uma parceria com o Jornal Expresso

Edição Diária >

Edição Semanal >

Assine O Mirante e receba o jornal em casa
31 anos do jornal o Mirante

Corrosivo Manuel Serra d’Aire

Quero dar-te conta da minha irrevogável decisão de abandonar esta rubrica, após tantos anos coligado contigo a cortar na casaca, a zurzir nos usos e costumes tugas, a vilipendiar políticos altruístas, a caluniar abnegados autarcas que só pensam no serviço público, ao contrário deste valdevinos que se assina e que só pensa no seu bem estar, em farras, petiscadas, gajas boas e outras guloseimas que esta etapa terrena nos proporciona.Mas antes de bater com as portas (é um trocadilho) quero partilhar com os nossos estóicos leitores a experiência que é participar em algumas das mais castiças festas ribatejanas e conseguir sair de lá miraculosamente sem um arranhão. É verdade: ir a algumas das nossas festas é quase tão perigoso como assistir a um jogo no Estádio da Luz com um equipamento do FC Porto ou ir defender as touradas num congresso de ecologistas. Por exemplo, na festa da sardinha assada, em Benavente, de repente vi-me envolvido por uma turba que me fez lembrar os refugiados somalis em busca de arroz junto dos camiões das organizações humanitárias. Só que ali a busca era pela sardinha assada à borla, embora a peleja não fosse menos assanhada tal era a forma como a multidão salivante se acotovelava e disputava cada centímetro quadrado de território. A única diferença é que aquela malta não tinha aspecto de estar sub-nutrida e falava (ou vociferava) em língua portuguesa. Foi uma experiência sociológica de grande valia que me ajudou a confirmar aquilo de que há muito vinha desconfiando: qual Adão, qual Eva, qual quê?! A gente descende mesmo do macaco! E esses laços parentais não são nada abonatórios para os símios, diga-se de passagem.Dias depois, nas festas do Colete Encarnado, em Vila Franca de Xira, tal como tu contaste no teu último e-mail, o humorista Fernando Rocha teve um dos seus melhores desempenhos desde que anda na stand-up comedy. Durante as largadas, um toiro mais sisudo e pouco dado ao humor escatológico e asneirento do comediante nortenho, deu-lhe um tratamento que muitos gostariam de já lhe ter proporcionado mas não puderam, seja por falta de oportunidade ou simplesmente por ausência de cornos. Conclusão, o homem ficou com umas boas mossas no canastro e provavelmente sem vontade de tão cedo se meter noutra.Chegado aqui, e porque entretanto houve uma vaga de fundo do meu clube de fãs, que delira com a brilhante prosa com que os brindo quinzenalmente - num desempenho que está para a literatura como a voz do Zé Cabra está para o canto lírico - decidi que vou continuar por mais um tempo nestas andanças, até porque era chato deixar-te a escrever sozinho.Claro que esta oportunidade que vou dar a mim mesmo exige um reforço de poderes e mordomias que inclui a possibilidade de ser acolitado por meninas bronzeadas e arejadas que me servem refrescos e outros mimos durante estes dias de Verão enquanto puxo pelo bestunto para poder garantir os 3 mil caracteres que preenchem este espaço. Não é que o síndroma do espaço em branco, que afecta tantos atormentados cronistas, me atinja particularmente. O que eu gosto mesmo é de boas companhias.E com esta me vou. Um irrevogável abraço do Serafim das Neves

Mais Notícias

    A carregar...