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Filarmónica Fraude partilha peripécias vividas no final dos anos 60 em Tomar

Filarmónica Fraude partilha peripécias vividas no final dos anos 60 em Tomar

A apresentação do livro “E tudo acabou em 69”, lançado recentemente, serviu de pretexto para que os elementos do grupo promovessem um encontro onde se recuaram algumas décadas no tempo.

“Um dia estávamos a actuar no Club Thomarense e o Dr. Bento Baptista dirigiu-se ao palco e pediu ao Carlos Barata para cantar o ‘I Can Get no Satisfaction’ (Rolling Stones) mais baixo. Não só não acedeu ao pedido como começou a cantar mais alto até que o conhecido médico tomarense foi-se embora. Foi um escândalo na altura”. A história foi contada, entre muitos risos e gargalhadas, na noite de sexta-feira, 5 de Abril, no Café Paraíso em Tomar, por Antunes da Silva (Toneca), elemento da Filarmónica Fraude, um grupo musical de Tomar que teve existência efémera no final dos anos sessenta do século XX mas que deixou uma marca indelével na música portuguesa. A apresentação do livro “E tudo acabou em 69”, lançado recentemente serviu, aliás, de pretexto para que os elementos do grupo promovesse um encontro na sua geografia e partilhassem algumas das muitas peripécias vividas na cidade do Nabão nos finais dos loucos anos 60. O grupo, conta Toneca, começou por se chamar “Os Incas” e ensaiava numa casa em Palhavã de Cima, afastada do centro histórico, mas aproveitaram o facto do pai de Luís Linhares, que na cidade é mais conhecido por maestro António Sousa da Canto Firme, ser o presidente do afamado Clube Thomarense, na rua Serpa Pinto, para ali começarem a ensaiar. “Este café é uma maravilha mas nós nem gostávamos muito de passar aqui à porta quando íamos ensaiar. Usávamos uns incipientes cabelos compridos e os pais de alguns de nós, que eram frequentadores assíduos deste café, lançavam-nos uns olhares assustadores”, começou por contar Carlos Barata, revelando ainda que, por causa do visual diferente, os elementos da Filarmónica Fraude eram frequentemente insultados em Tomar. “Passados cinco ou seis anos notávamos que as pessoas que nos chamavam esses nomes feios também vestiam as mesmas calças à boca de sino e usavam o cabelo comprido. Um regalo para nós que, afinal, demos em pessoas completamente normais”, atestou.António Sousa revela que, quando tinha 15 anos e concluiu o 5.º ano, o pai, tal como ao irmão (Corvêlo de Sousa, ex-presidente da Câmara de Tomar), pretendia dar-lhe uma bicicleta a motor. Como o irmão mais velho já tinha uma conseguiu convencê-lo a dar-lhe o dinheiro para ir para Inglaterra trabalhar num campo de férias onde permaneceu 45 dias. “Se já tinha o cabelo comprido ainda mais cresceu. Como o dinheiro acabou, tive que vir de comboio. Demorei três dias e, quando cheguei à Estação do Entroncamento, ninguém se podia chegar ao pé de mim com o cheiro”, contou. O pai mandou-o ir cortar o cabelo a um barbeiro na Rua Serpa Pinto. Foi a contragosto. Pelo caminho encontrou uma senhora que lhe disse: “Ó Toninho, pareces um urso”. António Sousa explodiu. “Não me contive e mandei a senhora para um lugar muito feio. O meu pai, que até tinha um espírito bastante liberal, ficou chocado com a cena”, revela. A Filarmónica Fraude pretendia contrariar a moda da altura e por isso optava sempre por cantar em português. “Este livro tem a vantagem de nos fazer reflectir sobre o que era o país naqueles tempos. É um livro que nos envaidece muito porque não é um livro chato”, atesta Carlos Barata, revelando ainda que, por causa do vício da música, no seu 6.º ano, começou a faltar às aulas em Outubro e só voltou à escola em Maio. Juntos há 44 anos, o grupo continua a partilhar, nas tertúlias que organiza, a paixão pela música e utiliza o sentido crítico para debater questões da globalidade. “Há um envolvimento afectivo e efectivo entre todos. Continuamos a ser um grupo de não alinhados”, atesta Antunes da Silva.As duas gaffes Sem pruridos, os elementos da Filarmónica Fraude revelaram que o livro “E tudo acabou em 69” contém “duas gaffes imperdoáveis, apesar de ter sido revisto por dez olhos”. Uma refere-se ao facto da Canto Firme ser descrita, a páginas tantas, como “Associação Canto Livre”. A outra, na parte da dedicatória, atribuiu a profissão de psicólogo a um amigo que, na verdade, é musicólogo. “Temos desculpa porque aqui em Tomar vocês também pensavam, durante anos, que tinham um político Dr. que afinal nunca o foi”, brincaram no dia seguinte ao ex-ministro Miguel Relvas ter apresentado a demissão. “E tudo acabou em 69” é um livro escrito por Rui Miguel Abreu que conta a história - curta mas cheia de grandes episódios - desta banda com génese em Tomar. A ilustração de capa do livro e o quadro reproduzido na capa do CD, da autoria do artista plástico João Vaz de Carvalho, rimam bem com a irreverência que a Filarmónica Fraude mantém até hoje.
Filarmónica Fraude partilha peripécias vividas no final dos anos 60 em Tomar

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