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Quando começa uma crise a primeira coisa onde se corta é na cultura

Se há área que se ressente em tempo de crise é a cultura. As câmaras municipais, os grandes mecenas, encurtam festas e romarias fazendo contas aos orçamentos cada vez mais pequenos. Justiça seja feita a municípios que muito embora sintam os constrangimentos financeiros, como o de Vila Franca de Xira, estão de boa saúde e preservam prémios literários, musicais e até o fogo de artifício nas festas taurinas como quem tem a preocupação de continuar a iluminar a alma de um povo. Do lado oposto esteve, por exemplo, a Câmara Municipal de Torres Novas que, atolada em dívidas, insistiu em não pagar o prémio Maria Lamas à vencedora, a investigadora Inês Brasão, e cancelou as tradicionais festas da cidade.O cenário cultural em 2012, genericamente escuro, teve alguns veios de luz. Como a rosácea do Convento de São Francisco, em Santarém, que pelo 10 de Junho compôs a fachada de um monumento emblemático da capital do gótico. Uma ou outra publicação ajudou a animar o panorama. Como a obra de Rogério Coito - “Cartaxo - no cruzar dos tempos” - que assinalou os 700 anos da atribuição do foral. João de Matos Filipe escreveu sobre a “Cultura e Artes de Pesca Tradicional no Rio Tejo em Ortiga-Mação”, livro com a chancela de O MIRANTE. Os “Quinta do Bill”, sobreviventes no meio musical há 25 anos, editaram um álbum de baladas para celebrar as Bodas de Ouro mas que viram-se preteridos nas agendas dos concertos de Verão por artistas amadores, como aconteceu nas Festas da Cidade do Entroncamento. Ainda são as colectividades, algumas centenárias, sustentadas no voluntariado, que vão imprimindo vigor e em muitos concelhos asseguram que os eventos continuam a realizar-se. O Ateneu Artístico de Vila Franquense viu pela primeira vez em 120 anos uma mulher assumir o cargo de presidente da direcção. Em Ourém a Sociedade Filarmónica Ouriense, com 157 anos de existência, regista um fenómeno curioso: alguns pais, que em tempos integraram a banda mas tiveram que sair por contingências familiares e profissionais, estão a regressar. Pela mão dos filhos. A Sociedade Euterpe Alhandrense continua igualmente de pé. Comemorou 150 anos no dia 1 de Dezembro. O presidente já prometeu que para o ano, na mesma data, a banda volta a sair à rua. Seja ou não feriado.22 de MarçoRogério Coito, 75 anos, ex-deputado municipal do Cartaxo pela CDU e historiador, publica o livro “Cartaxo - no cruzar dos tempos”, comemorativo dos 700 anos da atribuição do foral, concedido por D. Dinis e D. Isabel de Aragão. Em cerca de 200 páginas, prefaciadas por Ana Benavente, Rogério Coito honra as gentes que tornaram um lugar ermo numa terra produtiva. O volume foi o resultado de investigação e pesquisas que o autor, natural da Ereira, mas há muito a residir na sede de concelho, efectuou na Torre do Tombo e que, através da escrita, fotografias, imagens e cópias de documentos, relata factos até à data desconhecidos. 29 de Março Uma jovem enfermeira de Vila Franca de Xira, Filipa Silva, é escolhida aos 27 anos para assumir o cargo de presidente da direcção do centenário Ateneu Artístico Vilafranquense. É a primeira mulher a ocupar o cargo em 120 anos de história da colectividade. A casa tem uma tradição de presidentes do sexo masculino. A documentar isso mesmo está um conjunto de fotos que forra as paredes da colectividade centenária. Em 2009 o Ateneu não tinha voluntários para assumir a direcção e a colectividade foi gerida por duas comissões administrativas, o que dificultou o funcionamento da colectividade. Filipa Silva lidera uma equipa jovem. Seis dos sete elementos da direcção têm menos de quarenta anos.12 de Abril Os Quinta do Bill celebram 25 anos de carreira com um álbum de baladas, um lado menos visível da banda, segundo Carlos Moisés, um dos fundadores. O álbum “25 anos - as baladas”, com a chancela da editora Espacial, integra 13 temas, dois deles gravados este ano, “D’alma Lavada” e “No Silêncio do teu olhar”, e chegou às lojas a 2 de Abril. As restantes 11 baladas seleccionadas são dos diferentes álbuns dos Quinta do Bill, como “A única das amantes”, do “No trilho do sol”, de 1996, “Ruiva”, de “A hora das colmeias”, de 2006, ou “O pecado no corpo”, de “7”. Para Carlos Moisés a paixão pelo que se faz justifica a longevidade da banda que tem conseguido gravar álbuns e fazer concertos bem como angariar um público fiel.3 de MaioNuno Figueiredo, 60 anos, autor de “Rendição e Trevas”, venceu o prémio literário Alves Redol na categoria de romance, patrocinado pela Câmara Municipal de Vila Franca de Xira. O autor escolhido pelo júri é engenheiro civil de profissão e já tem outros livros publicados. A cerimónia de entrega dos prémios decorreu a 26 de Abril na Biblioteca Municipal de Vila Franca de Xira. Humberto Oliveira, 37 anos, organizador de espectáculos, residente em Ribafria, Peniche, venceu na categoria de conto com “Um eterno minuto de silêncio”. O município de Vila Franca de Xira mantém o prémio literário Alves Redol apesar da crise financeira que se atravessa e ao contrário do que fizeram muitas autarquias que decidiram cancelar este tipo de iniciativa para contenção de despesa. O número de obras duplicou em relação à edição anterior. 10 de Maio A Sociedade Filarmónica Ouriense comemora 157 anos de existência. Foi fundada pelo padre José Joaquim Silva, que também era músico e formou a banda filarmónica com alguns antigos músicos do exército miguelista que participaram na guerra civil pelo trono português. Os tempos mudaram, os elementos da banda já não entram em batalhas, mas dão o corpo ao manifesto para manter viva a colectividade mais antiga do concelho de Ourém. A SFO conta com 55 elementos entre os dez e os 50 anos de idade. O grupo está a registar um fenómeno curioso: alguns pais, que integraram a banda há uns anos e saíram, sobretudo as mulheres, para serem mães e ocuparem-se da família, estão a regressar pela mão dos filhos. 17 de MaioRicardo Peixeiro, fotógrafo amador, informático de profissão, passou seis meses na borda d’água, a captar imagens da comunidade avieira. O romance de Alves Redol, prefaciado pelo próprio autor em Caxias, foi o rastilho. Depois de uma carreira de quase 15 anos Ricardo Peixeiro viu-se desempregado e aproveitou o tempo livre para mergulhar num projecto que trazia já a amadurecer dentro de si: explorar a sua paixão pela fotografia captando a vida da comunidade avieira que ainda subsiste no Esteiro do Nogueira, na zona ribeirinha de Vila Franca de Xira, para lá do Jardim Constantino Palha e com a ponte Marechal Carmona no horizonte. O resultado esteve em exposição no Centro de Artes do Rio Manuel do Vau.7 de JunhoCristina Maria Ferreira, mestre de cantaria artística, conhecida pelo fado, demorou quatro meses a fazer a rosácea para a fachada do Convento de S. Francisco, em Santarém, que foi inaugurada a 10 de Junho. Na voz a fadista tem a força de um escopro a sulcar a pedra e nas mãos a arte e a sensibilidade que a levou a ser escolhida para fazer a rosácea de quatro metros de diâmetro, que considera ser a obra da sua vida pelo simbolismo que representa. Herdeira da sabedoria e arte do mestre Alfredo Neto Ribeiro, falecido há uma década, Cristina Maria é das poucas que se dedicam à cantaria artística, uma arte que tem estado esquecida em Portugal. 21 de JunhoA sede da Fundação José Saramago, o escritor Prémio Nobel natural de Azinhaga (Golegã), foi inaugurada a 13 de Junho, na Casa dos Bicos, em Lisboa, com uma exposição, a poucos dias de se cumprirem dois anos após a sua morte, a 18 de Junho. A cerimónia contou com a presença de Pilar del Rio, presidente da Fundação José Saramago, viúva do escritor, do presidente da Câmara Municipal de Lisboa, António Costa, e de cerca de uma centena de convidados. Mário Soares e Jerónimo de Sousa faziam parte de uma extensa lista de convidados e eram dois dos políticos que acompanhavam Pilar del Rio numa visita pela nova casa museu de Saramago.18 de Outubro Em cinco anos o Museu do Neo-Realismo de Vila Franca de Xira conseguiu atrair 120 mil visitantes, manter uma programação constante, com o apoio da tutela municipal, contornando assim a crise. É um espaço de cultura de dimensão nacional e internacional que não ficou refém de uma corrente abrindo-se à contemporaneidade. O êxito do museu, reconhecido pela Associação Portuguesa de Museologia que já o distinguiu, deve-se em parte ao profissionalismo da equipa. No museu qualquer iniciativa tem entrada gratuita e os preços das edições são simbólicos quando comparados com os valores praticados noutras instituições museológicas. 6 de DezembroAntigos dirigentes da Sociedade Euterpe Alhandrense, que comemorou 150 anos, foram homenageados pela colectividade. Trabalharam voluntariamente para a colectividade num tempo em que já era difícil conquistar pessoas para o associativismo. Nesses tempos não havia subsídios, mas fundos, que se conseguiam com a organização de bailes e com o lucro que se retirava do bar. No dia 1 de Dezembro a sessão solene reuniu mais de meio milhar de pessoas. Para o ano seja ou não feriado, a banda vai voltar a sair à rua, avisa o actual presidente. 14 de Dezembro O vereador da CDU na Câmara de Torres Novas, Carlos Tomé, apresentou na reunião do executivo o livro “O Tempo das Criadas - A Condição Servil em Portugal (1940-1970)”, editado pela Tinta da China. O trabalho valeu à investigadora Inês Brasão o primeiro prémio, do concurso Maria Lamas, criado pelo município torrejano, mas a autora nunca recebeu os dez mil euros do prémio tendo o presidente da autarquia chegado a sugerir que o concurso fosse cancelado porque não havia dinheiro para cumprir aquele compromisso.27 de Dezembro O livro “Cultura e Artes de Pesca Tradicional no Rio Tejo em Ortiga-Mação”, da autoria de João de Matos Filipe, editado por O MIRANTE, é apresentado no Instituto Politécnico de Tomar. Desde criança que João de Matos Filipe, 65 anos, “sentia” que os usos e costumes da sua terra eram fortemente marcados por uma forte ligação ao Tejo mas a consciência surge mais tarde quando notou que a actividade piscatória era um complemento ao sustento de muitas famílias. Na pequena aldeia piscatória sempre que alguém está à espera que lhe ofereçam alguma coisa ouve-se dizer que “está sempre de varela armada”.

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