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João “Careca” lança morteiros para avisar que os toiros vão sair à rua

João “Careca” lança morteiros para avisar que os toiros vão sair à rua

Durante a alvorada, às oito da manhã, é lançada centena e meia de foguetes

João Pereira da Silva - João “Careca” para os amigos – lança foguetes à alvorada e morteiros e super-morteiros a que chama “canhões” para avisar que os toiros vão sair à rua na Feira de Maio de Azambuja.

Um morteiro estala para avisar que o toiro vai sair à rua. É assim todos os anos nas largadas que animam a tradicional Feira de Maio de Azambuja. O mestre da arte pirotécnica chama-se João Pereira da Silva mas ninguém o conhece por este nome. Para além da alcunha que herdou de família, João Pau Preto (já ao pai e ao avô paterno chamavam assim por serem morenos), é conhecido entre os amigos por João “Careca”. “Perdi o cabelo todo aos 13 anos, inexplicavelmente. Os meus pais ainda tentaram um tratamento em Espanha mas sem sucesso. Na adolescência sofri um pouco com aquilo mas rapidamente ultrapassei esse trauma”, diz.É João “Careca”, 59 anos, que garante as alvoradas nos dias da feira. A partir das 8h00 só quem tem sono pesado dorme em Azambuja. As queixas surgem em tom de brincadeira. “Dizem-me: «Oh João, acordaste-nos cedo!»”. Em cada manhã são lançados 130 a 150 foguetes. João Pereira da Silva tem um ajudante que lhe passa cada um dos foguetes que vai lançando. Para incendiá-los utiliza uma mecha feita de um saco de serapilheira enrolado que se mantém acesa. Três a quatro segundos é quanto demora cada foguete a disparar no céu. “Incendeia-se o cartucho que quando sentimos que tem força suficiente para subir largamos”, descreve. Há dois anos um foguete não quis subir. O calor já estava a chegar aos dedos quando João Pereira da Silva o fez rebentar no chão de forma segura. Uma outra vez lançou um foguete que não subiu e seguiu pela rua dos campinos. Só parou quando bateu numa parede. “Ninguém ficou ferido”, conta. O “canhão”, mais estridente que o foguete, ouve-se para a entrada de toiros, que passam a grande velocidade do Pátio do Barros para os curros. O primeiro morteiro solta-se para avisar que dentro de segundos vão sair dois animais. Um para o Largo dos Bombeiros e outro para o Rossio. Para anunciar a entrada do terceiro toiro, para a zona da Pastelaria Favorita, solta-se mais um. E segue-se outro morteiro para o toiro para o largo da câmara. João Pereira da Silva, por esta altura a acompanhar a distribuição dos toiros no largo do município, recebe a informação por telemóvel para saber quando poderá anunciar o toiro que ficará na zona dos curros (junto à Caixa Geral de Depósitos). Quando não existiam telefones portáteis era preciso correr, muito, para dar a indicação na hora certa. Na altura eram largados apenas três toiros. Hoje são cinco.Ao domingo, dia de maior movimento e mais barulho, usa um canhão em vez de um morteiro nas largadas para que o aviso seja sentido em todo o recinto. Quando os toiros são recolhidos uma dúzia de canhões avisam que a passagem está livre. João Pereira da Silva tomou as rédeas das artes da pirotecnica na Feira de Maio em 1976 quando o anterior encarregado da tarefa desistiu. Tem uma licença (nº 3868) que comprova que está tecnicamente habilitado para o lançamento e queima de outros fogos de artifício. Combateu no Ultramar (Angola – 1972 - 1974) mas fugiu sempre das armas mesmo em cenário de guerra. É divorciado e tem dois filhos. A neta, de oito meses, vai assistir à primeira feira. Desde que os filhos nasceram João Pereira da Silva, natural de Azambuja, apaixonado pela terra e pelas suas gentes, deixou de “brincar” com os toiros nas largadas. O peso da responsabilidade impediu-o de correr riscos. “Ganhei juízo”, diz entre gargalhadas o motorista de transportes colectivos da Câmara Municipal de Azambuja. Reformou-se em Abril. Como funcionário da autarquia por alturas de Abril e Maio ia ajudar a fazer e montar as tranqueiras com o auxílio do carpinteiro. Antes de ser funcionário público trabalhou nas obras, foi padeiro e bombeiro voluntário. Faz parte dos corpos sociais da Poisada do Campino e é quem abre a porta dos curros na praça de toiros que está em obras. Para João Pereira da Silva a Feira de Maio não se faz só de foguetes, morteiros e canhões. Há sardinha assada, pão e vinho na tertúlia familiar. Ao domingo há ensopada de enguias por tradição. Às vezes, no final da feira, participa no lançamento do fogo de artifício que encerra a festa. “Já lá vai o tempo em que era preciso acender cada um dos rastilhos. Hoje é tudo automático. Às vezes carrego no botão mas não tem a mesma graça”, sentencia.
João “Careca” lança morteiros para avisar que os toiros vão sair à rua

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