacalhoeira. Miguel-Manso nasceu em Santarém há 31 anos, mas viveu em Almeirim até aos 20 anos. “Contra a Manhã Burra”, “Quando escreve descalça-se”, (ambos de 2008) e “Santo Súbito” (2010) são os títulos dos três livros que já publicou. Todos em edição de autor.Miguel-Manso nunca pensou ser poeta, mas sempre gostou de escrever. Começou a escrever vários géneros literários, mas foi em poesia que saíram os dois primeiros livros e é nesse género que o jovem quer continuar. “Decidi que quero escrever vários livros de poesia e é isso que estou a fazer”, explica a O MIRANTE.O primeiro contacto de Miguel-Manso com a escrita começou na adolescência quando fazia “cadáveres esquisitos” com amigos (jogo em que um elemento escreve uma frase e só mostra a última palavra; a outra pessoa escreve uma frase a partir dessa palavra e assim sucessivamente). Essa descoberta do texto final é que lhe despertava curiosidade.Aos 20 anos foi para Lisboa estudar, mas na verdade queria sair de Almeirim. Queria descobrir Lisboa onde continua a viver. Ainda estudou um semestre em Design de Comunicação, frequentou o Ar.Co durante três anos, mas não se interessou mais, embora ainda desenhe. Fez um curso de técnico de Biblioteca e Documentação tendo trabalhado um ano na Associação Cultural ZDB no Bairro Alto, na capital.Quando lhe perguntamos o que faz actualmente diz que escreve e faz uns “biscates” para ganhar a vida. Nos últimos meses trabalhou no serviço de cargas e descargas numa loja de roupa, duas vezes por semana. “Procuro trabalhos que não me roubem muito tempo para poder escrever. Estou a ‘esticar a corda’ para não ter que ir trabalhar para um call-center, porque isso rouba-me muito tempo e quero ter tempo para escrever”, confessa durante a entrevista que decorreu numa das raras vezes que regressa a Almeirim. Ruy Belo, Herberto Hélder, Mário Cesariny e José Miguel Fernando Jorge são alguns dos seus poetas portugueses de eleição. Os brasileiros Carlos Drummond de Andrade e Adélia Prado também estão entre os seus preferidos. Miguel-Manso diz poesia em Almeirim há muitos anos. Em bares e escolas.Não foi fácil convencer os pais da decisão que tomou. “É normal que todos os pais queiram que os filhos tenham uma vida estável e sabemos que a escrita, sobretudo poesia, não é nada estável”, explica acrescentando que ficaram satisfeitos quando viram o primeiro livro publicado. Além da escrita Miguel-Manso é também apaixonado por cinema. O jovem poeta pretende conhecer melhor “Os Avieiros”, obra de Alves Redol que retrata a vida dos pescadores no rio Tejo. Um dos seus objectivos é realizar um filme na aldeia da Palhota (concelho do Cartaxo), junto do Tejo.Miguel-Manso diz que vai buscar a inspiração ao dia-a-dia. “O próprio acto de me sentar para escrever serve-me de inspiração. Tudo é matéria para escrever. Há algumas coisas que ainda passam por mim e ainda não aproveito para escrever. Ainda não tenho essa sensibilidade totalmente desenvolvida”, confessa. Em Abril vai estar durante um mês numa residência em Évora para jovens poetas. “Vamos estar lá com o único intuito de escrever”, explica. Índia, Nova York, Banguecoque e Marrocos são alguns dos destinos que pretende conhecer para poder desenvolver a sua escrita. Mas Miguel garante que tanto escreve no estrangeiro como em aldeias portuguesas. “Quero conhecer Mértola”, diz. O jovem poeta garante que está a entrar numa fase de maior “acalmia” e pretende procurar um local, perto de Lisboa, mas mais rural. “Quero aprender a cultivar uma couve”, diz, com um sorriso tímido no final da entrevista.Alguns poemasPalcoo poema é antes de tudoum palco para gestos simpleseu rego as flores de Junho Continuação de Jean Nicotsou dentro de mim o que quer fugirembora vá recusando a cada bafoo panorama dos astronautastiro notasdos calendários gigantesdas marés do sol e da luado rasto agrícola das nossas mãossobre a mesade madrugadaremo como exilado incaem direcção à luzse ainda me for fácil mentir direié afinal a única substância do poemaeste cigarro entre estrofes
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