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“Não há nenhum sítio no mundo para escrever como Almeirim”

“Não há nenhum sítio no mundo para escrever como Almeirim”

Fascínio de Maria João Lopo de Carvalho pela vida da Marquesa de Alorna levou-a a escrever um livro sobre a condessa que viveu parte da sua vida em Almeirim

Desde 1999 que Maria João Lopo de Carvalho decidiu que queria escrever um livro sobre a Marquesa de Alorna. Depois de cerca de sete anos de pesquisa e investigação a escritora começou a escrever as primeiras páginas de “Marquesa de Alorna - Do Cativeiro de Chelas à corte de Viena” no dia do aniversário de nascimento da marquesa, a 31 de Outubro de 2010. A escritora nasceu em Lisboa há 49 anos mas vem a Almeirim desde que nasceu. O bisavô comprou a Quinta da Alorna, casa onde também viveu a Marquesa da Alorna. O facto de ter crescido e percorrido os mesmos locais que a figura central do seu livro fez crescer o fascínio sobre a marquesa. O que levou ao lançamento deste livro que já é um dos mais vendidos a nível nacional.

O que a levou a querer escrever um livro sobre a Marquesa de Alorna?A Marquesa de Alorna foi uma mulher que sempre me inspirou ao longo da vida e sobretudo por partilhar com ela os mesmos espaços. A casa onde eu casei foi a casa onde a marquesa casou. O quarto onde durmo quando venho cá passar os fins-de-semana foi o quarto dela. Sou fascinada pela sua história de vida.O facto de viver na quinta onde a Marquesa da Alorna viveu contribuiu para esse fascínio?Sem dúvida. Desde miúda que me lembro de ouvir histórias da marquesa e por isso sempre fui investigando a sua história ao longo de toda a vida. Um bocadinho aqui, outro ali, não de uma forma sistemática. Neste último ano reuni tudo o que tinha, aprendi um pouco mais e estive nove horas por dia a escrever tudo o que sabia sobre ela.Quando decidiu que fazia sentido escrever um livro sobre a Marquesa de Alorna?Desde 1999 que digo que vou escrever esta história pelo facto de partilharmos o mesmo gosto pelas letras, política, educação. Foi uma mulher muito evoluída para a época em que viveu. Foi uma mulher única no seu tempo. Não houve outra mulher nos séculos XVIII e XIX com a garra e força que a Marquesa de Alorna tinha.O que é que a surpreendeu ao longo da investigação que fez sobre a vida da marquesa?Não tinha a noção que ela tinha esta paixão pela educação e que tinha uma grande paixão e determinação em mudar o sistema de educação, nomeadamente ao nível da educação feminina, em Portugal. Nenhum livro nos diz isso, só a Torre do Tombo com as milhares de pastas com documentos da marquesa que pesquisei.A escritora tem algumas parecenças com a Marquesa de Alorna?Partilhamos o gosto pelas letras, política e educação mas as parecenças ficam por aqui, porque eu sou uma mulher normal e ela era uma mulher completamente invulgar. Eu não tenho um milímetro do espírito e da genialidade que ela tinha. A Marquesa de Alorna era uma mulher que sobressaía e se salientava entre milhares, não só em Portugal mas também em toda a corte europeia. Como é que uma portuguesa, cinco anos depois de sair da prisão, chega às cortes austríacas e deslumbra toda a gente?Se a Marquesa de Alorna vivesse no nosso tempo o que é que ela diria do país em que vivemos?Ela diria, sem hesitar, «deixem-se de ‘partes gagas’ que esta crise não é uma crise que vos vai matar, porque eu passei por crises muitos maiores do que esta e com muito menos meios e consegui sobreviver a tudo. Usem os meios que têm ao vosso dispor que eu não tive nada disto e sobrevivi. Tenham coragem, sejam curiosos e tenham criatividade para mudar as coisas».Marquesa não aceitava que as mulheres fossem incultasDepois de cerca de sete anos a pesquisar e investigar sobre a vida da Marquesa de Alorna, Maria João Lopo de Carvalho começou a escrever o livro “Marquesa de Alorna - Do Cativeiro de Chelas à corte de Viena” no dia do aniversário de nascimento da Marquesa, a 31 de Outubro de 2010. As primeiras páginas da obra foram escritas na casa de uma das irmãs, na Guarda.A escritora não tem qualquer laço familiar com a figura central do seu livro mas o facto de ter crescido na casa onde também viveu a Marquesa de Alorna - a Quinta da Alorna, em Almeirim, foi comprada pelo bisavô de Maria João Lopo de Carvalho - marcou-a tendo-a levado a querer saber sempre mais sobre a marquesa. “Casei na mesma casa que a Marquesa da Alorna casou e o quarto onde durmo sempre que venho a Almeirim é o mesmo onde ela dormiu. Desde criança que oiço histórias sobre ela e isso sempre me fascinou”, explica a O MIRANTE no final da sessão de apresentação do livro que se realizou na Escola Secundária Marquesa de Alorna, em Almeirim, na tarde de 10 de Novembro.Esta é a primeira incursão de Maria João Lopo de Carvalho no romance histórico. Leonor de Almeida Portugal, mais conhecida por Marquesa de Alorna, nasceu em Lisboa a 31 de Outubro de 1750 e morreu vinte dias antes de completar 89 anos. Aos oito anos foi presa - juntamente com a sua família - pelo Marquês de Pombal por serem parentes dos marqueses de Távora. Durante os 18 anos em que esteve presa aproveitou para ler as principais obras da época, escrever poesia e pintar. Depois de sair da prisão casou com um conde austríaco tornando-se Condessa de Oyenhausen-Granvensburgo. Após a morte do marido instalou-se na Quinta da Alorna e tinha uma fixação pela educação feminina porque não aceitava que as mulheres fossem incultas. Pagava a uma mestra para ensinar as prostitutas da vila e das povoações vizinhas a ler, escrever e a coser. Foram estas características de uma mulher “muito avançada para o seu tempo” que fascinaram Maria João Lopo de Carvalho e a levaram a escrever este livro. Durante todo o processo de escrita a autora falava e comportava-se como se fosse a própria marquesa. “Os meus amigos e família, por vezes, achavam que eu não estava bem porque começava a falar como se a marquesa estivesse ali ao meu lado”, conta bem-disposta, acrescentando que acredita que a Marquesa de Alorna a acompanhou sempre durante os doze meses em que escreveu o livro. “Toda a parte histórica foi muito difícil para alguém, como eu, que não tem um perfeito conhecimento da História. Quis desistir algumas vezes e tenho a certeza que foi ela que não me deixou”, revela. Sob a chancela da Oficina do Livro, o mais recente livro de Maria João Lopo de Carvalho tem 688 páginas. Já escreveu mais de quatro dezenas de livros mas esta foi a obra que mais prazer lhe deu. O próximo, “em princípio”, será sobre a Padeira de Aljubarrota mas para 2015 já tem agendado o lançamento do livro sobre o centenário do Grupo de Forcados Amadores de Santarém.“O Ribatejo é um espaço ideal de tranquilidade para a inspiração”Vem a Almeirim praticamente desde que nasceu. Que memórias guarda da cidade?Além da praça de toiros e das questões culturais as minhas memórias estão mais relacionadas com a Quinta da Alorna e com o espaço agrícola, porque era quase uma redoma em que vivíamos sempre que vínhamos a Almeirim. Lembro-me de vir para a noite de Almeirim quando era adolescente. Fugia de casa pela janela e fazia, juntamente com as minhas amigas, o caminho entre a quinta e o centro da cidade a pé para nos divertirmos nos bares de Almeirim e bebermos um vinho fora da alçada dos nossos pais.O Ribatejo e Almeirim têm alguma influência na sua escrita?Muitíssimo. É o espaço ideal de tranquilidade para a inspiração.Quando escreve refugia-se em Almeirim?Venho para cá não só quando quero escrever livros. Já vim para cá para me preparar para o teste de Matemática do 12º ano, como para o teste de Física que eram as coisas que mais odiava. Gosto de me isolar na quinta a escrever livros, o que nem sempre é fácil mas consigo sempre ter um local onde não há aviões a passar, não há carros, o ar é diferente, durmo bem, sinto-me aconchegada, feliz, no meu ambiente natural.Tem algum local predilecto para escrever?Na sala que dá para a cidade de Santarém, exactamente onde a marquesa escrevia. Tento sempre encontrar os sítios de referência onde ela escrevia, mesmo que não seja para escrever sobre ela. A quinta tem uma paisagem maravilhosa e a serenidade do campo, o sossego e o silêncio absoluto é tudo o que eu preciso para escrever. Não há nenhum sítio do mundo como Almeirim para escrever.O que gosta mais em Almeirim?Além da sopa da pedra, das corridas de toiros, dos jardins com as laranjeiras, das bicicletas é a memória de um tempo feliz. Da minha avó, dos meus pais, da adolescência, de aprender a andar a cavalo, de galopar quilómetros ao sábado de manhã por esta terra sem fim, de todas as memórias de infância que passei com a minha família viva.Imagina-se a viver os últimos anos da sua vida em Almeirim?Imagino, só que a Quinta da Alorna tem 70 accionistas e não é fácil dividir este espaço por todos. É adepta da festa brava?Sou e gosto muito de ir às corridas de toiros. Um dos próximos livros que vou escrever vai ser sobre o centenário do Grupo de Forcados Amadores de Santarém que sairá em 2015, ano em que completam cem anos.Pensou em enveredar pela medicina. Como é que acaba a escrever livros?Tudo por causa da Natália Correia e da Marquesa de Alorna. Ia para medicina mas não tinha nota. Um dia vim à Alorna assistir à gravação de um programa de televisão, de Natália Correia, chamado “Mátria” sobre a Marquesa de Alorna e fui a única neta que pude assistir à gravação do programa. Lembro-me que pouco tempo depois disso tive uma conversa com o meu pai, e ele disse-me que o mais acertado era voltar para trás, deixar a área de científico-naturais, para seguir letras que era a área para a qual estava vocacionada.
“Não há nenhum sítio no mundo para escrever como Almeirim”

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