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“Autarcas da CDU de Alpiarça são marionetas do chefe de gabinete com a conivência do presidente”
Carlos Jorge Pereira bateu com a porta de forma estrondosa, em Alpiarça, e põe em causa o presidente da câmara e o chefe de gabinete

“Autarcas da CDU de Alpiarça são marionetas do chefe de gabinete com a conivência do presidente”

Carlos Jorge Pereira cansou-se de engolir sapos e do que considera faltas de respeito e decidiu abandonar o executivo que manda na Câmara de Alpiarça, ao fim de onze anos a acompanhar o presidente Mário Pereira. O agora ex-autarca, de 58 anos, não aguentava mais um clima em que reinavam as demonstrações de poder patético perante a passividade do presidente. Carlos Jorge Pereira foi um dos obreiros da vitória da CDU em Alpiarça nas autárquicas de 2009 e desde o primeiro dia integrou o executivo como vice-presidente. Era o homem de confiança e braço-direito do presidente. Mas nos últimos tempos sentia-se um verbo-de-encher e não via qualquer apoio do presidente. O clima na autarquia deteriorou-se porque o chefe de gabinete passou a mandar mais que o presidente que o nomeou. Nesta entrevista conta o que se passa na câmara e diz que tanto ele como a sua mulher vão sair do partido garantindo que sempre disse que sairia da câmara com Mário Pereira e que nunca quis ser cabeça-de-lista às autárquicas de 2021.

Estava no executivo da Câmara de Alpiarça há onze anos e desde o início que era vice-presidente. Com quem é que se chateou para agora sair de repente?

O que me levou a renunciar ao mandato foi o que considero faltas de respeito do presidente da câmara, Mário Pereira. Eu era o vice-presidente, mas estava constantemente a ser desautorizado por pessoas que não tinham competência para isso. Percebi, nos últimos tempos, que o presidente era, cada vez mais, conivente com estas atitudes e seguia mais as opiniões de terceiros do que as minhas.

Está a falar do chefe de gabinete João Osório?

Não queria falar em nomes. Mas sim, é essa pessoa. Claro que não actua sozinho, mas é o principal.

Sendo uma situação que já se registava há algum tempo o que aconteceu concretamente para tomar esta decisão radical?

Foi um acumular de situações. A gota de água aconteceu a 5 de Agosto. Estava de férias e comunicaram-me que tinha havido uma ruptura de um cano dentro de um prédio. Depois de me inteirar do caso com o encarregado que trabalhava comigo percebi que não era da competência da câmara reparar a situação uma vez que a ruptura era dentro do prédio. Decidi em conformidade. Passado pouco tempo recebi um telefonema de uma pessoa [João Osório] que disse que me ia desautorizar e tivemos uma discussão acesa ao telefone.

Falou com Mário Pereira?

Sim, liguei-lhe imediatamente. Percebi que eles [João Osório e Mário Pereira] já tinham falado e de que lado é que o presidente estava.

Falou depois pessoalmente com o presidente para esclarecerem a situação?

Quando regressei de férias o Mário foi de férias. Já não nos cruzámos, nem voltámos a falar do assunto. No dia 12 de Agosto enviei-lhe um e-mail no qual dizia que queria entregar o pelouro dos Serviços Exteriores. Disse-lhe que não conseguia continuar a engolir mais sapos. Que a falta de respeito por mim, pelo meu trabalho, que a mentira e as demonstrações de poder patético e o desrespeito pelas pessoas que trabalham comigo não podiam continuar. Nem conseguia continuar a ser enxovalhado e compactuar com posições tomadas por outra pessoa, a quem não mandatei nem foi contactado para tal. Transmiti-lhe isto tudo.

O que é que lhe respondeu Mário Pereira?

Esperei por uma resposta dele, o que não aconteceu. Daí ter enviado um segundo e-mail, a 19 de Agosto, no qual apresentei a renúncia ao mandato. Não senti confiança da parte dele para continuar. Passado cinco minutos ele ligou-me incessantemente. Não atendi. Só atendi no dia seguinte.

Como foi essa conversa?

Nada de especial. Pediu para não fazer uma coisa dessas. Ele estava de férias e disse que vinha de propósito para falarmos. Eu disse-lhe que já não valia a pena.

Já falaram pessoalmente?

Depois de 19 de Agosto nunca mais me encontrei com ele, até 31 de Agosto, o meu último dia de trabalho. Ele ligou-me ao fim da tarde e fui ter com ele à câmara. Nesse dia pediu-me desculpa e disse que se sentia responsável pela decisão que eu tinha tomado. Disse-lhe, descaradamente, que era responsabilidade dele.

Como foi o ambiente na câmara desde que apresentou a renúncia ao mandato até sair?

Cruzei-me algumas vezes com João Osório mas nunca mais voltámos a falar. O presidente esteve de férias, mas mesmo quando veio a Alpiarça, para a visita da ministra da Agricultura, não me procurou. Aliás, nem recebi a informação da visita da ministra. Nem para isso, nem para mais nada. Foi como se já tivesse ido embora.

Também se diz que abandonou o cargo porque a CDU não o queria como cabeça-de-lista nas autárquicas de 2021 uma vez que Mário Pereira já não pode recandidatar-se.

Isso é completamente falso. Todos dentro do partido sabem que eu já não queria integrar as listas neste mandato. Só decidi avançar à última hora. Nessa altura disse que era o último mandato que fazia e que saía da vida autárquica quando o Mário Pereira saísse. Aliás, há cerca de um ano e meio, numa reunião do partido, voltei a frisar isso mesmo, que não queria ser presidente da Câmara de Alpiarça.

Teve apoio de alguém de dentro do partido?

Recebi mensagens de algumas pessoas. Aliás, até da oposição. Estive com Pedro Pinhão (o número 4 da lista da CDU nas últimas autárquicas) em minha casa no dia 27 de Agosto. Ele quis falar comigo para saber os motivos que me tinham feito sair. Depois disso acabou por não aceitar o convite para integrar este executivo e substituir-me.

O chefe de gabinete tem mais poder na câmara que o presidente?

Na minha opinião tem. Sinto que era apenas um nome a encher um cargo. E que o executivo é uma marioneta nas mãos de outros. O sonho dessa pessoa (João Osório) é, desde há muito tempo, ser presidente da Câmara de Alpiarça, mas tem noção de que nunca irá conseguir. Por isso, toma estas atitudes para encher o ego.

Os comunistas de Alpiarça estão sob o domínio de João Osório e calam-se?

Sim, no fundo é isso que acontece.

De onde surge esse poder?

Não sei onde vai buscar o poder. Sei que acontece e já desde há muitos anos. E o presidente da câmara é conivente. Por vezes parece que tem receio de o contrariar e de lhe fazer frente.

Sente-se traído por Mário Pereira?

Eu era o braço-direito dele, como o próprio admite. Tinha que responder por tudo e mais alguma coisa. Fui eu que dei sempre o peito às balas quando os outros falhavam nomeadamente o próprio presidente. Andei com a câmara às costas durante 11 anos. Talvez me sinta traído. Passei, sozinho, dias horríveis até decidir tomar esta atitude. Mas saio de consciência tranquila e com a dignidade imaculada.

Como está a sua situação dentro do partido?

Sou militante do Partido Comunista Português (PCP) há muitos anos mas vou sair. Eu e a minha esposa vamos abandonar o partido. Perdi a confiança no partido porque todos sabem que estas situações acontecem e parece que ninguém se importa.

Que balanço faz dos 11 anos em que esteve na câmara?

No geral foi positivo. Trago comigo vários momentos felizes. O dia em que ganhámos as eleições, quando ninguém acreditava, foi um dia muito feliz. Recordo como um dos piores momentos aquele em que, quando entrámos na câmara, queríamos comprar uma saca de cimento e não tínhamos crédito em lado algum. Foi muito difícil. Agora que conseguimos colocar a autarquia numa situação financeira mais folgada começaram a acontecer este tipo de situações. É triste.

Aceitou dar esta entrevista para se vingar?

Não. Aceitei para me defender. A minha intenção não é “lavar roupa suja”. Eles que sejam felizes à maneira deles e eu serei à minha. Com esta entrevista coloco um ponto final nesta situação.

E se o convidarem para integrar uma lista à câmara por outro partido?

Neste momento não penso nisso. Quando o Partido Socialista estava ainda no poder convidou-me para a lista. Agora ainda não.

Se fosse convidado pelo PS avançaria como cabeça-de-lista?

Prefiro não responder. Não quero problemas.

E como independente?

Não posso dizer o que acontece no futuro.

A vida política acabou para si?

Por enquanto sim.

Até às próximas eleições?

Só se mudar muita coisa.

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