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“Estou ufano do trabalho feito mas não me recandidataria mesmo que pudesse para não atingir o nível da incompetência”

“Estou ufano do trabalho feito mas não me recandidataria mesmo que pudesse para não atingir o nível da incompetência”

Presidente da Câmara da Golegã, José Veiga Maltez, confessa que se sente outro durante a Feira

Tem um cavalo chamado Ufano e sente-se mais ufano que nunca nos dias da Feira de S. Martinho/Feira Nacional do Cavalo/Feira Internacional do Cavalo Lusitano, quando a Golegã é invadida por milhares de visitantes. José Veiga Maltez, médico e presidente da câmara a meio do último mandato, falou com O MIRANTE sobre fado, garanhões, ciganos, água-pé e cavalo-pistas mas escusou-se a responder a uma pergunta relacionada com... burros.

Durante a Feira ainda se encontram indivíduos de raça cigana a comercializar os seus cavalos como faziam noutros tempos em que se dedicavam mais a este tipo de negócio. Incomoda-o ter essa situação a conviver com uma Feira onde, no picadeiro central nem sequer pode entrar ninguém que não esteja trajado a rigor com a sua montada devidamente aparelhada?Não nos podemos esquecer que as gentes da Feira, as que a fizeram chegar até aos nossos dias, foram os comerciantes e os negociantes de gado. Essa etnia dedicava-se à venda de animais e ainda há muitos dos seus membros que se dedicam a isso. A única coisa que impomos é o cumprimento de regras. Desde que não façam batota serão bem vindos. Desde que respeitem as leis de higiene e saúde pública e veterinária, são sempre bem vindos.O senhor limitou ainda mais a circulação automóvel ao criar uma zona própria para a circulação de charretes. O seu sonho é ter uma zona central da vila interdita a carros durante os dias de Feira?Não. Fazer coabitar a tradição com a modernidade é muito difícil. Temos que ter um espaço para os carros de cavalos e para os cavalos, porque são os únicos que podem inverter o sentido de marcha. Não faz sentido um cavalo que saia da Feira para ir a dois quilómetros de distância do outro lado da vila, seja obrigado a fazer o mesmo circuito que um automóvel. O trânsito automóvel roda e a qualquer momento uma viatura pode parar para deixar alguém que tenha dificuldades de mobilidade, por exemplo. Só que depois tem que ir estacionar aos locais onde pode estacionar.Quem anda de charrete ou a cavalo...Tem outra mobilidade. Mas não criámos nada novo. Esta situação verifica-se ao longo do ano. Os cavalos e os carros puxados por cavalos usam as ciclovias que já existem e estão devidamente assinaladas. Não há grandes mudanças nem incómodos para quem conhece a vila durante o ano e vem à Feira nesta altura.O Centro de Alto Rendimento de Desportos Equestres já deveria estar a funcionar este ano.O concurso público foi demorado porque houve que resolver questões relacionadas com reclamações de concorrentes. Em princípio vamos começar a obra ainda em Dezembro porque temos um ano para o fazer para não nos arriscarmos a perder a verba que está destinada pelo QREN.Depois de construído vai deixar de haver muitas das actividades, nomeadamente as desportivas no Largo do Arneiro. A Feira fica partida?O Centro de Alto Rendimento de Desportos Equestres vai ser um espaço complementar à Feira, já que está a 700 metros em linha recta do largo do Arneiro. Lá vai desenvolver-se a vertente desportiva e aqui ficará a vertente de equitação tradicional e clássica. Não há qualquer divisão. Trata-se de uma complementaridade. Uma coisa é certa. Quem retirar a Feira do Largo do Arneiro, mata-a. Foi o que aconteceu em Santarém com a Feira da Agricultura e a Feira do Ribatejo. Foram para o CNEMA, que é um espaço óptimo mas descaracterizado e nunca mais foi a mesma. É como se estivéssemos em Frankfurt ou em Paris, se não fossem as oliveiras no horizonte no Bairro de Santarém. A Câmara da Golegã tem algum cavalo?Tem um cavalo, que está registado. Serve para o carro de cavalos que passeia na Golegã e que é alugado. O cavalo está a ser alimentado pela Associação Nacional de Turismo Equestre mas foi a Câmara da Golegã que o adquiriu.Tem nome?Não tem. É o “cavalo da câmara”.O senhor não usa o cavalo durante a feira porquê? Eu costumo andar a cavalo mas não sou muito de andar em feiras a cavalo. Gosto mais de ir a cavalo pelo campo, embrenhado nos meus pensamentos e ir desfrutando a paisagem a cavalo. Aqui na Feira só para marcar presença.Tem o seu próprio cavalo. Como se chama?Tenho um cavalo agora que já foi campeão. Chama-se Ufano.Como o senhor está sempre ufano durante estes dias de Feira, temos um ufano a cavalgar outro ufano. É uma simbiose entre cavalo e cavaleiro. Ficamos os dois ufanos.Quantos criadores de cavalos tem o concelho?Meia dúzia. Já lá vai o tempo em que a Golegã era, efectivamente, um grande centro de criação de cavalos.Estão aqui os criadores responsáveis pelo actual efectivo europeu e americano. Todos os padreadores (cavalos para reprodução) existentes nesses países saíram aqui da Golegã.Há cá mais burros ou cavalos?Se fala em burros, burros, eles apesar de protegidos são em menor número que os cavalos. Se está a falar de outros burros, é uma pergunta à qual tenho que me escusar a responder.Há controle de alcoolemia na Câmara da Golegã?Há. Pode ser feito a qualquer hora e a escolha dos funcionários a controlar é aleatória.Não há tolerância durante a Feira de S. Martinho?Se calhar os testes não são feitos nesta altura mas se isso não acontece é só por não haver tempo.Ali à porta do secretariado da Feira está uma ambulância. É costume haver acidentes com cavalos durante a Feira?Isso é interessantíssimo. Este espectáculo é único por isso. No estrangeiro, na maior parte dos países, um garanhão não pode passear em espaços públicos como este. Repare o que é andarem cavalos “inteiros” no meio desta euforia e desta multidão e nunca ter havido um acidente. Os cavalos são animais nobres e tiveram uma grande evolução nos últimos anos. Há críticos que contestam isso e que dizem que antigamente é que havia cavalos a sério mas isso são saudosismos estéreis.O senhor gosta de fado. O seu preferido é o “Cavalo Russo” ou o “Fado Marialva”, aquele que faz uma analogia entre um cavalo e uma mulher. “Eu cá p’ra mim/ Não há ai não/ maior prazer que o selim e a mulher”?É o do “Cavalo Russo” que se chamava gingão. Mas os cavalos são muito bonitos e as mulheres também. Gosta de água-pé ou prefere outras bebidas?Prefiro um bom vinho tinto. É a minha bebida preferida.Quantos copos foi preciso beber para, há dois anos, ter subido ao palco durante um espectáculo do José Cid, para saltar e dançar perante centenas de espectadores? Não é necessário beber para fazer uma coisa dessas. É a adrenalina e a alegria do momento. É um sentimento que exteriorizamos assim.Vai desmontar o cavalo do poder no final do actual mandato, devido a uma imposição legal. Vai voltar a trabalhar como médico e a dar consultas num Centro de Saúde como fazia antes?Médico serei sempre até morrer mas não sei...Se revogassem a lei do limite de mandatos e pudesse recandidatar-se outra vez, fazia-o?Não. Taxativamente não. Arriscava-me a atingir um ponto máximo de incompetência. Como bem enunciou Peter, a evolução de uma pessoa numa estrutura termina no seu nível máximo de incompetência e eu não desejo tal coisa.Esta sexta-feira é dia de S. MartinhoSe quer comprar um cavalo ou, pelo menos assistir a uma apresentação/venda de cavalos, vá ao coração da Feira Nacional do Cavalo, o Largo do Arneiro na Golegã, pelas 18h30, nos dias 10, 11 e 12, para assistir à iniciativa “Um cavalo a ver...um cavalo a adquirir”.Esta é uma das muitas atracções que constam do programa. Destina-se a proporcionar a apresentação pública de cavalos montados cujos proprietários os pretendam transaccionar. Os eventuais compradores podem inclusivamente montar os cavalos, com autorização dos vendedores, mas só o poderão fazer se estiverem correctamente vestidos com traje de equitação.Sexta-feira é dia de S. Martinho, diz o povo que nesta altura se vai à adega provar o vinho. Na feira da Golegã prova-se vinho e, principalmente água-pé...com castanhas assadas. Mas o sabor mais genuíno é o de uma feira popular que remonta ao século XVI. Para quem gosta de cavalos é a grande oportunidade do ano para uma saída de casa com a família e os amigos. No dia 11, a partir das 17h00 os visitantes podem assistir à partida dos Romeiros de S. Martinho na Porta de Fernão Lourenço. Se não conseguirem vê-los aí podem esperar por eles junto à Igreja Matriz onde os mesmos receberão uma bênção, pelas 17h30 antes de arrancarem para o campo. A chegada ao centro da Vila, no Largo do Arneiro está prevista para as 18h00. No mesmo local, pelas 19h30 é apresentada a selecção Portuguesa de Amazonas. Depois do jantar, pelas dez da noite vale a pena assistir ao espectáculo de equitação da Reprise da Escola de Mafra e a seguir a um jogo deBall.No sábado, dia 12, à noite a Feira fecha com mais Horse Ball e “Cavalhadas - Prova de Perícia e Destreza”. Se conseguir convite e vier a rigor, pode terminar a noite na Quinta de Guadalupe, participando no jantar “das Jaquetas”.Que feira é esta com tanto garanhão na rua? A noite cai e o cantor José Cid, encostado à vedação do Picadeiro Central, na Golegã, fala das coisas de que não gosta na Feira que mais adora e que visita desde menino. “Não gosto de ver pessoas a cavalo vestidas de qualquer maneira. A organização devia dar mais atenção à exigência de os cavaleiros e amazonas envergarem trajes de equitação. Não gosto das bebedeiras que começam logo a seguir ao almoço”.Sensivelmente à mesma hora, a pouco mais de cento e cinquenta metros do grande bulício da Feira de S. Martinho/Feira Nacional do Cavalo/Feira Internacional do Cavalo Lusitano, o senhor Manuel Rodrigues, lê o jornal na sua pequena barbearia. Na rua é possível ouvir o ruído dos ralos e dos grilos que vem do campo. Não há clientes para atender. “Já vem toda a gente com a barba feita e o cabelo cortado para a feira”, diz a sorrir.Em frente ao palco montado para o programa de televisão “A festa é nossa”, em frente ao edifício do secretariado, o presidente da câmara, José Veiga Maltez, que acabou de ser entrevistado, tira fotografias ao grupo “Quinta do Bill”, com o seu telemóvel.Na primeira tenda de comércio que encontramos depois de deixarmos o carro na berma da Estrada Nacional 243, vende-se arte pré-colombiana. Depois passamos pela ginja de Óbidos, pelas rulotes das farturas, restaurantes improvisados que anunciam carne barrosã e carnes bravas de Coruche. Debaixo de um toldo uma criança cigana esganiça-se a apregoar os seus cavalos de peluche feitos em série, de pelo acrílico desgrenhado, cuja fealdade afasta desde logo potenciais clientes. Há muita gente de chapéu de aba direita. As mulheres completam o toque campestre com calças de ganga justas enfiadas em botas de cano alto, o que lhes realça as formas das nádegas. O “Fado Marialva” do José da Câmara foi banido. Em vez de “Eu cá p’ra mim / Não há ai não maior prazer que o selim e a mulher” e “Quem anda a trote em cima de um bom alter / Leva no bote a mais difícil mulher...”, ouvem-se canções brasileiras à passagem pelo atrelado das caipirinhas”.Na manga, a passo ou a trote, andam cavaleiros que trazem mulheres na garupa. A maior parte anda de calças de ganga, camisa e boné. José Cid tem razão quando critica o mal-trajar. No picadeiro do Largo do Arneiro disputa-se um concurso de saltos. Uma das participantes é cuspida da montada e cai aparatosamente. “Uma queda sem consequências” diz a voz da apresentadora que sai dos altifalantes, enquanto Jessica, com o cavalo pela rédea coxeia a caminho da saída. Em certas zonas caminha-se por um tapete fofo de excrementos de equídeos. Dois GNR a cavalo respondem com simpatia às perguntas de quem passa e não se incomodam com as fotografias dos turistas como é normal acontecer quando são fotografados em acção pelos jornalistas. Vieram de Lisboa. Na Golegã, Capital do Cavalo, a GNR não tem cavalos para fazer o patrulhamento. Alguns que encontramos pouco depois andam a pé perdidos na multidão, sem conseguirem ver o que os seus colegas montados vêem lá do alto.Um senhor com um imenso e colorido “sombrero” mexicano passeia um pónei preto e proporciona breves passeios às crianças cujos pais o solicitam. Uma espécie de “baptismo na arte de cavalgar”. Ouve-se falar espanhol, francês, mas principalmente português. A fadista de Riachos, Teresa Tapadas, trajada de amazona, canto um fado de despedida num palco com fardos de palha como décor. O sol põe-se lentamente por detrás das casas térreas e um garanhão lusitano relincha em contra-luz.
“Estou ufano do trabalho feito mas não me recandidataria mesmo que pudesse para não atingir o nível da incompetência”

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