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Na Via-Sacra de Ourém falámos com os soldados que chicotearam Jesus Cristo

Na Via-Sacra de Ourém falámos com os soldados que chicotearam Jesus Cristo

Agostinho Mendes já tentou que lhe dessem outro papel enquanto Manuel Lopes sabe que Deus lhe perdoa
Compete-lhes fazerem o papel de maus da fita na reconstituição do martírio de Cristo, durante a Via-Sacra, na sexta-feira Santa. Vestidos como os soldados romanos, batem em Jesus, gritam-lhe e escarnecem dele. Em Ourém, na freguesia de Nossa Senhora das Misericórdias (junto ao Castelo), onde a recriação da cena bíblica se repete há 13 anos, O MIRANTE conversou com dois dos carrascos de Jesus. Ambos se dizem católicos praticantes. Um deles não se vê a fazer outro papel. O outro até já pediu para encarnar outra personagem porque não lhe agrada ser verdugo de alguém que venera, nem sequer a fingir. Na sexta-feira, à chuva e ao frio fomos encontrar Manuel Lopes, natural de Vilar dos Prazeres, freguesia de Nossa Senhora das Misericórdias, de chicote na mão, junto a um Cristo ensanguentado que arrasta penosamente a cruz. Tem barba branca e uma expressão carregada. “És Rei?! Aqui tens a tua coroa”, compete-lhe dizer a dada altura. Quando Cristo cai pela terceira vez é ainda ele que grita com crueldade “Nós levantamos-te à chicotada”.Houve um ano em que se enganou e em vez de bater na cruz, de modo a dar o efeito da chicotada, bateu mesmo nas costas de António Gonçalves, que encarna, também há 13 anos, o papel de Jesus. O episódio é recordado entre risos antes do início da encenação. O duro soldado não esquece que é tudo a fingir. E que Deus lhe perdoará o papel que faz e do qual não abdica. “É o papel que eu gosto de fazer e enquanto o nosso Cristo António Gonçalves não desistir, eu também não desisto”, afirma Manuel Lopes. Pelo caminho vai ouvindo alguns comentários: “Coitado do Cristo”, “Pobre do Homem”. O que mais lhe custou ouvir veio do falecido pai de António Gonçalves, no segundo ano de encenação, que lhe pediu que tivesse cuidado quando batesse no seu filho. Diferente é a disposição de Agostinho Mendes, também católico como o seu colega legionário e também de Vilar dos Prazeres. Grita a plenos pulmões para Cristo se levantar quando este cai e escarnece da fraqueza dele. Faz um papel tão perfeito que não há quem não o elogie mas confessa que já pediu para mudar de personagem. “A minha personagem é mesmo ruim. Não é nada fácil fazer aquilo. Ainda quis fazer de um dos elementos do povo mas não me deixaram. Disseram que o culpado era eu porque fazia aquilo na perfeição”. “Experiência pública da fé e da vivência Cristã”Quem observa a Via Sacra de Ourém facilmente reconhece momentos que recordam obras primas da arte sacra, como a crucificação ou Maria, a Piedade, aconchegado o filho morto. Pelo primeiro ano acompanhando a encenação, o Padre Pedro Ferreira participou no final do espectáculo, encabeçando a procissão que leva o Senhor Morto até à Igreja, onde de seguida decorrem as cerimónias da sexta-feira santa. “Uma experiência pública da fé e da vivência cristã onde se nota que não só toca o povo, que é quem organiza, mas onde também pessoas de outras comunidades vizinhas”, comenta. Surpreendido pela positiva com a grandiosidade da encenação, o Padre Pedro Ferreira diz que a Igreja Católica encara bem este tipo de recriações. “É uma vivência fora da Igreja. Quem quer viver mais o momento a nível espiritual vai depois à Igreja. O guião é bíblico. E a mensagem passa”. O sacerdote reconhece que muitos dos que participam podem não ser católicos mas concerteza que todos têm princípios e sentem o que estão a representar. E lembra que por vezes há conversões após se terem vivido experiências como a encenação da Via Sacra em Ourém.
Na Via-Sacra de Ourém falámos com os soldados que chicotearam Jesus Cristo

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