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Assalto do século à Casa-Museu dos Patudos ainda na memória dos visitantes

Quadros roubados em 1988 foram recuperados oito anos depois em Itália e encontram-se em exposição

O assalto à Casa-Museu dos Patudos ocorreu durante a noite em condições estranhas e que ficaram sempre por esclarecer. Os gatunos entraram por uma porta do rés-do-chão, que se encontrava mal fechada, e nessa noite o guarda-nocturno, ao contrário do que era habitual, não pernoitou no local.

Vinte e sete anos após o maior roubo de obras de arte em Portugal ainda há visitantes que vão à Casa-Museu dos Patudos, em Alpiarça, e recordam uma história que ficou na memória dos portugueses e que teve um desfecho surpreendente e fora do habitual. Na madrugada de 21 de Fevereiro de 1988 foram roubadas cerca de seis dezenas de peças, num valor estimado, nos dias de hoje, de aproximadamente quatro milhões de euros. O assalto à Casa-Museu dos Patudos ocorreu durante a noite em condições estranhas e que ficaram sempre por esclarecer. Os gatunos entraram por uma porta do rés-do-chão, que se encontrava mal fechada, e nessa noite o guarda-nocturno, ao contrário do que era habitual, não pernoitou no local.Os ladrões tiveram tempo para tudo, utilizando durante o assalto ferramentas que se encontravam no museu. As obras roubadas pareceram ter sido escolhidas a dedo, o que leva a crer que o roubo terá sido devidamente preparado por profissionais que conheciam os cantos à casa e sabiam o que procuravam. Na altura em que a Casa-Museu foi assaltada não possuía conservador - desde 1962 - e o inventário das cerca de 80 mil peças que constituem o importante espólio estava desactualizado. Para além disso, não existiam fotografias das peças e não estavam divididas por temas nem havia relação das medidas de cada uma delas.Apesar de todas estas contrariedades, e ao contrário do que é habitual nestes casos, os quadros roubados acabaram por aparecer cerca de oito anos depois do roubo. Este desfecho, fora do normal, só foi possível graças ao trabalho de José António Falcão, indigitado conservador do museu em 1993, e também com a ajuda de um fotógrafo escalabitano, da Foto-Gomes, que possuía fotografias dos quadros. Com essas fotos conseguiram ampliar as imagens que entregaram posteriormente à polícia. Do conjunto de relógios não havia fotografias, o que tornou impossível recuperá-los, assim como as peças de faiança (cerâmica), que nunca foram encontradas.Entre os objectos desaparecidos estava um estudo de Delacroix para o quadro “A morte de Sardanáplo” - existente no Museu do Louvre, em Paris -, considerada uma das peças mais valiosas do museu e cujo valor no mercado poderá rondar os 250 mil euros. Os quadros desaparecidos foram encontrados em 1995 pela polícia italiana perto de uma igreja na cidade de Milão. Entre os quadros encontrados estava uma pintura de Rembrandt, considerada também uma das peças mais importantes da Casa dos Patudos. Os quadros hoje estão em exposição na Casa-Museu dos Patudos cuja colecção é a segunda maior do país, a seguir à colecção da Gulbenkian.Processo de recuperação das peças foi morosoA recuperação dos quadros roubados não foi um processo fácil. Depois de informados pela polícia italiana (Carabinieri) que os quadros tinham sido encontrados, o presidente da Câmara Municipal de Alpiarça da altura, Raúl Figueiredo, decidiu que seria uma funcionária da autarquia a ir a Itália reconhecer as obras de arte. Apesar do trabalho árduo do fotógrafo e do conservador da casa da época acabou por ser o Instituto Português de Museus a ficar com os louros da recuperação dos quadros roubados.“A funcionária, como é lógico, teve dificuldade em reconhecer os quadros, o que dificultou a situação”, recorda José António Falcão, antigo conservador da Casa-Museu dos Patudos, que conta só ter voltado a ver as obras de arte na segunda fase em que foi director da Casa dos Patudos. Todo este processo de recuperação das peças foi muito moroso. Depois de terem viajado de Itália, as obras de arte foram para a Polícia Judiciária até regressarem a Alpiarça, onde se encontram actualmente em exposição.Casa dos Patudos recebe cerca de 10 mil visitantes por anoA Casa-Museu dos Patudos recebe entre 10 a 12 mil visitantes por ano. Um número que tem aumentado nos últimos anos, segundo o actual conservador do museu, Nuno Prates. À frente do espaço museológico desde 2011, Nuno Prates faz um balanço “extremamente positivo”. “Ao longo destes quatro anos temos desenvolvido um conjunto de actividades no âmbito da museologia, o que tem valorizado a casa-museu”, afirma o conservador. Em 2011 abriram um novo circuito museológico que intitularam “José Relvas entre os seus”. Os visitantes podem, desde essa altura, visitar os espaços privados da casa, como os quartos, que não estavam abertos ao público.Nuno Prates considera que a Casa-Museu dos Patudos está mais aberta à comunidade. “Este é um espaço importante a nível nacional pelo seu acervo que só faz sentido se for usufruído pelo público e pela população da nossa terra”, diz. Um bilhete individual para entrar neste museu custa 2,5 euros e se forem grupos com mais de 12 pessoas cada bilhete custa 1,30 euros. A visita é sempre guiada e pode ser feita em várias línguas, nomeadamente inglês, francês, alemão e espanhol. Os meses de Verão são aqueles em que têm mais visitantes individuais e estrangeiros. Nos outros meses aparecem mais grupos organizados, sobretudo alunos de escolas. Os meses de Dezembro, Janeiro e Fevereiro são os que normalmente têm menos afluência.Desde 2011 receberam uma menção honrosa do Projecto SOS Azulejos pelo trabalho de conservação e restauro do azulejo que se encontra à entrada da casa-museu e que retrata cenas agrícolas. Em Maio deste ano receberam outra menção honrosa da Associação Portuguesa de Museologia por um projecto internacional desenvolvido em parceria com o Agrupamento de Escolas José Relvas, no âmbito do Programa Comenius. Algumas vezes realizam também exposições temporárias. A estratégia de marketing passa muito pela divulgação da casa-museu e das suas iniciativas nas redes sociais e no site da câmara municipal, entidade que tutela o museu.Com uma equipa de sete funcionários, Nuno Prates confessa que precisaria de mais algumas pessoas para que tudo pudesse funcionar a 100 por cento. “Em alturas de contenção como a que vivemos sabemos que tal não é possível. Toda a gente que aqui trabalha faz um bocadinho de tudo senão não seria possível desenvolver o trabalho que fazemos”, refere, afirmando que é importante o conservador estar presente na casa-museu para ajudar a resolver todos os problemas e não deixar nenhum visitante sem resposta. Uma das intenções da Casa-Museu dos Patudos é integrar a Rede Portuguesa de Museus, o que ainda não aconteceu, sobretudo devido a burocracias que atrasam o processo que se arrasta há “muitos” anos.

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