Água e desenvolvimento local
Os recursos hídricos não são inesgotáveis; alterar a qualidade da água é prejudicar a vida do homem e dos outros seres vivos que dependem dela;
Num tempo (2016-2021) em que se anunciam novos planos hidrológicos tudo nos convida a esquecer o “viver de acordo com os nossos meios” e julgamo-nos totalmente independentes dos ciclos naturais. Com a água isto é particularmente verdade. Parece-nos que a água não tem “limites”. A Carta Europeia da Água - Estrasburgo, 1968 - é muito clara nesta matéria. Em duas ou três páginas, em doze pontos, é tudo dito: os recursos hídricos não são inesgotáveis; alterar a qualidade da água é prejudicar a vida do homem e dos outros seres vivos que dependem dela; a boa gestão da água deve ser objeto de um plano promulgado pelas autoridades competentes.É essencial uma abordagem sustentável do ciclo da água no sentido mais nobre e integrador do termo; a Carta da Água responde: “a água é um património comum cujo valor deve ser reconhecido por todos. Cada um tem o dever de a economizar e de a utilizar com cuidado”. “Só” isto; isto é a sustentabilidade da água, tão simples quanto distante. Quase sempre pensamos que a água é um bem garantido já que se regula segundo um ciclo que é encarado como se não tivesse limites. O desenvolvimento parece configurado para consumos e utilizações cada vez mais insaciáveis. Temos que regar mais, produzir mais energia, sempre a consumir mais e mais. Há sempre forma de construir mais uma barragem ou um furo que, em tempo, resolve as necessidades imediatas. E depois? O ciclo global da água é algo mais que um mecanismo hidráulico de bombeamento e descarga, é um sistema vivo e vulnerável. E isto não é um tema só para alguns, diz respeito a todos.Durante décadas o planeamento hidrológico e da gestão de recursos hídricos esteve assente na satisfação imediata dos consumos. Como vai ser o futuro? Existe a “ingénua” convicção que a moderna tecnologia pode conduzir a um uso sustentável do ciclo hidrológico só pelo facto de proporcionar água. Os dados de várias organizações idóneas mostram o contrário. A ilusão de “água e mais água” conduz, inevitavelmente, à escassez.Portugal necessita, sobretudo, de boas decisões políticas que garantam a boa utilização da água. Para além do défice orçamental, da coesão social, o capital natural de um país é fundamental para a sua sustentabilidade e nestas contas da sustentabilidade poucos são os pilares tão importantes como o da água.O Ciclo da Água é provavelmente a melhor visão da, óbvia (?), integração da dimensão global com o local. O local é onde vivem pessoas, onde existem utilizadores. É aqui, na dimensão local que tudo se decide. A aplicação da análise do ciclo de vida da água é uma excelente prática, a esta escala, para corrigir todas as disfunções que o ciclo da utilização da água tem.Carlos Cupeto – Universidade de Évora
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