A sala da livraria “Mensagem Aberta”, na rua Direita, em Vila Franca de Xira, encheu na noite de quinta-feira, 26 de Abril, para ouvir o estratega de Abril, Otelo Saraiva de Carvalho, apresentar o novo livro “O Dia Inicial”, editado pela Objectiva. Uma das participantes estranha a presença de uma jornalista. “Também se interessa pelo 25 de Abril? É a única jovem aqui presente”, repara. Mas rapidamente chegam duas raparigas ainda mais jovens que se sentam nas primeiras cadeiras para ouvir o convidado. Cada uma traz um exemplar de “O Dia Inicial” que vão deixar para Otelo Saraiva de Carvalho autografar. Não conseguem ficar até ao fim. O relógio já marca quase a meia noite mas as perguntas do público não terminam. É a livreira Francisca Guerreiro que tem de encerrar o debate para Otelo poder autografar os livros. E não são poucos. “O editor pediu-me um livro mais curto porque os jovens hoje não estão para ler um calhamaço como o primeiro livro que escrevi - ‘Alvorada de Abril’. O tempo permitiu-me ir reflectindo sobre o 25 de Abril, mudando o meu olhar sobre algumas coisas e também acrescentei novo material”, confessa Otelo Saraiva de Carvalho. Depois de ter declarado publicamente que estava arrependido por ter feito o 25 de Abril, tendo em conta o estado a que o país chegou, Otelo aproveitou para reforçar em Vila Franca de Xira que “o 25 de Abril foi o mais notável acontecimento da história contemporânea portuguesa”. O militar que dirigiu as operações passou em revista a criação do movimento militar que esteve na origem da revolução dos cravos, realçando as “razões corporativistas” que levaram os militares de carreira a revoltarem-se contra o decreto-lei do Governo que permitia a um capitão, mesmo sem ter os quatro anos de curso, subir rapidamente a major. No centro da conversa estiveram outros tantos episódios da operação que comandou, como a saída da coluna de Salgueiro Maia de Santarém rumo a Lisboa, os contactos que ia tendo no Posto de Comando sobre o evoluir das operações, os sustos, as surpresas de última hora que colocavam em causa uma ou outra acção, os papéis de cada um dos muitos executantes das acções político-militares do 25 de Abril e o seu próprio papel de coordenador das operações.O título - “Dia Inicial” - vem de um poema de Sophia de Mello Breyner Andresen: “Esta é a madrugada que eu esperava/ o dia inicial, inteiro e limpo /onde emergimos da noite e do silêncio/E livres habitamos a substância do tempo”. O autor lamentou que o filho da poetisa, Miguel Sousa Tavares, não tenha autorizado a colocação do poema no livro. Otelo Saraiva de Carvalho nasceu em Lourenço Marques, Moçambique, em 1936, e continua a ser uma voz na sociedade portuguesa e, inquestionavelmente, uma referência da revolução de 25 de Abril de 1974.