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“A função pública pode funcionar bem se tiver pessoas capazes de a gerir”

A vereadora da Câmara de Ourém diz que todas as organizações têm “ninhos” de pessoas empenhadas em destruir quem trabalha

Quando chegou à Divisão de Urbanismo, descobriu uma realidade kafkiana. Pessoas e empresas com processos de contra-ordenação a correr por terem iniciado obras sem licença e os pedidos de licenciamento das mesmas a acumularem-se no serviço durante anos e anos, à espera de um despacho.

Resistiu muitos anos mas acabou por aceitar desempenhar um cargo político. Como a convenceram a aceitar? Para mim a gestão pública é ajudar a resolver os problemas das pessoas e contribuir com soluções para a produção de riqueza e de emprego. Sou natural e residente em Ourém e tenho andado pelo distrito de Santarém a desempenhar cargos públicos e a tentar mudar o que está ao meu alcance. Fui convidada pelo Paulo Fonseca (fomos colegas de escola) e todos os que fizeram parte da lista achavam que o concelho precisava de se livrar de políticos muito preocupados com festas e romarias para passar a ter gestores, de facto, da coisa pública. Qual é a realidade de Ourém? Acompanhei os indicadores de emprego durante mais de dez anos consecutivos. Em Ourém a situação era de quase pleno emprego. Temos a sorte de ter uma base económica muito diferenciada e isso só se consegue quando as pessoas são muito dinâmicas. Mas há tantos entraves que quem consegue criar uma empresa é quase um herói. Dou-lhe um exemplo de como se trava a iniciativa privada. Quando cheguei há câmara descobri que havia cerca de 1500 processos de obras acumulados. Muitos deles eram relativos à aplicação de contra-ordenações a pessoas que tinham começado obras sem licença. Comecei a analisar aquilo tudo e descobri que a maioria daquelas pessoas tinham entregue os pedidos de licenciamento mas que os mesmos estavam parados. A mesma câmara não pode ser “Maria patroa” e “Maria criada”.De que modo a sua faceta de empresária intervém no seu trabalho de vereadora?Faz-me entender as suas dificuldades e preocupações. Por exemplo, nunca tiro férias entre Junho e Setembro porque tenho a Divisão de Obras à minha responsabilidade. Os dias são maiores e mais solarengos e há pessoas que querem construir nesta altura do ano, nomeadamente emigrantes que estão de férias. Depois, duas vezes por semana limpo todos os processos que há na secção de obras. É um compromisso que tenho comigo mesma. Neste momento, os processos já foram reduzidos a 600. Vou muitas vezes ao terreno ver situações que me levantam dúvidas para as esclarecer e tomar a decisão mais justa.Chegou ao Instituto de Emprego e Formação Profissional da mesma forma que chegou a vereadora? Por influência de alguém próximo? Quando comecei a trabalhar, há vinte e tal anos, nunca pensei trabalhar na função pública. Achava que não funcionava. Felizmente o meu amigo Octávio Oliveira (actual presidente do Instituto de Emprego e Formação Profissional), que muito prezo, convenceu-me a fazer um estágio no Centro de Emprego de Torres Novas e mostrou-me que a função pública pode funcionar se tiver pessoas capazes de a gerir. Tive a sorte de trabalhar no IEFP que foi uma casa premiada como entidade pública de excelência a nível nacional. As organizações são tão grandes quanto maiores conseguirem ser as pessoas que lá trabalham. E uma câmara municipal não é excepção. E na Câmara de Ourém há pessoas capazes?Claro que há. Mas também existem aqueles “ninhos”, que há em todas as organizações, que tentam destruir as pessoas que querem trabalhar. Onde está a encontrar resistência?Na luta para acabar com o papel. Há muita gente que gosta de papéis. Mas vou conseguir. Penso que se tudo for informatizado evita-se a duplicação. Em organização administrativa, isto é indispensável. A Divisão de Urbanismo é uma das que está na minha competência e só não começamos já a receber processos em suporte digital porque os técnicos necessitam de dois monitores: um para ver os desenhos e outro para ir folheando o processo. Nesta casa só vai haver um sítio para entradas e outro para saídas. É uma mudança radical.Eu gosto de coisas difíceis. Não pedi este pelouro ao meu presidente mas senti que os meus colegas não estavam muito interessados em ficar com ele. Para mim, a Divisão do Urbanismo é a cara da Câmara. Se estiver oleada e a funcionar bem, de acordo com a lei, proporcionamos o crescimento. Eu própria já me desloquei várias vezes à CCDR (Comissão de Coordenação Regional) para resolver processos que tinham 10, 15 anos e, paulatinamente, temos conseguido.Tem havido muitas alterações a nível dos recursos humanos?Transferi pessoas de serviços onde estavam em excesso para serviços onde havia deficiência. A câmara, nestes dois últimos anos, perdeu 116 pessoas, entre contratos que terminaram e aposentações. Entraram dez pessoas, a sua maioria técnicos superiores pois existia um desequilíbrio em relação ao número de assistentes operacionais. Não quer dizer que sejam melhores mas têm a obrigação de o ser, porque recebem o salário para isso. Temos que saber fazer mais com menos.Como é que organiza o seu tempo?Chego à câmara entre as nove e as nove e um quarto. Inicialmente, chegava sempre às oito da manhã porque tinha aquela ideia de pôr os processos em dia mas ultimamente tenho optado por levar papéis para casa porque ali estou liberta da confusão dos telefones. Por outro lado também atendo muita gente sem marcação porque se é para resolver temos que agir prontamente. Um assunto que se deixa arrastar é um problema que se cria. As coisas chatas que tenho para fazer são normalmente as primeiras que faço para não pensar mais nelas. Muitas vezes temos que cortar o mal pela raiz. O que é mais gratificante para si nesta função de vereadora?Gosto de fazer coisas. De mudar coisas. De ver as coisas a mudar e sentir que intervim nessa mudança. Gosto de sentir que contribui para a criação de emprego, que ajudei a gerar riqueza ou uma organização a crescer. É isso que me dá ânimo.Quais são já as marcas da sua presença em dois anos e dois meses de mandato?Eu acho que o que é mais visível foi a alteração na forma de tratar e despachar as obras particulares. Felizmente a minha chefe de Divisão, a Dra. Célia Reis, também tem uma visão diferente das coisas. Nós temos obrigação de conhecer muito bem a lei. E temos obrigação de ajudar quem tem mais dificuldade e encaminhar as pessoas no bom sentido. Depois, também destaco o regulamento intermunicipal que está a ser desenvolvido em comum na Associação de Municípios da Área Metropolitana de Leiria (AMLEI), que penso que vai dar frutos. E se ganhar a batalha do papel, vamos produzir mais com menos custos, beneficiando a transparência para o cidadão. Já fez inimigos na política?Já, mas não relevo. Não tenho tempo para perder tempo com coisas que não merecem. Se há mentiras tenho que ir ao fundo da questão. Não alimento fofocas, intrigas, tricas ou admito que ponham na minha boca palavras que não disse. Estou aqui é para trabalhar não para me preocupar com minudências. Que visão tem para Ourém?Gostava muito que esta fosse uma “mega cidade” nesta região do país. Não uma cidade em altura mas em dimensão, com muita qualidade de vida.. Acho que o concelho de Ourém ganha muito se vier a envolver-se ainda mais com Fátima, que é conhecida mundialmente. Como é que é a Lucília Vieira fora da autarquia?Sou uma pessoa bem disposta, alegre, amiga do seu amigo, que gosta de se divertir. Sou muito aventureira. A minha empresa de criação de animais é também o meu escape. Tenho milhares de coelhos e sinto-me muito bem no campo. E depois tenho a minha família. O meu pai emigrou para França onde faleceu em 2009. Somos cinco irmãos e tenho a minha mãe que é o grande pilar da família. A minha forma de estar e de ser devo-os à minha mãe. Conseguiu educar-me na verdadeira acepção da palavra. Como é que ocupa as suas férias?Gosto muito de viajar. Já viajei pela Europa toda. Normalmente, tenho um carro alugado à minha espera no aeroporto onde desembarco. Tenho a sorte de ter um grupo de amigos que me acompanha nessas viagens. Agarramos num mapa e vamos à descoberta do país, sem roteiros nem horários. Andamos pelo campo, falamos com as pessoas. Aprende-se muito com essa experiência. Desde que estou na câmara tenho pena de já não o poder fazer tantas vezes. É uma mulher vaidosa?Nada. Sou uma mulher muito prática. Não perco muito tempo a ver-me ao espelho. Determinada e...independenteNasceu no Olival, em Ourém, a 31 de Outubro de 1963. Nunca pensou ser funcionária pública mas é neste sector que trabalha há mais de 20 anos. Dirigiu os Centros de Emprego de Torres Novas, Santarém e Tomar e Centro de Formação de Tomar antes de assumir funções como vereadora da Câmara de Ourém, após as eleições de 2009. Assume com orgulho o seu percurso profissional. Estudou em Ourém, concluiu o 12.º ano em Leiria, tirou o curso superior de Gestão de Empresas em Évora e fez uma pós-graduação em Administração Pública. O Centro de Emprego de Torres Novas foi o seu primeiro trabalho após terminar o curso, em 1990. Tomou posse, como directora, a 5 de Agosto de 1992 e esteve no cargo até 2000. Considera-se uma pessoa apaixonada por grandes projectos e desafios e quando se entusiasma com alguma tarefa perde a noção do tempo. Diz que quando está num lugar e sente que tem “a casa já arrumada” está na altura de ir para outra. Gosta de liderar, criar equipas e relacionar-se com as pessoas. É exigente consigo própria e com as pessoas que a rodeiam. Considera que o exemplo tem que vir de cima. Diz que se houvesse menos políticos e mais operacionais dedicados à causa pública, o país estaria melhor. Reconhece o papel dos partidos políticos mas não é filiada em nenhum porque quer continuar a pensar pela sua cabeça sem ter que ser obrigada, por solidariedade, a dizer que sim quando quer dizer não. Quase todos os dias leva trabalho para casa. Tem uma óptima relação com os quatro irmãos e com a mãe de quem herdou a determinação. Gosta de viajar com amigos e tem duas empresas de criação animal. Considera que a principal riqueza de Ourém, a par da sua excelente localização geográfica é ter pessoas muito trabalhadoras que, geneticamente, são empreendedoras. Não se imagina a viver numa grande cidade. No seu gabinete de trabalho tem um quadro com o Castelo de Ourém, que a acompanhou para todos os lugares onde trabalhou no distrito de Santarém.Gosta muito de conduzir e já fez várias viagens de carro pela Europa, com amigos. Criou duas empresas, a primeira das quais em 1998, ligadas ao ramo da criação animal. O seu escape, ao fim-de-semana, é o contacto com os animais. Nas férias, só atende chamadas da família, da secretária ou do presidente da Câmara.

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