“Hoje somos muito mais do que um clube de bairro”
Personalidade do Ano Desporto Masculino - Vitória Clube de Santarém.
Em menos de 15 anos de vida o Vitória Clube de Santarém tornou-se uma referência nacional no futsal de formação, conquistando dezenas de títulos distritais e envolvendo cerca de duzentos praticantes. A nova sede possibilitou a criação de novas modalidades e actividades. O objectivo, como explica o presidente da direcção, António Pardelhas, é continuar a crescer e a ganhar, sempre com muito desportivismo e amor à camisola.
Há cerca de ano e meio o Vitória de Santarém decidiu suspender cinco atletas da sua equipa de juniores masculinos de futsal por terem publicado numa rede social cânticos anti-desportivos dirigidos a clubes adversários. Isto demonstra que o clube quer também assumir-se como uma referência no desportivismo?
Entendemos que devíamos intervir pelo bom-nome do Vitória, porque estavam a entrar por caminhos que não são a nossa filosofia. Daí termos tomado a atitude de os suspender.
Antes dos resultados desportivos está o fair-play, o respeito pelos adversários?
Sim. Aliás, essa medida disciplinar custou-nos inclusivamente o campeonato distrital porque eram elementos preponderantes nessa equipa. Foi um caso isolado que serviu de emenda. A nossa filosofia é, além de formar atletas, ajudar a formar pessoas.
Alguns comportamentos anti-desportivos a que se assiste nos campos e pavilhões têm origem no público, muitas vezes tendo como protagonistas os pais de jovens atletas. Têm testemunhado situações dessas?
Temos. E nós também não somos excepção. Já tivemos problemas com pais de atletas nossos. O que lamentamos sempre, porque estamos cá para dar ensinamentos desportivos e também de ordem social e de educação. Alguns pais não se comportam condignamente e acabam até por transmitir isso aos filhos quando eles estão em campo.
O Vitória de Santarém nasceu como clube de futsal mas tem vindo a diversificar as ofertas, tendo hoje outras modalidades. O ecletismo é uma aposta para continuar?
Com certeza que sim. Começámos com o futsal masculino, depois passámos para o feminino, entretanto criámos uma escolinha de formação que hoje tem todos os escalões. Com a atribuição desta sede pensámos em diversificar a nossa oferta em termos desportivos e culturais, o que levou à criação de diversas outras modalidades. A última foi o xadrez, que está na 3ª divisão nacional.
O que é que o clube ganhou em deixar o local onde nasceu, no bairro do Alto do Bexiga, e mudar-se para o centro da cidade?
O ecletismo acaba por ser uma consequência inerente à mudança para a nova sede. Ao conseguirmos instalações desta envergadura, um dos nossos compromissos junto da câmara municipal foi dinamizar o espaço ao máximo e colocá-lo ao serviço da comunidade.
O que se segue agora em relação a novas modalidades?
Já pensámos também no voleibol, mas como há tanta oferta de outras modalidades e as infra-estruturas são escassas, ainda não desenvolvemos muito essa ideia. Não há espaço para treinar. Entretanto, estamos a trabalhar para desenvolver uma nova modalidade, o teqball, que é uma espécie de ténis de mesa jogado com os pés e a cabeça.
A maior parte dos clubes da cidade tem sede em instalações municipais e joga em recintos desportivos municipais, para além de receberem subsídios financeiros da câmara. Não há demasiada dependência do município? Ou essa é a compensação justa pelos serviços que prestam à comunidade?
É a compensação justa, porque, como todos sabemos, o tecido empresarial do nosso concelho, com raras excepções, não é muito virado para apoiar o desporto. Por esse motivo temos muitas dificuldades. Vamos sempre tentando captar apoios mas se não fossem os apoios da câmara e da junta de freguesia era impossível desenvolvermos este trabalho, mesmo com o pagamento de uma pequena mensalidade por parte dos atletas. Os custos são muitos. Temos 12 escalões, 17 equipas em competição, 14 treinadores, oito ou nove enfermeiros e fisioterapeutas. Ao todo, temos um orçamento anual entre os 65 a 70 mil euros. Fora os milhares de quilómetros que se fazem com as equipas.
Também há muita concorrência, muitos clubes e modalidades a disputar esses apoios…
Isso é verdade! Mas nos últimos tempos temos tido respostas positivas de diversas empresas a quem agradecemos pela ajuda, dentro das possibilidades que têm.
Não deve ser fácil conseguir instalações para os treinos de tantas equipas e atletas nem arranjar dirigentes para acompanhar tantas equipas.
Os espaços municipais estão no limite. Se calhar são necessários dois novos pavilhões para dar resposta a toda a oferta que existe.
Quando em Agosto de 2005 fundaram o Vitória de Santarém, com uma equipa de 14 atletas, imaginavam que teriam tantos sucessos desportivos em menos de 15 anos?
Quando criámos o Vitória foi para que a juventude sentisse o gosto pelo associativismo. Nessa altura, os órgãos sociais eram constituídos por pessoas com menos de 30 anos. Não imaginávamos que em tão pouco tempo tivéssemos tantos êxitos desportivos. E muito menos aquele grupo de amigos que em 1995, ainda informalmente, em campeonatos inter-turmas ou em torneios pela cidade, já usava o nome de Vitória de Santarém… E, para além dos títulos, era inimaginável que fossemos hoje o segundo clube com mais atletas inscritos a nível nacional ou que tivéssemos protocolos de cooperação com clubes da Costa do Marfim ou da Guiné-Bissau.
A fasquia que atingiram em termos de resultados cria expectativas e responsabilidades acrescidas. Que metas têm para os próximos anos?
É importante cimentar as equipas nos campeonatos nacionais. Para já temos uma, a de iniciados. Temos também como objectivo que a nossa equipa sénior seja formada por miúdos oriundos da formação do Vitória. Actualmente, os nossos seniores já jogam com sete ou oito juniores integrados.
Acumular a liderança de um clube com a vida pessoal é tarefa complicada ou já está habituado?
É muito complicado. Não temos tempo para nada. O nosso secretário, Sérgio Fernandes, e a nossa vice-presidente, Carla Paulino, trabalham 25 horas por dia, não é 24, a pensar no Vitória.
Tem sido fácil arranjar pessoas disponíveis para trabalhar em prol do clube?
Hoje temos mais dificuldade em arranjar pessoas que queiram fazer parte do associativismo e dos corpos sociais. Para a direcção é sempre muito difícil arranjar pessoas.
Este tipo de associações que movimenta tanta gente e tanta logística já exigiria pessoas a tempo inteiro.
Sim. Aqui trabalha-se muito mas ninguém é remunerado. É tudo por carolice. Já se justificava termos alguém a tempo inteiro mas isso é inviável em termos financeiros.
Os pais dos atletas estão envolvidos em toda esta estrutura?
Este ano temos tido um apoio que antes não tínhamos. Os pais estão mais interessados em acompanhar as equipas, tanto ao nível dos treinos como dos jogos ao fim-de-semana. Já temos alguns pais integrados como delegados de equipas nos diversos escalões. E, como não temos viaturas próprias, sem o seu precioso contributo era impossível desenvolvermos a nossa actividade.
Continuam a assumir-se como um clube de bairro ou hoje são muito mais do que isso?
Hoje somos mais do que isso, até pelas actividades que desenvolvemos e pelo torneio que organizamos, o Vitória Futsal Cup Masters. É um torneio reconhecido a nível nacional e é o maior do país. Assim que divulgamos as datas são muitas as abordagens de clubes a querer vir. Temos habitualmente um representante de cada distrito e este ano, tudo indica, vamos concretizar o sonho de internacionalizar o torneio, com equipas da Costa do Marfim e da Guiné-Bissau, aproveitando as parcerias que temos com clubes desses países.
Uma referência nacional no futsal de formação
O Vitória Clube de Santarém terminou o ano de 2019 com mais de duzentos praticantes de futsal, de ambos os sexos, distribuídos por 12 escalões etários, a partir dos quatro anos de idade, sendo o segundo clube a nível nacional com mais atletas federados na modalidade. Actualmente compete com equipas masculinas nos escalões de petizes, traquinas, benjamins, infantis, iniciados, juvenis, juniores, seniores e veteranos e ainda equipas femininas de infantis, juvenis e seniores.
Na época passada o emblema escalabitano atingiu os 46 títulos em provas oficiais promovidas pela Associação de Futebol de Santarém, o que faz dele uma das referências do futsal na região e também no país. O Vitória de Santarém também já se projectou além-fronteiras, com a assinatura de protocolos de cooperação com clubes da Costa do Marfim e da Guiné-Bissau que visam dinamizar o futsal nesses países africanos.
O clube tem ainda protocolos com a Escola Secundária Sá da Bandeira e com a Escola Superior de Desporto de Rio Maior, recebendo jovens estudantes que ali efectuam estágios curriculares. E tem parcerias com entidades sociais, não cobrando mensalidades a jovens institucionalizados que queiram praticar futsal.
A certificação como entidade formadora de quatro estrelas pela Federação Portuguesa de Futebol foi outra conquista em 2019, ano em que o Vitória de Santarém reforçou o seu ecletismo com a aposta ou consolidação de novas secções, como jiu-jitsu, taekwondo, boxe, pesca, pilates, zumba e xadrez.
Para essa realidade contribuiu também a mudança para a nova sede, situada no antigo jardim-de-infância do Sacapeito, onde existem condições para dinamizar diversas actividades e para o convívio entre sócios. O imóvel foi cedido em 2017 pela Câmara de Santarém e nele foi também instalado um ginásio e um gabinete médico.
O Vitória Clube de Santarém foi fundado no dia 11 de Agosto de 2005 no Alto do Bexiga, um bairro na periferia de Santarém. O seu actual presidente e sócio número um é António Pardelhas, 63 anos, que tem como braços-direitos o secretário Sérgio Fernandes e a vice-presidente Carla Paulino e conta com a colaboração de várias outras pessoas.
Todos são poucos para ajudar nas várias frentes em que o clube está envolvido e que têm como ponto alto, no final de cada época, em Junho, a organização do Vitória Futsal Cup, o maior e mais abrangente torneio de futsal de formação a nível nacional, que envolve dezenas de clubes e centenas de jovens atletas de todos os distritos do continente e regiões autónomas.