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As colectividades ainda são o melhor das aldeias

As colectividades ainda são o melhor das aldeias

Jorge Luís Oliveira é um homem ligado às tradições e dirigente da Federação de Colectividades do Distrito de Santarém

Jorge Luís Oliveira é vice-presidente da Federação de Colectividades do Distrito de Santarém e dirigente associativo desde os 18 anos, porque os estatutos não permitiam que fosse antes. É um apaixonado por folclore e defende a preservação das tradições. O MIRANTE entrevistou-o por ocasião do 60º aniversário do Rancho do Bairro de Santarém, Fontainhas e Grainho, onde é presidente da assembleia-geral.

Quais são os principais problemas que as colectividades da região vivem? A sociedade mudou de tal maneira que as instituições hoje exigem muita coisa e o dirigente passa a ser directamente responsável pelos seus actos. Hoje já não se pode ver o dirigente associativo apenas como o ‘carola’ que fazia as coisas por gosto. Isso ainda acontece mas já não podemos identificar assim os dirigentes, porque hoje existe uma grande responsabilidade, muito diferente. E que outros problemas existem? Um dos principais problemas do movimento associativo é a sustentabilidade financeira. Atrás disso, vêm as responsabilidades inerentes. O movimento associativo tem várias colectividades, de diferentes áreas, e muitos dos seus dirigentes não estavam preparados para estes novos desafios. O papel da Confederação é preparar os dirigentes para as novidades.O que têm feito nesse sentido? Temos vindo a realizar várias sessões de esclarecimentos no distrito de Santarém, em parceria com as autarquias, onde esclarecemos, preparamos, sensibilizamos e alertamos os dirigentes para os novos desafios do movimento associativo. A formação é, por exemplo, ao nível da fiscalidade ou de questões relacionadas com a ASAE (Autoridade de Segurança Alimentar e Económica), uma vez que muitas colectividades têm bares.Estas exigências levam a que as pessoas não estejam tão disponíveis para o movimento associativo? Houve uma grande alteração do mundo laboral. Antigamente havia horários fixos e as pessoas tinham os fins-de-semana livres e mais tempo à noite. Hoje, a carga horária aumentou, há muitos trabalhos por turnos, leva-se trabalho para casa. A sociedade mudou muito e há que ter muito gosto por este trabalho. A carolice está sempre lá mas não basta.As colectividades conseguem viver sem o apoio financeiro das autarquias? Conseguem, mas não se fazem as actividades que se poderiam fazer. O dirigente associativo tem que inovar e inventar actividades para angariar fundos para a sua colectividade. Esse é o segredo e tem que haver um grande amor à causa associativa.Existem muitas colectividades a desaparecer por não terem meios financeiros para se sustentar? Algumas têm dificuldades mas continuam a funcionar. Nos meios rurais fecham escolas, fecham juntas de freguesia e as colectividades ainda continuam de pé. São das poucas coisas que ainda ficam enraizadas, sobretudo nas aldeias. A colectividade ainda é o que vai ligando as pessoas à sua comunidade.As colectividades vivem momentos difíceis ou de entusiasmo? Vivem momentos difíceis pela sustentabilidade financeira mas não podemos dramatizar e temos que inovar sempre. Também se continua a viver com entusiasmo. É importante haver dinâmicas, determinar objectivos e não desistir sem os alcançar.As tradições ribatejanas correm o risco de se perderem com o tempo? Poderão correr esse risco mas também vai depender muito dos responsáveis. Passa muito pelos responsáveis a forma como encaram as tradições. Se os ranchos folclóricos são um vector extraordinariamente importante para a preservação destas tradições temos que ver as tradições ribatejanas num sentido mais amplo, para ficarem preservadas para uma população mais global.Como é que se pode fazer isso? Ao contrário de algumas zonas do país, Santarém não tem um museu etnográfico que retrate a história das suas localidades.Faz falta? Temos tantas tradições que se têm vindo a perder, algumas por falta, provavelmente, de um museu etnográfico ribatejano. Ficava muito bem em Santarém, sendo capital de distrito.Por que é que essa ideia nunca se concretizou? Ainda não foi assumida essa necessidade. Deveria ser uma prioridade. Devemos preservar muito as nossas tradições e passá-las aos nossos filhos. Se não tivermos conhecimento do passado, as tradições acabam por se perder.Não era preferível que várias colectividades de uma freguesia ou concelho se unissem numa só? Ao nível folclórico e etnográfico é impossível porque as tradições estão enraizadas nas próprias localidades de cada rancho. Só as pessoas das localidades podem responder por isso porque cada caso é um caso.O Rancho do Bairro de Santarém faz 60 anos. Que presente oferecia à colectividade? O mais importante é que as nossas tradições se mantenham por muitos e muitos anos. Que haja músicos, dançarinos e pessoal que continue a assumir o rancho folclórico e a preservar as tradições.Um dirigente associativo apaixonado pelas tradiçõesJorge Luís Oliveira nasceu a 26 de Janeiro de 1963 em Vale das Mós, concelho de Abrantes, mas vive em Santarém desde os seis anos, quando os seus pais vieram para a capital de distrito à procura de trabalho. Continua, no entanto, a visitar a terra natal com regularidade. É técnico sindical no Sindicato dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais em Santarém e, actualmente, é vice-presidente da Federação de Colectividades do Distrito de Santarém e também está ligado à direcção da Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto. Actualmente ocupa também as funções de vereador da CDU na Câmara de Santarém, em regime de substituição, por um período de seis meses. “Não estou nervoso mas é um cargo de responsabilidade e vou dar o meu melhor”, diz.Está ligado ao movimento associativo desde os 16 anos e só passou a ser dirigente aos 18 anos porque os estatutos não permitiam que fosse antes. Foi dirigente da União de Santarém e integrou os órgãos dos Jogos Tradicionais de Alfageme. Em 1987 foi presidente da direcção do Centro Cultural das Fontainhas. Foi nessa altura que teve o primeiro contacto com o Rancho Folclórico do Bairro de Santarém, Grainho e Fontainhas e em 2000 passou a integrar o grupo. É, desde essa altura, o apresentador do grupo. Também é o presidente da assembleia-geral da colectividade. Traja mas não dança, porque acha que não tem jeito.Foi no Rancho do Bairro que conheceu a esposa, com quem casou há 28 anos. Tem um filho que também já foi dançarino desse rancho. Apesar de não dançar, o folclore é uma paixão transmitida por via genética. Os seus avós, tios e primos fazem parte do Grupo Folclórico e Etnográfico de Vale das Mós. Os tempos livres são dedicados ao rancho do seu coração. Também pratica Ju-Jitsu em Santarém, embora tenha estado parado devido a um problema de saúde. “O meu mestre já me ligou e tenho que voltar em breve. Faz bem bater com as costas no tapete de vez em quando”, afirma sorridente. Pretende continuar no “seu” rancho enquanto tiver saúde para isso. Confessa que é difícil desligar-se de um projecto que lhe é tão querido.Passar a mensagem de que estão a representar as tradições dos nossos avós é o principal lema dos responsáveis do Rancho do Bairro que completa, em 2015, 60 anos de existência. Os dirigentes têm o cuidado de alertar, sobretudo os mais jovens, para seguirem as regras à risca e não utilizarem telemóveis quando estão em representação. Apesar de não ser o caso da sua colectividade, também os piercings e tatuagens devem ser escondidos quando estão trajados a rigor. Jorge Oliveira considera que o rancho está na moda e que o folclore tem muito para dar.“A cidade perdeu muito com a ida da Feira do Ribatejo para o CNEMA”O que acha da actual gestão da Câmara Municipal de Santarém? É uma gestão complicada devido às dificuldades financeiras da autarquia. Há coisas que poderiam ser feitas de outra forma mas é a opção do PSD, que venceu as eleições, por isso prefiro não me manifestar muito.O que pensa da mudança da Feira do Ribatejo para o CNEMA há 20 anos? Na altura houve uma grande discussão, não só politicamente, como nas estruturas locais. A mudança da feira para o CNEMA retirou o enraizamento que havia entre a cidade e a feira. A cidade perdeu muito com a ida da Feira do Ribatejo para o CNEMA. Podia ter-se aproveitado este espaço do Campo Emílio Infante da Câmara de outra forma e a cidade teria muito mais a ganhar. O CNEMA acaba por estar ali só para eventos pontuais.A Feira da Agricultura devia voltar para o planalto, junto à Casa do Campino? Essa questão não se coloca porque foi criado o espaço do CNEMA e agora tem que se tirar rentabilidade dele. O espaço junto à Casa do Campino pode ter outro aproveitamento, que não só no Festival de Gastronomia e nas Festas da Cidade. O Largo da Feira poderia ser um novo pulmão da cidade de Santarém para que os cidadãos pudessem fazer deste espaço o principal ponto de encontro. A cidade está a ficar vazia, sem pessoas.Concordou com as festas e touradas de Moita Flores com bilhetes à borla? Foi um exagero e agora estamos a pagar a factura desses exageros. Foram só actividades pontuais em que vieram cá artistas, foram as touradas, mas a festa brava continua na mesma. O problema é que agora ficaram dívidas enormes e que têm que ser pagas. As coisas não foram feitas com a perspectiva de futuro. Não é a desbaratar dinheiro que se consegue alguma coisa boa para o concelho.
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